Justiça nega recurso do governo e reintegra peritos de combate à tortura exonerados por Bolsonaro

Decreto do presidente exonerava peritos e extinguia cargos do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura

Por Juliana Dal Piva, Leandro Prazeres e João Paulo Saconi, O Globo

A Justiça Federal do Rio de Janeiro manteve nesta quinta-feira a decisão de suspender parte do decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para exonerar 11 integrantes do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) e acabar com a remuneração destinadas aos cargos deles. Trata-se da segunda derrota judicial em desfavor do governo no caso.

O desembargador Guilherme Calmon Nogueira da Gama, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), manteve os efeitos de uma liminar da 6ª Vara Federal que suspendeu, em caráter liminar, a medida do governo. A decisão do desembargador foi em resposta a um recurso movido pela Advocacia-Geral da União (AGU) na terça-feira.

O imbróglio envolvendo a exoneração de peritos do MNPCT começou em junho, quando o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto exonerando os integrantes do grupo e extinguindo os cargos comissionados ocupados por eles. O grupo é responsável pela vistoria de presídios, clínicas psiquiátricas, comunidades terapêuticas e outras unidades de internação mantidas pelo Estado.

O recurso movido pela AGU ainda deverá ser analisado por alguma das turmas colegiadas do TRF-2, mas até lá, a decisão da 6ª Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro continua valendo.

Em seu despacho, Nogueira da Gama afirma que, entre os motivos para negar o recurso, está a falta de provas da AGU que possam comprovar o argumento de que a exoneração dos peritos não teria causado “forte impacto nas ações de fiscalização e combate à tortura, imprescindíveis, sobretudo, nos presídios brasileiros”.

Em outro ponto do documento, o magistrado afirma que o tema tem “expressividade” e é de “interesse coletivo”, uma vez que se trata de “questão afeta à defesa de direitos humanos, salvaguardados na prórpai Constituição Federal”.

Nogueira da Gama classificou os trabalhos desempenhados pelo mecanismo como “imprescindíveis” e “essenciais” à “proteção a dignidade da pessoa humana”. Ele ainda rejeitou outros argumentos da AGU. Na concepção do desembargador, a Defensoria Pública da União (DPU), responsável por ingressar com a ação em primeira instância, pode, sim, mover ações populares.

Além dessa disputa no TRF-2, o decreto de Bolsonaro também é alvo de uma ação movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), que está sob a relatoria do ministro Luiz Fux.

Repercussão

Entidades em defesa dos direitos humanos criticaram a medida dizendo que a medida esvaziaria o grupo e tornaria o trabalho dos peritos praticamente impossível. O sub-comitê da Organização das Nações Unidas (ONU) convocou a missão permanente do Brasil em Genebra para prestar esclarecimentos sobre a decisão de Bolsonaro.

O governo, por outro lado, argumentou que o grupo continuaria em funcionamento ainda que sem remuneração. Os novos integrantes do grupo trabalhariam de forma voluntária.

Monumento “Tortura Nunca Mais”, do arquiteto Demétrio Albuquerque, no Recife.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

catorze − sete =