O que falta para oposição criar um clima político favorável ao impeachment? Por João Filho

A oposição de hoje não aprendeu nada com os opositores de Dilma? O impeachment de Bolsonaro teria a vantagem de ser dentro da lei, sem forçações de barra institucionais, sem golpe.

No The Intercept Brasil

EM MARÇO DO ANO PASSADO, Bolsonaro publicou no Twitter um vídeo pornográfico. Você se lembra do episódio Golden Shower, o primeiro grande vexame internacional de um governo com apenas três meses de mandato. Para muitos juristas, o presidente cometia ali o seu primeiro crime de responsabilidade, o que acabou motivando o primeiro pedido de impeachment protocolado na Câmara. De lá para cá, Bolsonaro protagonizou uma série de outros episódios que poderiam ser enquadrados como crimes de responsabilidade. Passado um ano após o primeiro pedido de impeachment, outros 14 crimes de responsabilidade já haviam sido cometidos.  Até os dias de hoje esse número certamente já ultrapassou a marca dos 20, mas eu já perdi as contas.

Bolsonaro já deixou claro qual é o seu projeto para o país: a dilapidação do estado e a depredação da democracia. Trata-se de um projeto até aqui muito bem-sucedido: a saúde, a educação, o meio ambiente, a cultura, enfim, todos os serviços públicos estão sofrendo um processo de desmonte gradual. Gradual, mas acelerado. Ao que tudo indica, sobrará pouco do país ao final do mandato.

Só um impeachment poderia interromper este mandato que despreza a democracia e asfixia os que mais dependem dos serviços públicos: os mais pobres. Passados dois anos, não vemos no horizonte a possibilidade de impeachment. A principal razão para essa paralisia seria a falta de apoio do Congresso à sua aprovação. De fato, um pedido deste tipo hoje não contaria com o voto da maioria dos deputados e senadores. Faltam as condições políticas. Mas isso não justifica a paralisia da oposição. Apoio político se constrói, não cai do céu. E nada está sendo feito para mobilizar os deputados a mudarem de ideia.

O clamor pelo impedimento de Dilma começou logo após a sua reeleição. Ela contava com popularidade e uma boa base de apoio no Congresso. Mas a oposição soube criar o clima e, com a ajuda fundamental da imprensa, colocou a palavra “impeachment” com força no noticiário. As manifestações de rua foram uma consequência desse processo.

A popularidade começou a desabar, e Dilma foi perdendo aliados políticos depois de um “grande acordo nacional” ser articulado para derrubá-la. Todas as tentativas do governo de frear o aprofundamento da crise econômica foram barradas pelas “pautas bombas”. Isolada politicamente, Dilma acabou sendo derrubada por um motivo ridículo: pedaladas fiscais — algo infinitamente menos grave que todos os crimes de responsabilidade cometidos por Bolsonaro.

A oposição de hoje não aprendeu nada com os opositores de Dilma? O impeachment de Bolsonaro teria a vantagem de ser dentro da lei, sem forçações de barra institucionais, sem golpe. O que falta para nossa oposição começar a criar um clima favorável ao impeachment desse homem que vem praticando atentados sucessivos à democracia?

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