Na 18ª Semana dos Museus, museus comunitários combatem a pandemia com ações no território e aulas virtuais

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A 18ª Semana de Museus (SNM) é uma ação de promoção dos museus brasileiros coordenada pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) que reúne instituições museológicas, durante uma semana -este ano entre os dias 18 e 24 de maio- em torno de atividades abertas ao público. Este ano o mote norteador da 18ª Semana de Museus é: “Museus para a Igualdade: diversidade e inclusão”, porém os eventos presenciais planejados para a 18ª SNM foram cancelados e as atividades foram oferecidas em uma programação online.

Tradicionalmente a semana conta com a participação intensa dos museus comunitários do Rio. Estes são experiências de museologia social, são museus em contato permanente com seus territórios, pois são formados e construídos por ações de moradores de favelas e comunidades, ligados e unidos por afetividades. Tendo a função social de elaboração de contranarrativas históricas, museus comunitários são focados em preservar o direito a memória e a luta popular.

Porém, em 2020, diante da pandemia da Covid-19, como é o caso também de inúmeras outras organizações comunitárias, o foco das ações de museus e projetos de memória nas favelas e quilombos do Rio têm se voltado para o combate à pandemia em suas comunidades.

Museus e Projetos de Memória no Combate à Pandemia

Os museus comunitários são museus vivos, e estão à frente do combate à Covid-19 em ações diretas dentro dos territórios e nas redes sociais. Acostumados a não apenas guardar a memória, agora, mais do que nunca, equipes e instituições participam da história, realizando diretamente a mobilização.

“Isso vem acontecendo em todos os lugares onde existem museus comunitários. Eles estão se integrando as campanhas ou os próprios museus estão promovendo campanhas, porque o poder público para mitigar as consequências da pandemia é muito tímido diante da responsabilidade que o poder público deveria ter com as favelas. Chega a ser insignificante. Então, as organizações, coletivos e os museus comunitários, tomaram a frente”, explica Claudia Rose Ribeiro Da Silva, coordenadora do Museu da Maré.

Museu da Maré

Desde o início da quarentena, o Museu da Maré, no Complexo da Maré, na Zona Norte, gestado pelo Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM), está fechado para visitas, mas apoia a Frente de Mobilização da Maré, com 60 pessoas atuando como voluntárias. O espaço tem servido de ponto de apoio e participado da campanha para reduzir os danos da pandemia. A Fiocruz destinou uma doação de 2.200 cestas básicas e kits de higiene para o Museu da Maré, que redirecionou-os para a Frente de Mobilização da Maré.

O Museu da Maré estava com várias atividades presenciais inscritas para serem realizadas na 18ª Semana Nacional dos Museus, mas todas foram adiadas. No momento, “nossa participação, especialmente nesta semana, é no fortalecimento da campanha da Frente de Mobilização da Maré. Isso é importante não apenas porque mostra como o museu comunitário atua, mas como todo o museu precisa assumir seu papel social e entrar nesta luta contra a pandemia”, afirma Claudia.

Associação Cultural Quilombo do Camorim (ACUQCA)

No Quilombo do Camorim, sítio arqueológico de um quilombo rural que se tornou um quilombo urbano, em Jacarepaguá, na Zona Oeste, Adilson Batista Almeida explica que lá também todas as atividades da ACUQCA com escolas e faculdades foram suspensas antes mesmo do decreto municipal que impôs o fechamento de museus, teatros e cinemas para a contenção da pandemia. “Tínhamos um evento grande em abril e vimos que não íamos ter como fazer. Então, agora nossa frente está na organização de ajuda social com cestas básicas à comunidade e orientação sobre prevenção da Covid-19, as baixas e doentes com a doença”, ressalta. Houve três mortes na comunidade.

“O Estado não dá suporte nenhum, já não dava antes, agora piorou”, aponta. Em 2019, o sítio arqueológico comunitário, recebeu 15.000 alunos de escolas públicas da região, de acordo com Adilson Almeida, presidente e diretor da Associação Cultural Quilombo do Camorim (ACUQCA).

Rolé dos Favelados

No Morro da Providência, no Centro, o Rolé dos Favelados -uma ação de vivência com visão crítica que conta a história de luta da primeira favela do Rio de Janeiro- agora tornou seu foco o movimento SOS Providência. As ações estão voltadas para apoiar a comunidade no combate à Covid-19, junto com diversos moradores, movimentos sociais e instituições da região.

Além de entregar cestas básicas e produtos de higiene, o Coletivo SOS Providência, formado por projetos e moradores que atuam no Morro da Providência e na Região do Porto, está realizando o projeto Morador Monitor, que com apoio de 12 voluntários -protegidos por equipamentos de proteção individual- em sua primeira campanha, entre 4-9 de maio, conseguiu mapear 90% do território do Morro da Providência e da Região do Porto. Até 10 de maio, o levantamento, do projeto já havia detectado 10 mortes, 34 casos confirmados e 368 casos suspeitos.

O objetivo do censo, além de informar e alertar sobre casos subnotificados na comunidade, é mapear as necessidades das famílias de cestas básicas, kits de higiene, auxílio psicológico, suporte para solicitação de auxílio emergencial, dentre outros. O coletivo está com duas vaquinhas online abertas para o custeio da manutenção e ampliação do trabalho de ajuda comunitária. O financiamento coletivo para arrecadar fundos, além de comprar cestas básicas e kit de higiene, também propõe remunerar os monitores, que recebem R$500 pela semana de trabalho, gerando renda também para moradores e para dentro da favela.

Casa do Jongo da Serrinha

A Casa do Jongo da Serrinha, em Madureira na Zona Norte, que acolhe crianças locais com aulas de dança, instrumentos e cultura popular, e guarda um espaço vivo de memória e prática do jongo e do samba na Serrinha, também está voltada para auxiliar a comunidade.

Devido às restrições do isolamento físico, grande parte dos moradores da Serrinha, que vivem do trabalho informal, estão desempregados. A Companhia de Aruanda, coletivo artístico e cultural da região, lançou a Campanha Avante Serrinha. Já a associação de moradores recebeu doações de alimentos, água e recursos financeiros. Para ajudar, entre em contato com Flávio da Silva França Alves pelo e-mail [email protected].

Museu das Remoções

O Museu das Remoções, na Vila Autódromo, Zona Oeste, um museu de resistência destinado a preservar a memória das remoções, completou quatro anos em meio à pandemia da Covid-19. Por conta disso, este ano, os moradores não puderam se reunir para festejar, mas o museu comunitário não deixou a data passar despercebida. “Queremos agradecer a todas as pessoas que estão na luta contra as remoções. Essa batalha se constrói diariamente. E, nesse momento tão difícil, reforçamos a importância do isolamento social para o combate à Covid-19. Se possível, fique em casa, pois, diante de tal situação, ficar em casa é um ato de cuidado com você e com o próximo❤”, pediu em um post publicado no Facebook.

Durante a pandemia, o museu promoveu uma aula virtual, no 14 de maio, com a professora Diana Bogado sobre planejamento urbano contemporâneo atrelada à política de remoções de favelas e comunidades periféricas nas metrópoles.

Ecomuseu de Sepetiba

De acordo com a coordenadora Bianca Wild, o Ecomuseu de Sepetiba na extrema Zona Oeste da cidade, agora está voltado para a conscientização da população sobre a prevenção e cuidados necessários ao coronavírus. Parte da equipe mora com pessoas que fazem parte dos grupos de risco para a Covid-19. “Não podemos ir a campo, então estamos buscando uma alternativa: fazer lives semanais com temas que nós consideramos relevantes.”

Em 20 de maio, o Ecomuseu de Sepetiba celebrou a Semana Nacional dos Museus, com uma live transmitida no Facebook.

Museu Casa do Bumba Meu Boi em Movimento

O Museu Casa do Bumba em Movimento, da organização Raízes do Gericinó, na Vila Catiri, em Bangu na Zona Oeste, possui “um acervo vindo diretamente do Maranhão, e o saber vernacular encarnado em uma família tradicional do sertão maranhense, principalmente na Dona Rosa, ex-quebradeira de Coco Babaçu e detentora do saber da dança e da religiosidade incutida no folclore em relevo.”

No Dia Internacional Do Museu, 18 de maio, a TV 247 organizou um debate para ressaltar a importância do papel dos museus comunitários frente à pandemia, com a participação de vários museus comunitários. Auricelia Mercês, integrante do Museu Casa Bumba Meu Boi em Movimento, disse que o maior desafio na pandemia não é a mobilização para o combate ao coronavírus, mas a falta de abraço. “Aqui neste museu temos a questão do afeto como muito importante dentro do território.”

Segundo ela, não é a primeira vez que a comunidade lida com a fome. Ela sempre existiu. Mas, agora, a fome aumentou. De março até agora, o museu atendeu 2000 pessoas da comunidade. “O nosso museu é de base comunitária… Na ausência do poder público, nós estamos aqui presentes. A gente não vai desistir. Perdemos amigos, pessoas estão isoladas, mas não vamos desistir de lutar. Esse é o meu recado.”

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