MPF recomenda retirada de nomes de pessoas ligadas à ditadura militar de blocos da Ufac

Medida segue orientação de entidades nacionais e internacionais

MPF/AC

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Universidade Federal do Acre Ufac) que institua comissão técnica para promover a mudança nas nomenclaturas de espaços físicos localizados no campus sede em Rio Branco (AC), que homenageiam agentes públicos ou particulares que notoriamente tiveram comprometimento, direto ou indireto, com a prática de graves violações do regime civil-militar.

A recomendação assinada pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão Lucas Costa Almeida Dias fundamenta-se em elementos que constam no inquérito civil instaurado para apurar as homenagens realizadas a perpetradores de violações aos direitos humanos ocorridas durante a ditadura civil-militar no estado do Acre.

Além disso, o MPF também fundamenta o documento na Constituição Federal de 1988, que consagrou o retorno do Brasil ao Estado Democrático de Direito, e que, na condição de pacto político-jurídico nacional, trouxe consigo metas normativas voltadas para a superação de problemas reais da sociedade causados pelo legado autoritário dos governos militares vigentes de 1964 a 1985.

As medidas necessárias para este retorno compõem amplo campo de estudos conhecido como Justiça de Transição, com atuação em eixos como a investigação e elucidação das situações de violência ocorridas, a responsabilização dos agentes que praticaram as violações, a reparação dos danos suportados pelas vítimas, a promoção da memória e a adoção de medidas destinadas a prevenir a repetição das violações no futuro.

O Estado brasileiro, por meio da Lei 9.140/1995, e as Forças Armadas, no Ofício 10944, do Ministério da Defesa, admitiram a responsabilidade sobre mortes e desaparecimentos de pessoas que tenham participado de atividades políticas durante a ditadura.

O próprio estado do Acre foi palco de perseguições políticas, ameaças e mortes cometidas pelo regime, e, assim como em outros estados do Norte, especialmente trabalhadores rurais e extrativistas acreanos resistentes ao modelo desenvolvimentista imposto, foram duramente reprimidos pelo aparelho estatal em aliança com os latifundiários, com destaque para as perseguições contra inúmeras lideranças políticas locais e, sobretudo, para o homicídio do ex- presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, Wilson Souza Pinheiro, conforme reconhecido no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade.

A Comissão Nacional da Verdade também recomendou em seu relatório final, entre outras medidas, a preservação da memória por meio da alteração da denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais, estaduais ou municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente tenham tido comprometimento com a prática de graves violações.

Outros estados da Federação já têm promovido as alterações necessárias neste sentido, e o próprio Estado do Acre já acatou recomendação semelhante e está adotando os trâmites necessários para realizar a Justiça de Transição.

Os nomes dos espaços físicos relacionados pelo MPF foram determinados pelas orientações da comissão formada por professores do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) da própria Ufac, e levando-se em conta especialmente o período em que o reitor Áulio Gélio Alves de Souza foi o responsável por nomear os espaços físicos elencados na recomendação, com especial intuito de homenagear pessoas que lhe deram sustentação política ao longo de mais de uma década à frente da instituição, em pleno período ditatorial.

Assim, a Ufac foi recomendada que promova mudança dos nomes dos blocos e demais espaços físicos que homenageiam as seguintes pessoas:

1. Geraldo Gurgel de Mesquita – governador biônico nomeado (1975/1979), deputado federal (1968/1971) e senador (1971/1975). Filiado à Arena e PDS;

2.Jorge Kalume – governador biônico nomeado (1966/1971) e senador biônico (1979/1987). Filiado à Arena e PDS;

3. Francisco Wanderley Dantas – governador biônico nomeado (1971/1975) e deputado federal (1964/1971). Filiado à Arena e PDS;

4. Omar Sabino de Paula – foi reitor da Ufac entre 1983 e 1984. Vice- governador nomeado (1975/1979). Como suplente, exerceu o mandato de deputado federal em 1978. Filiado à Arena e PDS;

5. Edmundo Pinto de Almeida Neto – militante da Arena e PDS. Vereador nos anos de 1970;

6. Joaquim Falcão Macedo e Mário Andreazza – 2 pisos (Joaquim Macedo – governador biônico nomeado (1979/1983) e deputado federal (1967/1975). Filiado à Arena e PDS. Mário Andreazza – militar e político. Exerceu vários cargos no primeiro escalão federal, entre 1967 e 1985. Filiado à Arena e PDS);

7. José Guiomard dos Santos – militar e senador (1963/1983). Filiado à Arena e PDS;

8. Áulio Gélio Alves de Souza – foi reitor da Ufac entre 1970 e 1983. Perseguiu e demitiu servidores da Ufac que criticavam a ditadura e sua atuação como reitor. Intimamente alinhado aos militares e ao regime, com colaboração ao status quo daquele tempo;

9. Euclydes de Figueiredo e Jarbas Passarinho – 2 Pisos (Euclydes Figueiredo – militar e pai do ex-presidente general João Figueiredo (1979/1985). Filiado à Arena e PDS. Jarbas Passarinho – militar e político filiado à Arena e PDS. Exerceu vários cargos no primeiro escalão federal entre 1964 e 1985).

A reitoria da Ufac tem prazo de 15 dias para informar se acata a presente recomendação e relate as ações tomadas para seu cumprimento, ou, por outro lado, indique as razões para o não acatamento, tendo sido informada que o não acolhimento das medidas recomendadas poderá implicar na adoção das medidas judiciais cabíveis, inclusive por eventos futuros imputáveis à sua omissão.

Íntegra da recomendação

Imagem: Secom/PGR

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