Coronavírus avança “sem controle” na maior reserva indígena do Brasil

Terra Indígena Yanomami, no Amazonas e Roraima, tem 1.202 casos confirmados e 23 óbitos, mas lideranças afirmam que números reais são muito maiores. Relatório acusa autoridades de omissão e culpa garimpo.

Por Deutsche Welle

O novo coronavírus avança rapidamente na maior reserva indígena do Brasil, a Terra Indígena Yanomami, localizada entre os estados de Roraima e Amazonas, ao longo da fronteira com a Venezuela.

Um relatório elaborado por lideranças ianomâmis e iecuanas e divulgado nesta quinta-feira (19/11) afirma que o número de casos confirmados ali já passou de 1.200 e que até 10 mil indígenas podem ter sido expostos ao novo coronavírus, ou mais de um terço dos moradores da reserva.

Somente de agosto a outubro, o número de casos confirmados passou de 335 para 1.202, ou mais de 250% de aumento em apenas três meses.

O relatório, elaborado pela ONG Rede Pró-Yanomami e Ye’kwana e pelo Fórum de Lideranças da Terra Indígena Yanomami, também denuncia omissão e descaso das autoridades, “que estão deixando marcas profundas na vida” dos indígenas.

As lideranças afirmaram que o garimpo ilegal é o principal vetor para a expansão da doença dentro da reserva. “Vivemos de novo uma grande invasão garimpeira e, com ela, chegam as epidemias, como aconteceu no passado”, disseram.

“O Estado brasileiro é omisso ao deixar a reserva, demarcada e homologada, se transformar, em plena pandemia, num território de livre circulação de invasores, uma multidão de transmissores de doenças infecciosas.”

Falsa impressão de controle da epidemia

Os primeiros casos foram registrados em abril. Desde então foram confirmadas 1.202 infecções, que resultaram em ao menos dez mortes. Outros 13 óbitos foram registrados como suspeitos. Destes, todos eram sintomáticos e tiveram contato próximo com casos confirmados, porém não foram testados a tempo.

Os indígenas consideram preocupante que as autoridades não tenham investigado esses casos, e suspeitam de uma estratégia deliberada de subnotificação, que, segundo eles, cria uma falsa impressão de controle da epidemia na reserva.

“Os fatos mostram que a transmissão comunitária está fora de controle em muitas aldeias, e as autoridades sanitárias parecem se dedicar ao mascaramento de sua negligência”, diz o relatório.

Os indígenas disseram que as autoridades testam pouco e mal, usando principalmente testes rápidos, cuja eficácia é de apenas 55%. “Com o uso de uma quantia muito insuficiente de testes rápidos em locais com alta chance de transmissão comunitária, a real situação da pandemia nas aldeias ianomâmis e iecuanas fica mascarada”, diz o relatório.

“Dados do Ministério da Saúde indicam que há 11 regiões da reserva onde menos de dez testes foram realizados e outras três onde nenhum teste foi feito, ou seja, em mais de um terço das regiões há pouquíssima informação sobre a chegada da covid-19, reforçando as denúncias dos indígenas de que em realidade o número de contaminados pode ser muito maior”, acrescenta.

As vítimas ianomâmis do novo coronavírus têm sido, em sua maioria, pessoas que estão nas pontas opostas da vida: os idosos e os bebês, afirmaram as lideranças. Entre os 23 óbitos confirmados e suspeitos, seis eram bebês com menos de 2 anos e 12 eram pessoas com mais de 50 anos.

A Terra Indígena Yanomami abrange uma área de cerca de 9,6 milhões de hectares e é habitada pelos povos ianomâmis e iecuanas. Sua população atual é de pouco mais de 26,7 mil pessoas, distribuídas por cerca de 360 aldeias.

Imagem: a Terra Indígena Yanomami – Daniel Klajmic/Instituto Socioambiental

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