Por Julia Dias, Agência Fiocruz
Líderes de todo mundo, reunidos para 74ª Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York, aprovaram por aclamação nesta segunda-feira (23/9) uma declaração política de comprometimento global para Cobertura Universal em Saúde. O documento foi aprovado na primeira Reunião de Alto-Nível da ONU sobre o tema e destacou a importância da atenção primária para se alcançar a Cobertura Universal em Saúde, assim como a relação do tema com os objetivos da Agenda 2030. A declaração é resultado de um processo de negociações entre órgãos intergovernamentais, que envolveu a Conferência Mundial sobre Atenção Primária em Saúde, realizada em outubro de 2018, em Astana, Cazaquistão, e as deliberações da Assembleia Mundial de Saúde, que ocorreu maio deste ano.
O Secretário-Geral da ONU, Antonio Guterres, considerou a aprovação do documento “um marco importante” na busca de “saúde para todos”. Guterres defendeu uma urgente mudança de paradigma de financiamento, que passe a considerar a saúde um investimento e não um custo.
“Investir em saúde para todas e todos é investir na humanidade e trabalhar para o bem-estar e a prosperidade de cada um”, afirmou o líder da ONU, ao lembrar que cerca de metade dos habitantes do planeta não tem acesso à saúde de qualidade e que cerca de 100 milhões de pessoas são jogadas na pobreza todos os anos por conta de gastos exorbitantes em saúde. “A saúde é ao mesmo tempo fator e consequência do progresso econômico e social”, afirmou Guterres.
O diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, chamou atenção para os custos econômicos de não se investir na saúde da população. “A falta de acesso à saúde de qualidade e a preços acessíveis é um freio ao crescimento econômico. Ela mantém as pessoas atoladas na pobreza, reduz a produtividade e esgota a esperança”, afirmou. Para ele, a cobertura universal não é apenas um “imperativo moral”, mas também econômico.
Tedros Adhanom citou alguns dados do relatório “Atenção primária em saúde no caminho para a Cobertura Universal em Saúde”, lançado pela OMS na véspera. Segundo o estudo, mais de cinco bilhões de pessoas correm o risco de não ter acesso a serviços essenciais de saúde, e que 60 milhões de vidas podem ser salvas se os países de média e baixa renda investirem US$ 200 bilhões por ano em atenção primária. Para isso, eles precisam aumentar seu investimento em pelo menos 1% do PIB.
O diretor da OMS também lembrou que este não é só um problema de países pobres, uma vez que mesmo em países de alta renda os custos exorbitantes em saúde podem representar uma escolha entre um tratamento ou a falência econômica de uma família.
O foco na atenção primária também foi defendido em sua fala como uma maneira de se alcançar custos economicamente sustentáveis em saúde. “Precisamos fazer uma mudança radical – focar em proteger a saúde, ao invés de tratar doenças”.
Tedros Adhanom se dirigiu à plateia – que além de chefes de Estado, reuniu ministros da Saúde e especialistas em saúde e políticas públicas – para pedir avanços. “A saúde é uma escolha política – uma escolha que você tem o poder de fazer”, afirmou ao reconhecer a aprovação do documento como um importante sinal nesta direção.
A Fiocruz esteve presente no evento, assim como nas discussões anteriores que elaboraram o documento. Os representantes da Fundação, o ex-presidente e atual diretor do Centro de Relações Internacionais para Saúde (Cris-Fiocruz), Paulo Buss, e o pesquisador do Cris, Luiz Augusto Galvão, consideraram o texto final aprovado “uma declaração política concisa e orientada para a ação”, em texto escrito para o Centro de Estudos Estratégicos (CEE-Fiocruz).
Para os especialistas da Fiocruz, o documento aprovado avança em relação a versões anteriores, ao incluir um conceito abrangente de cobertura universal e ao reconhecer a necessidade de combater as iniquidades em saúde e as desigualdades dentro e entre países por meio de compromissos políticos e cooperação internacional.
“É um documento que acena com uma visão abrangente da saúde, doenças e cuidados, embora algumas vezes corra-se o risco de estar esbarrando em interpretações de termos e ideias, em função da forma pela qual determinadas assertivas estão ali inscritas”, avaliaram Buss e Galvão. O Brasil é um dos países que já tem cobertura e acesso universal em saúde, com o Sistema Único de Saúde (SUS), que é considerado um modelo internacional.
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Foto: © REUTERS / Eduardo Munoz