Natal. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

Há quase dois anos que, semanalmente, publico algo aqui. Digo algo porque não sei ao certo se crônica ou conto. Ou só texto mesmo. Para ser franco, nem sei ao certo a diferença entre uma crônica ou conto. E para cada um a quem perguntei, as respostas, sempre inéditas, se sucederam em tal volume que deixou de ser importante. Passei a escrever e só. Sem me importar com o nome do que escrevo.

Mas hoje é diferente porque é Natal. Sim, eu sei que para muitos é apenas um dia com nome próprio no calendário. Que, talvez, Jesus sequer tenha realmente nascido neste dia ou mesmo no ano em que o calendário diz que nasceu. Ou mesmo que tenha nascido. Ou, ainda, nascido, não era o khristós das escrituras. Mas, creio, pouco importam os fatos. Como tudo do passado real ou imaginário, torna-se história. É ela que resta e nos anima com verdades ou mentiras, alegorias, exageros ou a mais pura verdade. Numa história tudo isso se mistura com um único propósito: afetar espíritos a ela sensíveis.

Há tempos, acalentamos em nossas histórias como cidadãos vícios morais. Um deles, a violência, estruturante de tantas das nossas relações, tornou-se sufocante nos últimos anos. A violência está presente no Novo Testamento e dela Jesus é vítima. O sensato para qualquer um que se diz cristão seria rejeitá-la e praticar o amor cristão. Aquele que em grego se diz ágape e em latim, caritas. E na linguagem das ações quotidianas se fala através de abraços, respeito e perdão. Jamais em ofensas, ameaças, agressões ou, pior, tortura ou morte.

As histórias que o dia de hoje deveriam inspirar, sejam quais forem as narrativas, deveriam ser histórias de amor. O dia marcado em vermelho no calendário deveria nos unir amorosamente, ainda que pelo momento efêmero de um jantar em família ou do almoço com o pessoal da firma. Deveríamos nos esquecer de tantas tristezas e festejarmos o fato de estarmos vivos. Deveríamos, de alguma maneira, não sei por contos, crônicas, fábulas, narrativas ou rezas, sermos capazes de, pelo menos por um tempinho, não crer que a violência seja capaz de mudar para melhor qualquer coisa em nossas vidas. Deveríamos, só por um tiquinho de tempo, tentar encontrar em nós o melhor de nós mesmos. Deveríamos não porque o calendário determina, mas porque precisamos de um tempinho para tanto.

É pelo calendário que hoje não tenho história para contar. A que faria sentido no dia de hoje já foi contada há muito tempo. E por tanto tempo recontada por gente melhor, mais digna e talentosa do que eu. Não tenho que lhes contar, mas tenho a sugerir: não importa como seja a sua história de hoje, apenas aproveite para que seja capaz de despertar bons sentimentos como união, paz e amor. E não de golpe militar, guerra civil e apelos caricatos a Deus ou a Jesus para que gente armada faça o que foi ensinada a fazer.

Então, hoje, este texto é mais dispensável que em outros dias. Troque-o por um abraço. Agora mesmo. Procure quem você ama e abrace, sem falar nada. Se há amor, não precisa falar. Se estiver longe, ligue. Diga que queria abraçar. E se olhar em volta e, neste dia, perceber que não há a quem abraçar, não se desespere. Há, por certo, amor em você. Ainda que escondido por ressentimentos – escombros de enganos e ilusões frustradas – ele está aí. Este é o momento de buscá-lo e, com ele, preocupar-se em encontrar mais alguém a abraçar que alguém a punir pelos males do mundo.

Feliz Natal!

Ilustração: Mihai Cauli

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