Imprensa: editoria sobre pandemia passa a se chamar De Olho no Genocídio

De Olho nos Ruralistas marca posição em relação à matança em curso, enfatizando seu aspecto político, e não biológico, durante um governo fascista; observatório dará ênfase ao impacto nos povos do campo, os indígenas, camponeses e quilombolas

Por Alceu Luís Castilho, em De Olho nos Ruralistas

A cobertura do De Olho nos Ruralistas sobre pandemia passa a se chamar, a partir desta semana, De Olho no Genocídio. A imagem feita pelo ilustrador Eduardo Baptistão — Bolsonaro com uma arminha, dentro de um coronavírus — sintetiza a proposta do observatório.

As notícias publicadas continuarão a ter as características de notícias: baseadas em fatos, em dados, nas políticas realizadas (ou não realizadas) pelo governo, no que acontece pelo país com os povos do campo — indígenas, quilombolas, os camponeses em suas várias ramificações — durante a crise do novo coronavírus.

Mas o objetivo da nova editoria é explicitar o aspecto político dessa matança. A comparação com outros países da América Latina mostra que o Brasil tomou uma decisão que prevê as mortes em larga escala. O país já é o segundo com mais casos de Covid-19 no mundo e caminha para ser, em breve, o segundo em número de mortes, atrás somente dos Estados Unidos.

Jair Bolsonaro e Donald Trump já estão na história como protagonistas da maior crise do século 20. E ambos assinam os massacres. O presidente brasileiro vai além e faz questão de desafiar as normas da Organização Mundial da Saúde (OMS), colocando pessoas na rua em risco. Ou mantendo a pasta da Saúde sem ministro, após duas demissões, em plena explosão dos casos da doença no Brasil.

COBERTURA SOBRE QUILOMBOLAS SERÁ AMPLIADA

A equipe de repórteres do observatório já vem se dedicando ao tema nos últimos meses. A cobertura do impacto nos povos indígenas, por exemplo, destacou pontos importantes desse genocídio, como a escalada de casos pelas diversas etnias: “Pandemia entre indígenas já atinge os nove estados da Amazônia Legal“.

A série Memórias da Pandemia traz perfis elaborados de vítimas da Covid-19 entre os povos do campo. Vocês conhecem a história de Aldevan Baniwa? “Memórias da Pandemia — Aldevan Baniwa, a vítima da Covid-19 que ensinava pesquisadores a ver“. Ou a de Messias Kokama? “Memórias da Pandemia — Messias Kokama: um cacique de muitos povos“.

A cobertura sobre o impacto nos povos quilombolas será ampliada. O Google informou na quinta-feira (28) que o De Olho nos Ruralistas foi um dos 380 veículos brasileiros selecionados para um apoio à cobertura da pandemia em redações pequenas e médias. O projeto apresentado trata exatamente do impacto sobre esses povos, descendentes de negros escravizados. Ele fará parte da cobertura da editoria De Olho no Genocídio.

A escolha do nome da nova editoria está relacionada aos 500 anos de história do Brasil. A matança dos povos indígenas, inclusive por doenças como gripes e resfriados, começou em 1500. E mesmo as vítimas dos massacres nas favelas, nas periferias e nos presídios descendem de indígenas, de quilombolas e de camponeses expulsos do campo por motivos econômicos ou por um êxodo rural violento.

DESTRUIÇÃO AMBIENTAL TAMBÉM SERÁ DESTACADA

Esse êxodo rural foi marcado pela grilagem — farsas jurídicas movidas também pela violência — e pelo desmatamento sistemáticos. Esses dois processos estão entre os principais temas do observatório, desde sua pré-história, em 2013 e 2014, e quando o site De Olho nos Ruralistas foi ao ar, em setembro de 2016. E eles estão em curso, seja em Brasilia, seja nos rincões do país. Por isso, estão entre os principais temas do observatório.

Uma das imagens feitas para o De Olho no Genocídio pelo ilustrador Eduardo Baptistão mostra Ricardo Salles abrindo uma porteira, após a divulgação de vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, onde o ministro do Meio Ambiente disse que era preciso aproveitar a “tranquilidade” oferecida pela imprensa durante a pandemia para aprovar desregulamentações de leis ambientais. “Ir passando a boiada”, como ele disse.

Este veículo jornalístico coloca essa boiada igualmente na conta do genocídio. Pois o desmatamento prevê também, em meio à destruição de espécies vegetais e animais, a mencionada expulsão dos povos do campo. Além de ter conexão direta, de mãos dadas com o agronegócio (em particular, com a pecuária), com o surgimento de pandemias pelo mundo.

No dia 17 de maio, mais de cem organizações lideradas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) publicaram um anúncio de página inteira na Folha e em O Globo, a apontar exatamente um genocídio dos mais pobres no Brasil. Não foi só mais uma “carta de repúdio”, como tantas escritas nos últimos tempos, mas um aviso de que serão tomadas iniciativas jurídicas contra o governo federal.

Entre as organizações que assinaram essa nota estão instituições ligadas aos povos do campo, como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Quilombolas (Conaq), ao ambiente, como o WWF-Brasil. Confira aqui a notícia: “Mais de cem organizações já assinam alerta contra genocídio e por responsabilização do governo“.

O QUE OS DEMAIS HOMENS PÚBLICOS ESTÃO FAZENDO?

Quinze dias depois dessa iniciativa, é momento de se fazer novo alerta. Até porque o genocídio em curso não se restringe ao presidente fascista e de extrema-direita que está no poder em Brasília. Ele é corroborado, diariamente, por figuras públicas de instituições diversas. Sob o olhar conivente de boa parte da sociedade.

Nas redes sociais, divulgamos há algumas semanas cards questionando a falta de ações do Congresso, do Ministério Público Federal (MPF) e do Supremo Tribunal Federal (STF) em meio ao genocídio. As peças de divulgação trazem os rostos dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, do Senado, Davi Alcolumbre, do STF, Dias Toffoli, e do procurador-geral da República, aliado de Bolsonaro, Augusto Aras.

Nos próximos dias, outros ministros do STF serão cobrados.

A pergunta da série é: eles também decidiram entrar para a história como genocidas?

Imagem principal: Eduardo Baptistão

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