Frente “em defesa” da Amazônia quer mineração em terras indígenas e tem deputado envolvido em conflitos

Aliado de Romero Jucá e dono de fazenda próxima da TI Yanomami, Édio Lopes (PR-RR) já foi acusado de ameaçar camponeses; recheada de ruralistas, Frente Parlamentar em Defesa da Amazônia quer “exploração com responsabilidade”

Por Bruno Stankevicius Bassi, em De Olho nos Ruralistas

Lançada na última quarta-feira (15), em evento que contou com a participação do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, a Frente Parlamentar em Defesa da Amazônia propõe medidas controversas, como a regularização da mineração em terras indígenas.

Apesar do nome, a frente coordenada pelo deputado governista Delegado Pablo Oliva (PSL-AM) também defende a mineração em áreas de preservação permanente e tem metade de seus membros vinculados à bancada ruralista. Dos 212 deputados que integram o grupo, 105 fazem parte da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Entre eles, está o deputado Édio Lopes (PR-RR). Em 2015, ele foi escalado pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), como relator do Projeto de Lei 1.610/1996, de autoria do ex-senador Romero Jucá (MDB-RR), que pretendia justamente liberar as atividades de mineração em terras indígenas. Na época, Lopes foi criticado por organizações indígenas após considerar um debate promovido em 2008, cujo tema era o Estatuto dos Povos Indígenas, como cumprimento da etapa de consulta prévia.

O roraimense aparece no Mapa das Terras dos Parlamentares, divulgado na segunda-feira pelo De Olho nos Ruralistas, com uma propriedade rural de 374 hectares no município de Mucajaí (RR). A região abriga a Terra Indígena Yanomami, uma das mais ameaçadas pelo garimpo ilegal. Segundo denúncia do líder indígena Davi Kopenawa, formalizada esta semana junto aos ministérios da Justiça e da Defesa, desde o ano passado cerca de 20 mil garimpeiros invadiram a área compreendida pelos Rios Uraricoera, Mucajaí, Apiaú e Alto Catrimani.

Conheça outros políticos com terras em áreas de conflito na reportagem: “Ruralistas do Congresso possuem terras em áreas de conflitos sociais e ambientais“.

PROPRIEDADE FICA EM TERRAS PÚBLICAS, DIZ CPT

Os conflitos envolvendo Édio Lopes não se limitam aos povos indígenas. Segundo camponeses ligados ao Movimento de Luta pela Terra (MLT), pessoas ligadas ao deputado teriam ameaçado líderes sem-terra, em 2015, para que saíssem de uma área de terras públicas em Mucajaí, mesmo município onde o deputado mantém a Fazenda São Carlos. A propriedade, conhecida como Fazenda Modelo, se encontrava em processo de desapropriação pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para ser destinada à reforma agrária.

Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Lopes comprara os títulos um ano antes e, desde então, pressionava o poder público para que os sem-terra desocupassem a fazenda, que não aparece em sua declaração de bens à Justiça Eleitoral. Para Ricardo Brito, coordenador nacional do MLT, o deputado sabia da situação das terras quando adquiriu a propriedade:

– Estamos sendo perseguidos e ameaçados o tempo todo. Isso começou desde que Édio Lopes comprou esses títulos mesmo sabendo que a fazenda já estava em processo de reforma agrária. Ele foi avisado sobre a situação pelo antigo dono, que já estava negociando a desapropriação com o Incra. De lá para cá, nós temos sofrido demais com as perseguições.

Além da ação de jagunços, os camponeses denunciaram o descaso das autoridades em resolver a situação e pôr um fim ao conflito: “Já levamos essa situação ao conhecimento da PF [Polícia Federal], mas quem disse que até agora eles sequer investigaram esta situação?”.

Aliado de Romero Jucá em Roraima, Édio Lopes se tornou réu no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2014, quando ainda pertencia ao MDB. Segundo a denúncia, Lopes teria cometido o crime de peculato após contratar três funcionários-fantasmas entre 2005 e 2006, quando exercia o mandato de deputado estadual.

‘ELES DESEJAM FAZER A EXPLORAÇÃO’, DIZ COORDENADOR DA FRENTE

Defendido pelo governo, o projeto de exploração integral da Amazônia esteve entre os principais temas durante o lançamento da nova frente parlamentar. Para o coordenador Pablo Oliva (PSL-AM), não há contradição entre desenvolvimento sustentável e a mineração em terras indígenas.

“Eles desejam fazer a exploração, isso vai enriquecer a economia local”, afirmou, em entrevista ao portal BNC Amazonas. “Só quem não deseja fazer a exploração é quem está longe desses locais. Quem vive lá quer que o local se desenvolva, mas para regulamentar tem que estar de acordo com a lei”.

Essa não foi a única tese controversa apresentada pelo deputado durante o evento. Segundo Oliva, o governo deve legalizar o garimpo em áreas indígenas para “explorar com responsabilidade”:

– Na verdade, elas já são exploradas, só que de forma ilegal. Na hora que você legaliza e regulamenta, você dá às pessoas que vivem lá opções e qualidade de trabalho e de vida e ao mesmo tempo, garante que as riquezas fiquem; quando você deixa que fique ilegal, como na exploração de ouro ilegal, o minério é levado para fora do Brasil. O ouro não fica, a riqueza não fica, quem trabalha não se desenvolve assim como o lugar onde ocorre a atividade. Então, explorar, sim, mas com responsabilidade e desenvolvimento sustentável.

O parlamentar também falou sobre a composição pouco usual da Frente Parlamentar em Defesa da Amazônia, que reúne membros da FPA, como Édio Lopes, e deputados tradicionalmente ligados à causas ambientais, ainda que em minoria: “Nós temos que colocar as pessoas para dialogar e chegar a um consenso, a vantagem da frente é essa”.

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