Principal base de proteção da Funai para índios isolados do país é atacada por caçadores

Por Matheus Leitão, no G1

A base de vigilância do Ituí, da Fundação Nacional do Índio (Funai), fincada na terra indígena do Vale do Javari, no Amazonas, foi atacada na noite desta quinta-feira (31) por caçadores armados. É o que informam indígenas da região ao blog.

A terra indígena Vale do Javari está localizada no extremo oeste do estado do Amazonas e tem fronteira com o Peru, ao fim de uma área de 8,5 milhões de hectares. É a segunda maior terra indígena demarcada do Brasil, atrás apenas da região dos Yanomami, que possui 9,6 milhões de hectares de extensão.

“Quando infratores saiam da terra indígena numa embarcação, foram percebidos pela guarita da base. Ao serem flagrados e iluminados no rio Ituí, começaram a atirar contra a guarita”, afirma o indígena Beto Marubo, da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja).

A base atacada fica na foz do rio Ituí, mais precisamente quando ele desemboca em outro rio, o Itaquaí, no extremo oeste do Amazonas. Nessa rica bacia hidrográfica, o Itaquai é afluente do rio Javari, que por sua vez deságua no rio Solimões.

Servidores da Funai consideram a base de Ituí como fundamental para a proteção da terra indígena do Vale do Javari, que concentra o maior número de povos indígenas isolados do mundo.

Dos 28 registros confirmados de índios isolados no país, 10 deles estão no Vale do Javari. Por isso, a base é definida por especialistas como a mais importante de índios isolados do Brasil. É também a maior delas e das mais antigas.

blog entrou em contato com a Funai na manhã deste sábado (2). A fundação afirmou que recebeu informações de que sua base de proteção ambiental no rio Ituí foi novamente atacada e que está trabalhando na apuração do caso.

“Estamos trabalhando para apurar as informações e nos articular junto às instituições de polícia responsáveis pela investigação do caso.”

O Ataque

A base de Ituí é uma das quatro da Funai que compõem a proteção dos principais rios de acesso à Terra Indígena do Vale do Javari. Segundo Beto Marubo, é o sétimo ataque à base do rio Ituí em um ano e terceiro em 2019.

“Das quatro bases, duas apresentam mais esse tipo de agressão. As bases do Ituí e a do Curaça estão mais visadas no atual contexto, a da retórica oficial de relativizar os direitos dos indígenas e a proteção dessas terras.”

De acordo com Beto Marubo, ao perceberem que foram avistados por servidores da Funai que trabalhavam na base, às 21h da quinta-feira (31), os caçadores atiraram usando espingardas, como ocorreu também em ataques anteriores.

“Normalmente são caçadores, pescadores e contrabandistas que estão saqueando a terra indígena. Eles usam a própria escuridão da noite para passar com toneladas de material, carne de caça e de pesca extraídas de forma predatória. Durante o dia eles sabem que o pessoal está em alerta”, relata Beto Marubo.

O papel de uma base da Funai como a de Ituí vai além do abrigo a servidores e a realização de fiscalizações. É da base que parte o trabalho de atendimento aos indígenas recém contatados, como os cerca de 30 da etnia Korubo em 2019.

Em março deste ano, o blog revelou detalhes da maior expedição dos últimos 20 anos (veja no vídeo acima), que teve o objetivo de fazer contato com esse grupo de índios isolados do Vale do Javari.

A missão evitou conflitos entre os Korubo do Coari (até então isolados) e outra etnia indígena da região, os Matis (já contatados). A megaexpedição partiu justamente da base de vigilância de Ituí, que agora foi atacada.

O posto da Funai faz proteção de outro afluente do rio Ituí, o Coari, onde desde março permanece o “acampamento de contato” dos Korubo. Índios recém contatados precisam do acompanhamento da Funai por meses para evitar sobretudo morte por doenças como gripe e sarampo.

“É a partir dessa base onde as equipes da Funai fazem o monitoramento, a assistência e o atendimento, que é diário. Então, um ataque desses não afeta só a parte de fiscalização, mas também o trabalho de assistência a esses índios”, explica Beto Marubo.

“Mais dia menos dia, isso pode acarretar na violência contra os próprios índios recém contatados e isolados. O alerta que fazemos é sobre esse discurso oficial de que as instituições no Brasil são maduras. Não é isso que nós estamos vendo”, finaliza o indígena.

Base de vigilância da Funai no rio Ituí, no Amazonas – principal posto de proteção para índios isolados do país. Foto: Funai

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