Radicais da Secretaria da Cultura de Bolsonaro fazem dossiês para atacar servidores ‘esquerdistas’

No Painel da Folha

Olavistas e outros radicais de direita que trabalham na Secretaria Especial da Cultura de Jair Bolsonaro têm elaborado dossiês fundamentados na orientação política de servidores que desejam que sejam exonerados ou promovidos.

A secretaria tem se isolado no governo federal como reduto de seguidores do escritor Olavo de Carvalho e de radicais bolsonaristas à medida em que eles foram perdendo espaço em ministérios de maior destaque, nos quais se notabilizaram por discursos e políticas controversas (frequentemente sem fundamentação empírica) e falhas administrativas.

Os principais exemplos disso foram Ricardo Vélez Rodríguez e Abraham Weintraub, na Educação, e Ernesto Araújo, nas Relações Exteriores.

O material costuma ser enviado à cúpula da secretaria, encabeçada por Mario Frias. Em planilha chamada “mapeamento Funarte 2020-2021”, obtida pelo Painel, seis servidores aparecem como militantes esquerdistas ou do PT e que por isso devem ser exonerados.

“Servidora, há anos e é militante esquerdista, tirar cargo de gratificação. Faz movimentos na Funarte contra governo. Companheira de Marcos Teixeira [Campos, presidente substituto da Funarte na gestão de Regina Duarte], turma do Humberto Braga [presidente da Funarte no governo Michel Temer (MDB)], levantar açãos contra o governo (sic)”, consta na planilha.

Dois que aparecem na lista de alvos da tabela foram exonerados recentemente: o coronel Lamartine Barbosa, que era presidente da Funarte, e Ivone Santos, chefe da representação regional Sul/Sudeste da fundação. Barbosa é citado sendo acusado de esconder informações e proteger falhas e Ivone, de tentar transferir a Funarte para SP.

“Proibiu Coordenadores, servidores, colaborabores e diretoria de passar informações para auditoria e juridico. Em sua gestão há sérios problemas com editais que não estão sendo pagos, o que se espalha nas redes sociais. Soluções morosas. e não direcionamento de forma formal o que informar aos cobradores (sic)”, diz o texto sobre o coronel.

Em carta após ter sido exonerado da Funarte, revelada pelo Painel, Barbosa escreveu que não pôde aceitar imposições equivocadas de Mario Frias.

Nomeação de pessoal sem correta análise de perfil, descompromisso com pequenos produtores e propostas equivocadas de parcerias público-privadas de equipamentos como o Teatro Cacilda Becker (RJ) e o Teatro Brasileiro de Comédia (SP) foram alguns dos problemas listados por Holanda em seu texto

Na mesma planilha, servidores de direita são descritos em tom heroico como dignos de promoções.

Luciana Lago, produtora cultural evangélica que era diretora da Escola Nacional do Circo, teria identificado irregularidades e sofrido perseguições internamente. “Atriz, circense,gestora e empresária artística e produtora cultural, por mais de 28 anos”, diz sua ficha.

Ela foi nomeada para o cargo em junho de 2020, quando Luciano Querido, ex-assessor de Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), estava interinamente como presidente da Funarte, à qual a escola está subordinada. Ela foi exonerada em março por decisão de Barbosa.

Um advogado é descrito como “jovem conservador ativo”. Outro aparece como “secretário da ala conservadora da OAB-RJ, reconhecido jornalista conservador por nomeação.”

Outro documento mais recente tem a secretária-adjunta da Cultura, Andrea Paes Leme, como alvo.

Ele mostra supostos tuítes de Andrea do primeiro turno das eleições de 2018 em apoio a João Amoêdo (Novo) e nos quais ela diz que a disputa estava dando desespero. O material diz que o cargo de número 2 da Cultura para ela é uma humilhação para Bolsonaro.

“A Secretária Especial Adjunta Andrea Abrão Paes Leme se deu bem: enganou o Secretário Especial Mario Frias e sabendo ser o Bolsonaro Bozo bobo acertou em cheio. Saiu do DNIT e agora manda na Cultura. Que humilhação para um Presidente da República dar o segundo posto no comando da Cultura para quem na boca da eleição e 10 dias antes de ser esfaqueado estava ridicularizando-o como uma opção equivalente ao PT (sic)”, diz trecho do documento.

O Painel procurou a Funarte e o Ministério do Turismo (ao qual está subordinada a secretaria de Cultura), mas não teve resposta a respeito da influência desses materiais sobre as tomadas de decisão na pasta, na secretaria ou na fundação.

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