Representante do governo afirma que grupo de trabalho continua em atividade e que ações não serão interrompidas. Prefeitura paulistana e Unifesp também se manifestam
por Redação RBA
Depois da controvérsia sobre as atividades do Grupo de Trabalho Perus, que analisa ossadas encontradas em vala clandestina em 1990, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos divulgou nota na noite de ontem (22) para afirmar que o GTP “não foi encerrado” com a publicação, por Jair Bolsonaro, do Decreto 9.759, que extinguiu conselhos sociais. Segundo o ministério, o grupo foi formado em 2014 como resultado de uma ação civil pública que envolve União, o estado e o município de São Paulo.
Depois de longo período de abandono, as ossadas voltaram a ser analisadas cinco anos atrás, por peritos que compõem o Centro de Arqueologia e Antropologia Forense (Caaf), ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Como resultado do trabalho, foram identificados os restos mortais de dois desaparecidos políticos, sepultados na vala clandestina do Cemitério Dom Bosco, em Perus, região noroeste da capital, ondem em 1990 foram encontradas mais de mil caixas com ossadas, algumas com restos de mais de uma pessoa.
“O Ministério reafirma a importância dos trabalhos desenvolvidos no âmbito do Grupo de Trabalho, atendendo aos preceitos humanitários e legais para que as famílias possam exercer seu direito ao sepultamento e ao luto. Os avanços conquistados por meio das atividades do GTP poderão apresentar subsídios para os processos de busca e identificação de casos de desaparecimento atuais, por seu legado humanitário e expertise no processo de identificação humana no país”, afirma a nota.
A prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania, também garantiu a manutenção das atividades. Em outra nota, afirma que “continuará cumprindo os termos do acordo com a União, dando suporte administrativo aos peritos encarregados da identificação das ossadas de presos políticos encontradas no Cemitério de Perus”.
Por sua vez, a Unifesp informou que “não foi notificada oficialmente” sobre o encerramento dos trabalhos do GTP. Representantes do grupo – que inclui ainda a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – “reuniram-se na semana passada e entenderam que o grupo permanecerá atuando, por ter sido criado a partir de um termo de cooperação e que o trabalho de identificação das ossadas não deverá ser prejudicado, por ser fruto de um acordo feito em juízo”.
Ontem, o professor da Unifesp Edson Teles, responsável pelo Caaf, lembrou que as atividades continuam, com quatro peritos próprios, contratados pela prefeitura, e um cedido pela universidade, além de outros profissionais rotativos. A preocupação é com a renovação do contrato, que vai até julho. “As atividades do GTP contemplam ainda entrevistas e coletas de amostras de sangue de familiares, em diversas cidades do país, para exames de DNA”, diz ainda o ministério. “Todas as etapas dos trabalhos periciais são realizadas em absoluto respeito aos princípios éticos e humanitários e conforme os protocolos científicos nacionais e internacionais para análise de remanescentes ósseos e coleta de amostra biológicas de familiares para exames genéticos com fins de identificação.”
Em entrevista ao jornal El País, a presidenta da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos, Eugênia Gonzaga, disse que conversou no início do ano com a ministra Damares Alves, que teria se declarado “sensível” à questão. “O secretário-adjunto [Alexandre Moreira] tem nos apoiado. Mas muita coisa depende das decisões de cúpula. Justamente o que falta para alavancar os trabalhos”, declarou a procuradora regional da República. Segundo ela, “o governo quer inviabilizar os trabalhos de apuração dos crimes da ditadura”.
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Imagem: Vala clandestina no cemitério Dom Bosco, em Perus, foi descoberta em 1990: mais de mil caixas com ossadas – REPRODUÇÃO