O procurador da República Julio José Araujo Junior conta como essa aproximação ajuda na compreensão de realidades distintas e na efetivação de direitos fundamentais
“Apenas com o diálogo com movimentos indígenas, de moradia, de combate ao racismo, LGBT, entre outros, vamos entender melhor a perspectiva daqueles que mais demandam por direitos.” A frase do procurador da República Julio José de Araujo Junior sintetiza grande parte de sua atuação em 9 anos de MPF, em que a aproximação dos movimentos sociais e da sociedade em geral têm marcado sua trajetória na instituição. Com a carreira iniciada na Procuradoria da República no Amazonas, Julio passou pelas PRMs Volta Redonda (RJ) e São João de Meriti (RJ), e hoje está lotado na PR/RJ.
Antes de ser procurador da República, foi técnico administrativo e analista processual do MPF, procurador federal da AGU e juiz federal. Graduado em Direito pela USP e com mestrado em Direito Público na UERJ, Julio hoje é doutorando da UERJ.
Em entrevista à Assessoria de Comunicação Social (Ascom), o procurador conta por que considera essa aproximação dos movimentos sociais como dever da instituição, como isso aprimora a atuação do MPF e como reuniu suas experiências e visões em um livro recém-lançado sobre o tema. Confira:
Ascom: Quando iniciou sua carreira como procurador da República e o que o motivou a se aproximar dos movimentos sociais?
Julio Araujo: Comecei em 2012, lotado na PR/AM. Desde sempre considerei importante o diálogo com todos os atores da sociedade civil, inclusive os movimentos sociais. Penso que o nosso papel na promoção de direitos depende de uma escuta permanente e de um diálogo constante para compreender o alcance das nossas medidas e o impacto das nossas ações. Encaro essa tarefa como uma obrigação; afinal as soluções que trazemos para os casos em que atuamos, sobretudo no campo da efetivação de direitos fundamentais, depende primordialmente da compreensão do cenário e das manifestações de todos os atores sociais.
Ascom: Que experiências vivenciou e em que essa aproximação levou a uma melhor atuação da instituição?
Julio: Com essa aproximação, não deixamos de ter consciência da importância da nossa instituição, mas aprendemos que ela é apenas uma parte nos conflitos sociais. Estes envolvem diversos interesses e realidades, e é nosso dever mergulhar nessa realidade para ter mais clareza em relação aos casos. Apenas com o diálogo com movimentos indígenas, de moradia, de combate ao racismo, LGBT, entre outros, vamos entender melhor a perspectiva daqueles que mais demandam por direitos. Não se trata de um diálogo ingênuo nem instrumental, mas atento à insuficiência da nossa percepção da realidade e à necessidade de garantir a manifestação de todos esses atores, que estão geralmente sub-representados na arena política.
Ascom: Na sua opinião, como diminuir a distância entre gabinetes e a população que precisa da atuação do MPF? Como a instituição pode se aproximar mais de minorias e dos grupos vulneráveis?
Julio: É imprescindível reconhecer que essa aproximação não é uma faculdade, mas um dever de atuação. Como eu disse, temos nossa autonomia institucional e nossa capacidade própria de conduzir as pautas. Mas sem esse diálogo nossa intervenção carece de legitimidade social e tende a influenciar mal a concretização de políticas públicas. Pelo menos no campo da cidadania, considero necessário institucionalizar canais e tornar rotineiro esse trânsito e esse diálogo.
Ascom: O que o motivou a lançar o livro “Ministério Público e Movimentos Sociais – Encontros e Desencontros”? Fale desse trabalho.
Julio: O livro surge após eu ter feito um trabalho homônimo no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ). À vontade de dar divulgação ao trabalho se somou um olhar sobre a atuação desde 2012. Ao revisitar artigos que fui escrevendo ao longo dessa trajetória, percebi que existe uma linha do tempo que aponta os altos e baixos da nossa instituição e os desafios que temos no incremento dessa relação com movimentos sociais e na efetivação de direitos fundamentais. Aproveitei para acrescentar um artigo que resumo as principais linhas do meu trabalho anterior (“Direitos territoriais indígenas: uma interpretação intercultural”).
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Foto: Acervo pessoal