Por vacinas para todos e contra Bolsonaro, manifestantes foram às ruas neste sábado

Em São Paulo, milhares de manifestantes se reuniram na Avenida Paulista em repúdio à condução da pandemia da Covid-19 pelo governo federal. ‘Ele colocou o Brasil na cova e a minha avó foi junto’, disse cineasta

Por Beatriz Drague Ramos, na Ponte

Pela segunda vez em menos de um mês, manifestantes de movimentos sociais e autônomos ocuparam as ruas de São Paulo e de mais de 400 cidades do país para protestar contra a falta de ações do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no combate à pandemia do novo coronavírus. 

Na data em que o Brasil chegou a marca trágica de 500 mil vítimas da Covid-19, o ato convocado por centrais sindicais e entidades de moradia, contou também com a presença dos movimentos estudantil, negro e indígenas, todos pediram o impedimento do presidente na continuidade da gestão do país. 

Muitas pessoas foram protestar pela morte de seus entes queridos. Esse foi o caso do sociólogo Carlos Eduardo Amaral Paiva, de 39 anos, ele perdeu o pai que tinha 69 anos pela doença e não conseguiu tomar a vacina a tempo. “Perdi meu pai há dois meses, ele estava há uma semana de se vacinar, estava se cuidando, ele tinha muito medo de pegar Covid-19, porque ele sabia que poderia vir a falecer, então ficou um mês internado, pegou uma infecção hospitalar e acabou falecendo. Eu vim para cá porque eu acho que a morte do meu pai era uma morte evitável. Hoje ele poderia ter sido vacinado e ele poderia estar comigo. Eu não gostaria de estar aqui hoje, gostaria de estar com o meu pai hoje, mas eu tô aqui”, diz com os olhos marejados de lágrimas.

Depois da morte do pai, Carlos Eduardo manda um recado ao governo federal. “Ele foi eleito para cuidar das pessoas, não para matar. E as ações dele são ações de morte”, lamenta.

Carlos perdeu o pai para a Covid-19 que não teve tempo de tomar a vacina | Foto: Daniel Arroyo | Ponte Jornalismo

Assim como Carlos, o ator e cineasta Igor Montovani, de 29 anos, também foi ao ato mostrar sua indignação pela morte precoce da avó, que estava há dois dias de se vacinar. “A culpa é desse governo, desse presidente genocida, tivemos 11 ofertas no ano passado de vacina. Então, essa vacinação já era pra estar muito mais avançada. A gente tem um presidente negacionista, que o tempo inteiro descredibiliza o uso de máscaras e o tempo inteiro descredibilizou o vírus, falou que era uma gripezinha. Ele colocou a gente nesse buraco onde a gente está com 500 mil pessoas mortas. Ele colocou o Brasil na cova e a minha avó foi junto”.

A avó de Igor Mantovani faleceu dois dias antes de tomar a vacina contra à Covid-19 | Foto: Daniel Arroyo | Ponte Jornalismo

Na visão de Caio Ramos, médico do Sistema Único de Saúde (SUS) de 31 anos, Bolsonaro cometeu crimes ao atrasar a aquisição de vacinas para imunizar a população, bem como ao comprar medicamentos com ineficácia comprovada cientificamente, além de diminuir a gravidade da pandemia em diversos episódios. “Ele foi um sabotador de todas as políticas de combate à pandemia. Desde a divulgação de um tratamento ineficiente até o boicote a iniciativas que visavam reduzir a transmissão aérea do vírus, como o uso de máscaras, por exemplo. A atuação dele em relação a vacina foi totalmente criminosa, ele foi responsável pela morte de 500 mil pessoas”. 

Segundo ele, a escolha de sair na rua se dá para evitar um prejuízo ainda maior. “A gente escolhe sair na rua em meio à pandemia certamente é porque o prejuízo de não sair é muito maior do que o prejuízo de ficar em casa. Nessa situação a gente não pode esperar por uma tomada de decisão que priorize as vidas dos brasileiros, precisamos exigir isso. Então, essa saída às ruas é sobre isso, sobre a necessidade de ficar em casa e a importância da gente se prontificar e se posicionar agora, porque pode ser o definidor para muitas e muitas vidas”, diz Caio.

A concentração do ato em São Paulo começou por volta das 16h em frente ao Masp (Museu de Arte de São Paulo), na Avenida Paulista, no centro da capital. A manifestação ocupou duas faixas da Rua da Consolação, sentido centro e uma sentido bairro e seguiu calma até a praça Roosevelt. Indígenas foram na frente e pediram pela demarcação de suas terras. Eles também criticaram as invasões de suas terras por mineradores e ruralistas e denunciaram a forma como o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles conduz à área ambiental.

O protesto durou ao menos até as 21h30. Juntos os manifestantes gritavam em tom de revolta: “Bolsonaro genocida” e “Vacina na veia, Bolsonaro na cadeia”. Conforme solicitado pelos organizadores da manifestação, o uso de máscaras, álcool gel e o distanciamento social foram respeitados durante a maior parte do ato.

Para as irmãs Lígia Prado, 69 anos, e Valéria Prado, 67 anos, ambas professoras aposentadas, o governo Bolsonaro é mais letal que o vírus, por isso decidiram ir ao ato mesmo com os casos da Covid-19 voltando a subir. “Ele recusou a vacina, é muito pior do que demorar para comprar. Foi um projeto de governo. A gente veio na outra [manifestação] em 29 de maio, só que ficamos algumas horas, hoje vamos ficar até o fim. Achamos que é muito importante vir para a rua para perceberem que a população não quer mais o Bolsonaro, não adianta ficar mandando coisa pelo WhatsApp, eu mandei o tempo inteiro, eu tenho ficado furiosa há dois anos com o Bolsonaro. Ele está usando a doença como necropolítica mesmo, a gente sabe disso”, diz Lígia.

Segundo Valéria, o país passa por diversas crises por conta do presidente da república. “Nós estamos em uma crise hídrica, uma crise ambiental que mata os povos indígenas que estão mantendo a água que cai aqui em São Paulo, quer dizer, é o fim do país para nós é para as futuras gerações. E se ele ficar mais tempo, pode matar mais”, diz.

O auxílio de R$600 até o fim da pandemia, bem como comida também eram reivindicações dos manifestantes, conforme apontou Phellipi Correa, 29 anos, consultor de vendas, integrante da Coalizão Negra por Direitos que saiu da cidade de Osasco para o ato no centro da capital. “Graças a ele [Bolsonaro] são 500 mil mortos, o governo quer dar sobra de comida para os pobres. Muitos comerciantes tiveram seus negócios fechados, infelizmente o auxílio emergencial foi ridículo, com o arroz, a carne e o gás caros. Queremos a volta dos R$600, viemos para a rua por causa disso”.

O investigador da Polícia Civil e membro dos Policiais Antifascistas, Ivan Murta, 39 anos, lembra que a retirada de Bolsonaro do poder também é importante para haver mudanças nas políticas de segurança pública. “É importante que a gente saia às ruas para pedir o Fora Bolsonaro genocida e se junte aos movimentos sociais para que a gente possa construir um diálogo de segurança pública e não deixar a direita se apropriar desse tema que é tão importante para a gente”.

Cartazes diziam “Fora Bolsonaro” e “Bolsonaro assassino”. O protesto teve interferência da Polícia Militar, que isolou algumas ruas, e estava com o efetivo preparado ao final da Rua da Consolação com escudos e armas de balas de borracha. Quando os manifestantes chegavam à praça Roosevelt os policiais Batalhão da Polícia Militar do Estado de São Paulo (Baep) jogaram três bombas de gás lacrimogêneo. 

Alguns manifestantes queimaram lixo e papéis na Rua da Consolação e acenderam fogos, uma minoria de manifestantes quebrou a vidraça do Banco Santander, localizado na mesma rua. Eles saíram correndo e não houve confronto com a polícia. Na tentativa de dispersar os manifestantes a tropa de choque da PM desceu a Rua da Consolação batendo nos escudos com cassetetes, o que assustou os manifestantes, alguns deles arremessaram garrafas nos policiais, ainda assim não houve reação da polícia e ninguém se feriu.

O protesto terminou de forma pacífica na Praça Roosevelt por volta das 21h30. Com a interdição da PM em parte do local, os manifestantes deixaram a região, enquanto outros permaneceram nas escadarias da Praça Roosevelt.

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