O presidente do Brasil não tem qualquer doença mental, como alguns alegam. Não. Ele simplesmente é um competente feitor do capital. E o que é um feitor? É o que guarda, como um cão feroz, uma riqueza que não é sua, que é dos patrões. No seu pronunciamento à nação fez o que qualquer capacho faria: tomou partido do mercado, do capital, conclamando os trabalhadores a saírem da quarentena, e seguirem vendendo sua força de trabalho a despeito de perderem a saúde, quiçá a vida. Segundo ele, vão morrer aí “uns sete mil”, mas isso não tem importância. Porque os que vão morrer são os velhos e os que têm alguma doença grave. Os “atletas”, como ele, pegarão apenas uma gripezinha e pronto. Já está. Que morram os inúteis para o capital. Não importa o tanto de vida e valor que eles já tenham criado ao longo de suas vidas laborais.
Os velhos, até ontem, eram a principal preocupação dos governos. Os governantes até realizaram uma série de reforma no sistema de Previdência porque, segundo eles, os velhos estavam onerando o tesouro, visto que viviam muito depois da aposentadoria e o estado precisava bancar essa gente inútil por anos a fio. Em diversos países a reforma se fez, inclusive no Brasil, justamente para tentar conter o gasto com os novos aposentados. Aumentar a idade mínima, aumentar o tempo de serviço, enfim, fazer com que a acumulação capitalista pudesse se estender para o próprio corpo. Usando a medicina para prolongar a vida, mas ao mesmo tempo fazendo com que o corpo fosse até mais lá na frente servindo ao deus mercado. Trabalhar até o esgotamento, até os 80, 90 anos.
A reforma da Previdência passou no Brasil sem maiores gritarias por parte das centrais sindicais. Alguns sindicatos mais aguerridos tentaram lutar, mas estavam sozinhos. No dia da votação tudo passou tranquilamente. E os mesmos deputados que agora criticam a fala do presidente votaram sim à reforma sem nem ruborizar. Estavam igualmente condenando os velhos, tal e qual o mandatário hoje. Para eles, era absurdo que o estado pudesse continuar dispendendo dinheiro para os velhos viverem a vida depois de mais de 40 anos de trabalho.
Agora, das profundezas de algum lugar não sabido, surge o coronavírus, provocando uma doença que é mais letal justamente aos velhos e aos debilitados. Um vírus providencial. Acabar com essa penca de “inúteis” pode ser uma grande pedida. Imaginem quantas aposentadorias deixarão de ser pagas? É perfeito. Então, governantes como o nosso observam isso e chegam a clara conclusão: que as coisas sigam seu curso. Que os velhos e debilitados morram e deixem de onerar o estado.
Diz ele que basta isolar esse grupo de risco e tudo bem. Mas qualquer criança sabe que o isolamento seguro não existe. Não tem como acontecer na maioria das casas das famílias brasileiras. Eles não estarão protegidos de jeito nenhum. Vão pegar o vírus e morrer. Então, a proposta presidencial está ampara não na loucura, mas na racionalidade do capital. Ele não vê razão gastar dinheiro com essa gente inútil. Então, nada de quarentena, nada de hospitais, nada. Que morram, asfixiados na solidão.
Não há novidade alguma nisso. O sistema capitalista de produção nunca se preocupou com a saúde dos trabalhadores. Tanto que os explora até a exaustão. Sabe que tem um exército de reserva pronto para assumir quando um trabalhador tomba. E está tudo bem. Então, não há porque esperar que aqueles que dominam o mundo e os seus ferozes feitores se preocupem com a vida da gente. É por isso que a dengue, o zicavírus, a chicungunha, a malária, o sarampo, a tuberculose, o câncer, tudo isso nos mata todos os dias. Porque não importamos. E se o trabalhador produtivo, que ainda gera valor não importa muito, imagina os inúteis, os velhos e doentes, que não podem mais ser explorados pelo capital?
Por isso que nessa hora de angústia e de pandemia, na qual milhares morrerão, só há uma forma de resistir: lutar coletivamente, cuidar uns dos outros, acreditar na ciência e no que ela produziu de bom para a humanidade, apostar na abnegação dos trabalhadores da saúde – médicos, enfermeiros, e todas as categorias de suporte – manter a solidariedade de classe e derrubar todos aqueles que pretendem nos mandar para o corredor da morte.
Nos tempos da escravidão, quando os feitores eram senhores da vida e da morte, com seus cavalos e chicotes, homens e mulheres os enfrentavam e fugiam para os quilombos, a vida livre. É tempo de enfrentarmos os feitores do capital. Somos a maioria.
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