CPI do Meio Ambiente ganha força após operação da PF contra Ricardo Salles

Faltam 65 das 171 assinaturas necessárias para criar a comissão; deputados acreditam que a pressão da sociedade civil, diante do desmonte dos órgãos ambientais e da corrupção, deve ajudar oposição; STF recebe pedido de impeachment do ministro

Por Luiza Sansão, em De Olho Nos Ruralistas

Ganhou força no Congresso a luta da oposição pela instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os crimes do governo Bolsonaro contra o ambiente, depois de operação da Polícia Federal nesta quarta-feira. O pedido necessita de 171 assinaturas de apoio (um terço dos parlamentares da Casa) e conta, até o momento, com 106. A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) encaminhou hoje ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pedido de impeachment do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, apresentado em junho de 2020 ao Ministério Público Federal (MPF).

A operação da PF visa a apuração de crimes como corrupção, prevaricação e esquema de exportação ilegal de madeira envolvendo Salles, agentes públicos e empresários do ramo madeireiro. Foram executados 35 mandados de buscas e apreensões em endereços ligados ao ministro e a servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), além da quebra dos sigilos bancários e fiscais do ministro e de outros envolvidos, como Eduardo Bim, ex-presidente do Ibama, afastado no mesmo dia.

O pedido de instalação da CPI para apurar os crimes ambientais cometidos pelo governo na gestão Salles foi protocolado na Câmara no dia 29 de abril, três dias depois da audiência pública em que foi o ouvido o delegado da superintendência da Polícia Federal de Manaus, Alexandre Saraiva, responsável pela maior apreensão de madeira ilegal da história do país e afastado em seguida.

BANCADA RURALISTA E CENTRÃO RESISTEM À APROVAÇÃO DA CPI, CONTA MOLON

Para o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), é fundamental investigar profundamente o envolvimento de Salles e seus subordinados com atos ilícitos suspeitos que ocorrem desde o início da gestão do ministro. “Isso enfrenta a resistência da bancada ruralista, que tem em Salles um de seus aliados”, afirma. “E na própria base do governo, que insiste na falácia de que não há membros envolvidos em corrupção e tenta evitar a investigação para varrer os malfeitos de Salles para debaixo do tapete”.

Molon acredita que com pressão da sociedade e mobilização da oposição as assinaturas necessárias serão obtidas. Para o deputado federal Nilto Tatto (PT-RS), a repercussão da operação no parlamento deve ajudar a oposição a conseguir o apoio necessário: “A operação da PF demonstra claramente a necessidade de a Câmara Federal também investigar esse processo todo de desmonte dos organismos ambientais, de destruição ambiental, e, portanto, se coloca na ordem do dia a necessidade de se instalar uma CPI”.

Tatto diz que, por enquanto, quem está trabalhando para fazer essa CPI na Câmara acontecer são os partidos de oposição, de forma articulada com organizações da sociedade civil, movimentos populares. “Temos a expectativa de que agora, com essa operação da PF, a gente possa dialogar também com parlamentares de outros partidos políticos, mesmo os que estão na base do governo Bolsonaro”, completa o petista.

MARCELO FREIXO: ‘SALLES SEMPRE OPEROU PARA OS INTERESSES PRIVADOS’

Em entrevista ao De Olho Nos Ruralistas, o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) destaca o alinhamento político-ideológico do ministro com Bolsonaro, motivo dele continuar “passando a boiada” e se manter blindado pelo governo:

— Salles sempre operou para os interesses privados e é muito articulado ao grupo mais fanático bolsonarista. Não é uma peça solta, é respaldado por Bolsonaro, pela cúpula do governo. Ele cumpre uma tarefa que é governamental. Não é um erro, não é desvio, ele cumpre um papel político. Não é à toa que ele ainda está lá depois de tanta coisa.

Como exemplo, ele cita o episódio que sucedeu a apreensão de madeira ilegal em Santarém (PA). “É claro que quem afasta não é o ministro do Meio Ambiente, mas Salles viajou até o local para defender as madeireiras e, no dia seguinte, o delegado foi demitido”, questiona.

Freixo observa que a base do governo fez de tudo para que a audiência com Saraiva não acontecesse: “Tentou impedir que o delegado falasse. Todos eles [da base] se inscreveram [para falar], tentaram anular a convocação. Você vê que é uma base do governo que age para proteger o Ricardo Salles. A ação da bancada ruralista foi muito clara nesse sentido”.

Segundo Freixo,, Saraiva foi muito contundente na audiência e “apresentou provas muito robustas de como Salles vem operando uma linha estratégica de promover o desmatamento e favorecer determinados negócios ilegais na Amazônia”, não somente sobre o caso da exportação ilegal de madeira.

A Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema) publicou hoje nota de apoio à operação da PF e pediu a exoneração de Salles. “A boiada vem passando e fortalecendo o descumprimento de preceitos fundamentais no trabalho dos servidores e destruindo o marco ambiental brasileiro”, diz trecho da nota.

Os servidores apontam o desmonte de instituições ambientais conquistadas pela sociedade brasileira ao longo das últimas décadas, “afrontando a Constituição Federal, os tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário e que estabelecem a obrigação do poder público na defesa e preservação do meio ambiente para as atuais e futuras gerações”.

Imagem Principal (Reprodução): Ricardo Salles, em Santarém, intervindo em operação da PF

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