Guedes/Bolsonaro e o Plano Ipiranga da nova etapa da dependência no Brasil

Eis o novo patamar de dependência e subordinação que se impõe sobre a economia brasileira: um capitalismo miliciano e chantagista de uma burguesia dependente que, na defensiva, abre mão do desenvolvimento das forças produtivas e vai se subordinando à liderança de uma lumpenburguesia servil que cobra comissões e vive de oportunidades cambiais para fabricar o seu próprio capital fictício.

Por Carlos Eduardo Martins*, no blog da Boitempo

A novidade do governo Bolsonaro em relação aos governos FHC, Lula e Dilma, que se articularam com o protagonismo dos bancos nacionais no padrão de acumulação brasileiro, é que Guedes pretende deliberadamente quebrar o sistema financeiro nacional para usar o terror econômico e privatizar radicalmente o Estado brasileiro, liquidando-o, com atenção especial aos bancos públicos.

Para tanto sua estratégia é a seguinte:

  1. Aprofundar a EC 95 realizando um congelamento de gastos nominais;
  2. Baixar radicalmente os juros da SELIC;
  3. Estrangular o investimento público, restringindo radicalmente o crédito e reduzindo o BNDES a um papel decorativo; e
  4. Destruir as reservas brasileiras vendendo dólar para abater o principal da dívida pública, fortalecendo a sua demanda pelos agentes privados, a especulação e a fuga de capitais do país. Com a dolarização da economia brasileira estaria se comprando a adesão dos banqueiros e rentistas nacionais a este processo e compensando a transição para outro modelo.

A essa estratégia soma-se, como fator agravador, a crise internacional sistêmica.

Com esses ingredientes – redução das taxas de juros, estrangulamento do investimento público e do crédito ao setor privado, liquidação das reservas brasileiras e crise internacional – estão colocadas todas as premissas para a quebra do setor financeiro nacional e o uso do terrorismo econômico para sua radical internacionalização e privatização do setor público brasileiro.

Liquidando os bancos públicos, Guedes imporá ainda um muro de contenção para futuras políticas keynesianas, o que tornou-se o verdadeiro pavor da burguesia interna brasileira pela sua capacidade de gerar empregos e pressões sociais.

Trata-se do capitalismo miliciano e chantagista de uma burguesia dependente que, na defensiva, abre mão do desenvolvimento das forças produtivas e vai se subordinando à liderança de uma lumpenburguesia servil que cobra comissões e vive de oportunidades cambiais para fabricar o seu próprio capital fictício. Este é um novo patamar de dependência e subordinação que se impõe sobre a economia brasileira. Se o neoliberalismo do governo FHC e do segundo mandato de Dilma destruíram a indústria, a sua nova versão busca liquidar o Estado que restava da era Vargas – indutor do crescimento, baseado no servidor público de carreira e na tecnoburocracia – e atingir os bancos nacionais.

Como venho insistindo, nesse processo, as poupanças das classes médias, que não têm dinamismo e informação para acompanhar essas oscilações, virarão água.

A continuar nesse diapasão, o nosso futuro será determinado pelo capitalismo colonial, a superexploração do trabalho, o precariado, o trabalho escravo, o neofascismo e as distopias. Continuaremos aceleradamente transformando futuros médicos, engenheiros, assistentes sociais, psicólogos, sociólogos, advogados, dentistas, biólogos em entregadores de pizza no Uber Eats.

A menos que as esquerdas e os setores comprometidos com a democracia e o desenvolvimento consigam romper o pântano ideológico em que nos encontramos e a organizar as massas para enfrentar este projeto de ocupação que não tem precedentes na República brasileira.

*Professor Associado do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ e Coordenador do Laboratório de Estudos sobre Hegemonia e Contra-Hegemonia (LEHC/UFRJ). 

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