Outras histórias. Por Janio de Freitas

Bolsonaro só pode propor miudezas de segundo e terceiro escalão

Na Folha de S.Paulo

Apesar da quantidade de países liderados pelos Estados Unidos contra o governo da Venezuela, Jair Bolsonaro não precisa de ninguém para, sozinho com sua falta de senso, desmoralizar a tentativa de derrubar Nicolás Maduro.

“Eu elogio o espírito patriótico e democrático por lutar pela liberdade no seu país” e “para instalar a democracia na Venezuela”, repete ele aos oposicionistas. Em sua boca, as palavras liberdade e democracia denunciam uma farsa, impossibilitadas de significado honesto em quem defende o golpe e a ditadura no Brasil, a tortura e os crimes de morte da repressão militar. E tem o facinoroso coronel Brilhante Ustra como seu herói.

Maduro tem muito pouco de Hugo Chávez, que tinha uma concepção de país e, apesar de erros políticos, a noção do que fazer com seu projeto. E fez grande parte dele, contra a realidade social na Venezuela, uma das piores na América do Sul. Esse legado é o poder de Maduro.

Trump não respeita nem a democracia do seu país, Bolsonaro a combate aqui desde jovem. Seria então a democracia a mobilizá-los, com uma dúzia de governantes sul-americanos, contra a situação venezuelana? A história é outra. É a de sempre. Inclusive na imprensa do continente.

Todos os números que importam, na síntese que retrata a situação do Brasil, estão negativos. A derrocada é extensiva e intensiva. Paulo Guedes, na verdade, está voando entre os astros, distraído. A desculpa é a espera da “reforma da Previdência”, como se fosse um milagre que a tudo ativaria, inclusive a Paulo Guedes.

Ou como se nada fosse factível antes de tal milagre.

Vez ou outra, para mostrar-se vivo, um acréscimo à lenga-lenga. Agora, “o governo prepara a privatização do gás para baixar o preço”. O gás é mesmo muito caro. Mas nada do que foi privatizado teve o custo reduzido para o consumidor. E atribuir à privatização do gás mais 12 milhões de empregos em dez anos é uma apelação com cinismo excessivo. A Petrobras está sendo liquidada sem que os vendedores encontrem reação. Logo, dispensem-se as tapeações.

Bolsonaro só pode propor o que, para o nível presidencial, são miudezas de segundo e terceiro escalão, como as fotomultas nas estradas e a duração da carteira de motorista. Paulo Guedes aceitou a tarefa de supri-lo. Mas parece até se esconder dos números negativos, em vez de os enfrentar. Nunca tem nem sequer o que dizer a respeito, como é de sua obrigação com os cidadãos.

Está dada, pela Advocacia-Geral da União e por ordem de Bolsonaro, a autorização à polícia para dispensar o mandado judicial na retirada dos invasores de imóveis públicos. A violência nas desocupações já é terrível como ação judicial. Liberada, só pode agravar-se.

A norma brasileira é a da queixa judicial do interessado, seguida, se fundada, do mandado de reintegração de posse. Bolsonaro despreza a norma sem, no entanto, poder extingui-la. Logo, torna-se ele próprio passível de ação judicial. À AGU, por seu lado, caberiam pareceres e, com o caso na Justiça, a eventual defesa da medida. A qual deveria ter saído do Ministério da Justiça, não fosse a autoridade ministerial de Sergio Moro suprimida por Bolsonaro. Outra vez.

Está preparado para esta semana mais um passo rumo à liberação do porte de arma, que é a meta prioritária do não programa de governo de Bolsonaro.

O Triunfo da Morte, c.1562, de Pieter Bruegel, o Velho, Museu do Prado, Madri.


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