Brasil: Assassinato do defensor de direitos humanos e trabalhador rural sem-terra Fernando dos Santos Araújo

Por Front Line Defenders

No dia 26 de Janeiro de 2021, o defensor de direitos da terra Fernando dos Santos Araújo foi assassinado em sua casa na Fazenda Santa Lúcia em Pau D’Arco. Fernando foi um trabalhador rural sem-terra na região da Amazônia, gay e um dos sobrevivente do Massacre de Pau D’Arco em 2017, tornando-se testemunha chave no processo criminal que apura o caso.

Fernando dos Santos Araújo atuou em defesa da terra no estado do Pará, uma das regiões mais perigosas para defensores de direitos humanos no Brasil. Fernando foi testemunha e sobrevivente da maior chacina de trabalhadores rurais no Brasil desde 1996, o Massacre de Pau D’Arco, que ocorreu em 24 de maio de 2017 e resultou na morte de 10 trabalhadores rurais, incluída a liderança Jane Julia, por um pelotao policial na Fazenda Santa Lucia. Fernando, que conseguiu escapar, viu seu companheiro ser morto durante o massacre. Fernando era uma das poucas testemunhas oculares do caso criminal contra os 16 policiais civis e militares. Seus depoimentos, desde o início da investigação, foram fundamentais para elucidar os acontecimentos, antecipando o que a perícia técnica confirmaria sobre o massacre.

No dia 26 de janeiro de 2021, Fernando Santos Araújo foi encontrado morto em sua residência, com um tiro na nuca. Ele estave incluído no Programa de Vítimas e Testemunhas devido aos riscos que enfrentava. Ainda em 2017, regressou à Fazenda de Santa Lúcia, na esperança de conseguir a reforma agrária com a criação do assentamento para as dezenas de famílias do Acampamento Jane Júlia. Apesar das constantes ameaças e intimidações, Fernando continuou atuando como um porta-voz dos sobreviventes, tornando-se uma figura essencial na busca por justiça das vítimas do Massacre de Pau D’Arco.

O assassinato de Fernando dos Santos Araújo aconteceu apenas um dia após seu advogado, José Vargas Sobrinho Junior, ter sido transferido do presídio para a prisão domiciliar. Exatamente 25 dias antes do assassinato de Fernando, o advogado foi preso preventivamente em virtude de uma investigação caracterizada por falta de evidências e diversas falhas, como foi evidenciado pela OAB-PA. José Vargas tem um papel destacado na defesa dos trabalhadores rurais sem-terra no sul do Pará, sendo amplamente reconhecido pelas suas ações em assistência das vítimas do Massacre de Pau D’Arco. O advogado e defensor de direitos humanos está incluído no Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos do estado do Pará desde 2017, em decorrência dos riscos que enfrenta em relação a sua atuação neste caso.

Apesar das investigações sobre o os perpetradores do Massacre de Pau D’Arco terem avançado, ainda há muitas questões em aberto, sendo que ainda não houve acusações contra os mandantes do crime. Em abril de 2018, após audiências de instrução e julgamento, os 16 policiais acusados do massacre, que respondem processo, obtiveram a possibilidade de aguardar o julgamento em liberdade. A partir disso, eles foram reestabelecidos em suas funções e permanecem ativos, inclusive com direito a posse de armas.

A Front Line Defenders condena o assassinato de Fernando dos Santos Araújo, por considerar que ele foi alvo e morto exclusivamente por seu trabalho pacífico em defesa dos direitos da terra. A Front Line Defenders manifesta ainda preocupação pelo fato de que o defensor foi assassinado em um contexto no qual o seu advogado enfrenta um processo judicial questionável. Ambas situações acarretam impactos negativos sobre a busca de justiça para as vítimas do Massacre de Pau D’Arco.

A Front Line Defenders manifesta também preocupação pela falta de progresso nas investigações desde o assassinato de Fernando dos Santos Araújo. A Front Line Defenders recebeu informações sobre diversas inconsistências envolvendo os procedimentos periciais; há mais de uma semana dos assassinato, ainda não há parecer público da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Pará (SEGUP-PA) acerca da linha de investigação adotada para o caso. As organizações locais da sociedade civil também não receberam respostas das autoridades sobre quais serão as ações tomadas para garantir a segurança daqueles que ainda vivem na área.

A Front Line Defenders insta as autoridades no Brasil a:

  1. Condenar publicamente o assassinato do trabalhador rural e defensor de direitos da terra Fernando dos Santos Araújo e garantir que a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Pará emita um parecer oficial condenando o assassinato;
     
  2. Assegurar que a investigação acerca do assassinato de Fernando dos Santos Araujo seja imparcial, transparente e em linha com os mais elevados parâmetros internacionais, levando em consideração o seu papel como defensor de direitos da terra, testemunha ocular crucial e sobrevivente do Massacre do Pau D’Arco;
     
  3. Assegurar a proteção dos moradores do Acampamento Jane Júlia e de todas as testemunhas do Massacre de Pau D’Arco, assim como de seu advogado e defensores de direitos humanos envolvidos com o caso;
     
  4. Garantir, em todas as circunstâncias, que todos os defensores e todas defensoras de direitos humanos no Brasil, em particular aqueles que defendem direitos da terra, possam realizar suas atividades legítimas sem medo de represálias e livres de quaisquer restrições, inclusive assédio judicial.

Foto: Marcelo Casal Jr., Agência Brasil

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