Segundo especialistas, medida tende a ser preparação para a aprovação do “pacote do veneno” na Câmara
Erick Gimenes, Brasil de Fato
O Ministério da Agricultura (Mapa) publicou na quinta-feira (27) uma portaria em que concede liberação automática a novos agrotóxicos que não forem analisados dentro de 60 dias pelo órgão. As regras passam a valer em 1º de abril.
Conforme a legislação, todas as atividades econômicas ligadas ao agronegócio que dependam de liberação do Mapa terão o alvará de funcionamento aprovados no prazo estabelecido para que não ocorra “omissão do poder público”.
Ao todo, 86 atividades tiveram prazos máximos estipulados pela portaria. Além dos agrotóxicos, a nova regra estipulou dias para o registro de produtos de origem animal não regulamentados (120), certificação sanitária para compartimentos de aves e suínos (365) e registro de produto de uso veterinário (720 dias).
A portaria não cita mudanças nas análises para liberação de agrotóxicos feitas pelo Ibama e pela Anvisa, necessárias na lei atual. Isso significa que o efeito prático da nova regra, isoladamente, é incerto, de acordo com Alan Tygel, da Campanha Permanente contra Agrotóxicos e Pela Vida.
“O decreto não pode ser mais forte que a lei. Enquanto a lei de agrotóxicos atual, 7.802, estiver válida, esse decreto realmente fica um pouco difícil de entender o que ele consegue fazer. Porque, pela lei atual, o Ministério da Agricultura não aprova sozinho”, explica.
Tygel diz acreditar que a portaria tende a ser uma preparação para a aprovação do projeto de lei 6.299, a nova lei de agrotóxicos, conhecida como “pacote do veneno”, que tramita na Câmara dos Deputados. “O que a gente chegou à conclusão é que seria já uma preparação para uma outra lei. Com a lei atual, não tem tanto sentido”, diz.
O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo, também membro da Campanha Permanente, é outro que considera que a portaria é um indicativo de que o governo está contando com a aprovação das novas regras para os agroquímicos no país.
Tanto projeto de lei quanto portaria atrofiam o poder de Ibama e Anvisa e centralizam o poder de decisão nas aprovações ao Ministério da Agricultura. Melgarejo questiona a capacidade estrutural da pasta de atender à demanda de análises.
“Eu gostaria de saber quais são os estudos que podem ser feitos em 60 dias e quais são os estudos que serão descartados, mesmo sob o ponto de vista do Ministério da Agricultura. Porque, hoje, eles não têm capacidade de fazer essas análises nessa velocidade”, afirma o engenheiro.
Segundo ele, a estrutura atual do Mapa já é insuficiente para verificar os registros. “Sem ampliar os quadros, sem ampliar os laboratórios, sem ampliar a capacidade de análise, ninguém pode fazer análise mais rápida. Eles estão dizendo que vão dispensar alguns casos de análises, que vão ser aprovados sem ser analisados. A primeira pergunta é: que casos são esses que poderiam ser dispensáveis?”, indaga Melgarejo.
Edição: Leandro Melito