MPF aciona Incra e União para que concluam demarcação de território do quilombo Tabuleiro da Vitória (BA)

Processo teve início em 2013 mas o instituto não concluiu nem sequer a primeira etapa

Ministério Público Federal na Bahia

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública para que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a União concluam os processos administrativos de titulação e a demarcação do território de identidade quilombola do Tabuleiro da Vitória – localizado no município de Cachoeira, a 117km de Salvador. A ação foi recebida pela Justiça Federal no último 18 de dezembro, dois dias antes do recesso forense de 2019.

Segundo a ação, de autoria do procurador da República Edson Abdon Peixoto Filho, o território foi certificado pela Fundação Cultural Palmares como comunidade remanescente de quilombo em outubro de 2013. Porém, desde então o processo administrativo (nº 54160.0002850/2013-61) tramita junto ao Incra sem que sequer possua o Relatório Antropológico, que é o primeiro dos muitos estudos a compor o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID).

O MPF considera que a omissão do instituto contraria a Constituição Federal (art. 68 do ADCT) que determina: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. O procurador enfatiza, ainda, que a demora no andamento do processo – mais de cinco anos – provoca lesão à integridade da posse e da propriedade da comunidade quilombola, que fica sujeita a prejuízos morais, físicos e psicológicos devido à instabilidade da situação. “Ações intimidatórias, invasivas e de violência são impingidas contra os seus integrantes por particulares que se autoproclamam possuidores ou proprietários das terras ocupadas pelo agrupamento, afirma Peixoto.

Além do Incra, o MPF acionou a União, que possui a atribuição para decretação do interesse público e para o ajuizamento de ação de desapropriação, fases do procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pela comunidade quilombola.

Queda na titulação de propriedades de quilombolas – Segundo apurado pelo MPF, o direito dos remanescentes de quilombos à propriedade de suas terras, estabelecido em 1988 na Constituição, não é efetivado pelo Estado que, nesses 29 anos, apresentou apenas 124 títulos expedidos pelo Incra. O instituto, que possui 1.747 processos de regularização em andamento, apresenta uma queda em sua atuação nos últimos anos; em 2010 foram publicados 27 RTIDs e dez Portarias de Reconhecimento, enquanto em 2015, foram publicados 12 RTIDs e 1 portaria (dados do Incra acessados em 21 de junho de 2019).

De acordo com o MPF, essa desaceleração nos processos é causada por uma série de medidas e rotinas administrativas, instituídas no decorrer desse período, que possibilitam o trâmite processual com um prazo bem mais dilatado, se comparado a anos anteriores. “É o caso do estabelecimento pela direção do Incra de que as Portarias só sejam publicadas após sua autorização, trâmite não existente na Instrução Normativa 57/2009”, informa o procurador na ação.

Pedidos – O MPF requer, em medida liminar, que a Justiça Federal determine ao INCRA a obrigação de fazer consistente na elaboração e conclusão do RTID, relativo à comunidade remanescente de quilombo de Tabuleiro da Vitória, inclusive com os estudos antropológicos necessários à identificação do grupo, no prazo de 180 dias, sob pena de multa diária no valor de R$10mil. Em caráter definitivo, o MPF requer a confirmação da decisão liminar proferida e a determinação ao Incra e à União para que concluam todo o processo de regularização fundiária da comunidade quilombola no prazo máximo de doze meses, sob pena de multa diária no valor de R$10mil, que será revertida em prol do Fundo Nacional de Direitos Difusos.

Íntegra da ação

Número para consulta processual na Justiça Federal (PJe) – 1020422-41.2019.4.01.3300

E agora? A ação civil pública é ajuizada pelo MPF na Justiça Federal, dando início ao processo judicial para solucionar um problema que o órgão apurou ser de responsabilidade dos acionados. A partir de agora, cabe ao juiz designado para o caso dar seguimento ao processo, que inclui a manifestação judicial dos envolvidos. A Justiça deve, primeiro, analisar o pedido liminar – que pode ser concedido ou não –, e depois seguir até o julgamento do mérito do processo – etapa em que decide qual a responsabilidade de cada réu do processo no caso, o que pode resultar na condenação e na aplicação de penas aos acionados.

Etapas do processo de titulação – 1) Certificado de autorreconhecimento emitido pela Fundação Cultural Palmares ao Incra; 2) Elaboração do RTID (com informações cartográficas, fundiárias, agronômicas, ecológica, geográficas, socioeconômicas, históricas, etnográficas e antropológicas); 3) Publicação do RTID na imprensa oficial; 4) Publicação da Portaria de Reconhecimento pelo presidente do Incra; 5) Desapropriação de imóveis que estejam irregularmente instalados no território reconhecido; e 6) Titulação feita pelo presidente do Incra, por meio de outorga de título coletivo, imprescritível e pró-indiviso à comunidade. 

Arte: Secom/PGR

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