Justiça Federal ordena que ICMbio elabore plano de manejo em reserva no Norte de Minas

Demora na implantação do plano coloca em risco recursos hídricos da região e ameaça o sustento de mais de 30 comunidades de geraizeros

Ministério Público Federal em Minas Gerais

O Ministério Público Federal (MPF) obteve tutela de urgência em ação civil pública movida contra a União e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que obriga a autarquia a elaborar e publicar, em um prazo de 12 meses, o plano de manejo da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Nascentes Geraizeiras (RDSNG), localizada nos municípios de Montezuma, Rio Pardo de Minas e Vargem Grande do Rio Pardo, no Norte de Minas Gerais. Segundo a decisão, o ICMBio tem prazo de um mês para elaborar o cronograma de trabalho completo e circunstanciado do qual deverão constar todas as tarefas que devem ser executadas para que, ao fim do prazo máximo de 12 meses, o plano de manejo seja elaborado e publicado.

A decisão ainda estabeleceu que o plano de manejo deverá assegurar os parâmetros de proteção característicos da modalidade da unidade de conservação em questão, incluindo o zoneamento e a fixação de regras adequadas a contemplar o respeito às comunidades tradicionais identificadas em seu interior, considerando os seus modos de criar, fazer e viver, garantindo-se a efetiva participação dessas comunidades e entidades representativas na sua elaboração, mediante consulta prévia, livre e informada, na forma da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Tanto o ICBio quanto a União devem, ainda, fazer o planejamento administrativo necessário à definição de medidas hábeis ao controle da ocupação irregular de áreas no interior da RDSNG, com o exercício do poder de polícia em relação àquelas atividades não compatíveis com os objetivos da unidade de conservação.

A reserva – Com área aproximada de 38.177 hectares, a reserva foi criada em 13 de outubro de 2014 por decreto presidencial, a RDSNG é uma unidade de conservação federal da categoria de uso sustentável, que visa a conservação da biodiversidade, assim como os modos tradicionais de vida das comunidades e populações tradicionais existentes. Tem como objetivos proteger a biodiversidade local e as nascentes de córregos, garantir a conservação das áreas de extrativismo utilizadas pelas comunidades tradicionais da região, o acesso ao território tradicional pela população geraizeira local e incentivar a realização de estudos para o uso sustentável do cerrado.

De acordo com a ação do MPF, são conhecidas cerca de 30 comunidades tradicionais beneficiárias, com 17 microbacias hidrográficas no interior e zona de amortecimento da unidade de conservação. Com o plano de manejo, outras comunidades podem ser identificadas.

Problemas – O inquérito civil do MPF identificou ameaças que podem colocar em risco a reserva. Entre eles, estão a utilização desordenada dos recursos naturais, em especial, os recursos hídricos que são “grave problema a ser enfrentado, pois acarreta impactos graves e irreversíveis à biodiversidade e às comunidades tradicionais da RDSGN e de sua zona de amortecimento”, escreveu na ação a procuradora da República Lilian Miranda Machado.

Entre as principais causas está a silvicultura do eucalipto desordenada na região, que vem causando imensuráveis danos ambientais e à população que ali reside, notadamente às comunidades que sobrevivem dos recursos da RDSGN. A monocultura da espécie, substituindo as plantas nativas da região, de fato, afeta significativamente a cultura dos povos tradicionais (geraizeiros) que tinham no Cerrado seu modo de vida, bem como prejudica sobremaneira os recursos hídricos em toda região norte de Minas Gerais, inclusive com a seca do Córrego das Braúnas.

Segundo o MPF, os inúmeros plantios de eucalipto em sua cabeceira têm alto consumo de água para o seu desenvolvimento, do plantio até o corte, muito superior ao consumo das plantas típicas do Cerrado.

Ao conceder a tutela de urgência, o Juízo Federal Cível e Criminal de Janaúba levou em consideração a situação narrada pelo MPF e salientou que, no caso concreto, tais riscos são corroborados pelas informações colhidas no bojo do Inquérito Civil 1.22.025.000062/2020-72, “que indicam inúmeras intervenções aparentemente lesivas ao meio ambiente no interior da RDSNG e sua zona de amortecimento e confirmam que a proteção até então dispensada a tal região não se revela satisfatória, ao contrário, tal cenário permite entrever a proteção deficiente ao meio ambiente, constituindo o plano de manejo um dos instrumentos suscetíveis de viabilizar o nível de proteção ambiental no local”, escreveu na decisão.

Além disso, a decisão também reconheceu a omissão do poder público na demora da elaboração do plano de manejo. “Portanto, a omissão do poder público na preparação e aprovação de tal instrumento coloca em risco a própria integridade da unidade de conservação e constitui em violação do dever fundamental de proteção do meio ambiente”, escreveu o magistrado na decisão.
(ACP 1001524-49.2022.4.01.3825)

Íntegra da decisão

Íntegra da ação

Arte: Secom/PGR

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