Após 20 anos na saúde indígena, o médico Zelik Trajber é exonerado sem justificativa em Dourados

Movimento denuncia perseguição a profissionais que apontam crise e sucateamento da saúde nas aldeias

Por Valéria Araújo, no Progresso

Os mais de 20 anos dedicados a salvar vidas nas aldeias de Dourados não foram suficientes para impedir que o médico pediatra Zelick Trajber fosse exonerado, após apontar a crise na saúde indígena em busca de melhorias. Assim como ele, outros profissionais que também tentaram mudar o cenário caótico, tiveram o mesmo destino. “É uma forma de calar os profissionais. Na busca por esconder a real situação vale tudo, até mesmo assediar médicos, enfermeiros e demais profissionais que tentam salvar vidas diariamente”, desabafa.

Zelick recebeu há cerca de 20 dias um comunicado informando que seria exonerado após 84 dias de aviso. O prazo sequer chegou ao fim quando anunciaram o desligamento dele da saúde indígena. Segundo ele outros 4 profissionais também foram exonerados pelo mesmo motivo. O Ministério Público Federal chegou a questionar as demissões, supostamente sem embasamento técnico, mas o pedido foi indeferido pelo judiciário. Zelick, uma das mais renomadas autoridades de saúde indígena do Brasil, pensa em deixar o município de Dourados.

A demissão dos profissionais, bem como o sucateamento de veículos da saúde indígena e falta de estrutura nos postos, foram alvo de manifestações ocorridas na sede do Distrito Especial de Saúde Indígena (Dsei) no início do mês que culminaram com a saída da coordenadora. Na última sexta-feira também foi exonerado o militar da reserva, o coronel Joe Saccenti Junior, do cargo de Coordenador Distrital de Saúde Indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena em Mato Grosso do Sul. A exoneração conta na edição do DOU (Diário Oficial da União) desta sexta-feira (28).

Essa semana a imprensa nacional denunciou as demissões dos profissionais de saúde da Reserva indígena. O site “De olho nos ruralistas” contou o que esses servidores enfrentam. “Grande parte da equipe do polo foi demitida ao longo do último semestre, em um movimento que os ex-funcionários vêm denunciando como perseguição política por parte da coordenação do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) do Mato Grosso do Sul, um órgão da Secretaria Especial de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde. Trajber assinou sua carta de demissão nesta quarta-feira (26), após ter sido mandado embora sem justificativas”.

O site continua: “Os profissionais da saúde de Dourados alertam que, para além das demissões, uma série de decisões arbitrárias por parte da gestão do polo e do DSEI do Mato Grosso do Sul vêm prejudicando a estrutura da região, responsável pela maior população indígena do país. O polo atende cerca de 18 mil usuários do subsistema, espalhados por aldeias na Reserva Indígena de Dourados e outros três municípios. Também atende dezenas de indígenas deslocados de seu território pelo agronegócio, que acampam em barracas nas estradas e nos fundos de fazendas”.

O site também ressaltou o trabalho de Zelick no combate à desnutrição, uma das conquistas, que segundo o veículo estão sendo desmanteladas. “A partir dos anos 2000, a equipe formada por Trajber foi responsável pelas denúncias da desnutrição de crianças indígenas. Na época, o índice de mortalidade infantil entre as crianças atendidas pela equipe de Dourados chegava a 140 por 1.000 crianças vivas. Para se ter uma ideia, na mesma época, o índice brasileiro era 29,02 por 1.000. Após uma mobilização emblemática dos líderes indígenas e da equipe da saúde, chamando a atenção do país para a vulnerabilidade das crianças Guarani Kaiowá, Guarani Ñandeva e Terena, foram realizadas duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) sobre essa realidade”.

O conselheiro Leoson Mariano da Silva, do Distrito Local de Saúde Índígena diz que a entidade vem tentando estabelecer um contato com o Governo Federal para reverter a situação.

Foto: líderes da Reserva de Dourados denunciam perseguição de profissionais da saúde e desmonte. Reprodução redes sociais

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