O primeiro dia do Acampamento Terra Livre (ATL) – a maior mobilização indígena do Brasil –, que acontece até sexta (28/4) em Brasília (DF), foi marcado pela instalação oficial da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas. Na Câmara, a frente é coordenada pela deputada federal indígena Célia Xakriabá (PSOL-MG), e no Senado, pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), lembra a Agência Brasil.
Não são poucos os desafios. O mais urgente deles é a demarcação de Terras Indígenas. “Sem demarcação não há democracia. É muito importante que todos entendam que para além da luta pelo nosso território, da luta pelo reconhecimento ao nosso modo de vida a luta também é pela democracia”, disse a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, na sessão solene promovida na Câmara dos Deputados em homenagem à mobilização indígena, relata o g1.
O presidente Lula deve aproveitar a presença de cerca de 6 mil indígenas no ATL para homologar os primeiros processos de demarcação de seu governo. A presença dele no evento já é dada como certa por servidores do Ministério dos Povos Indígenas e do Palácio do Planalto, informa o Estadão. A previsão é de que Lula assine no encerramento do evento a demarcação dos 14 primeiros territórios aprovados pela FUNAI.
A demanda por demarcação, porém, é muito mais ampla e dramática. O último processo foi aprovado há cinco anos. De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), existem 598 terras reivindicadas por indígenas que não receberam nenhuma providência para regularização, lista O Globo. Entretanto, para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que organiza o ATL, as Terras Indígenas a serem demarcadas chegam a 1.393, relata o Diário de Pernambuco.
Junte-se a isso a enxurrada de projetos de lei na Câmara e no Senado que interferem na vida dos povos originários. Há PLs que permitem a mineração em Terras Indígenas, legalizam a grilagem ou tentam legitimar a indefensável tese do marco temporal das Terras Indígenas, que se propõe a demarcar áreas ocupadas pelos povos somente até outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, lembra a Agência Brasil.
“São mais de 1.025 projetos de lei, em grande maioria de retrocesso ao direito dos Povos Indígenas. As pessoas que não se sensibilizam com o que está aí, como o estupro de meninas Yanomami, a violência pelo garimpo, são pessoas que não se preocupam com o combate à fome, não se preocupam com a defesa de nosso bioma. Não se trata apenas de pauta política, são pautas humanitárias”, reforçou a coordenadora da Frente dos Direitos Indígenas, Célia Xakriabá, ao RFI.
Jamil Chade chama atenção no UOL para outro problema: os crimes cometidos pela ditadura militar contra os Povos Indígenas, que continuam impunes e sem resposta do Estado brasileiro. O alerta faz parte do relatório “Fortalecimento da democracia: Monitoramento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade”, que será publicado nesta semana pelo Instituto Vladimir Herzog e foi elaborado em parceria com a Fundação Friedrich Ebert Brasil.
Diante disso, é fundamental ter em mente o alerta dado por Célia Xakriabá: “Eu quero perguntar para os parlamentares aqui dessa Casa: cheguem em sua casa em pleno abril indígena e perguntem a seus filhos se eles gostam dos Povos Indígenas. Eu tenho certeza de que essa nova geração reconhece a importância dos Povos Indígenas, porque nós somos 5% da população mundial e protegemos mais de 80% da floresta do mundo inteiro. Antes da coroa, existe um cocar”.
O primeiro dia do ATL e a instalação da Frente em Defesa dos Direitos Indígenas foram repercutidos também por TV Cultura, Metrópoles e Época Negócios.
Em tempo 1: O ministro da Justiça, Flávio Dino, autorizou o apoio da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) nas ações da Secretaria-Geral da Presidência da República na Terra Indígena Alto Rio Guamá, no Pará. A medida tem a duração de 90 dias e prevê a atuação conjunta com forças de segurança do Pará e com a FUNAI, sob a coordenação da Polícia Federal (PF), relata o Valor. A TI foi homologada em 1993 e pertence aos Tembé, com mais de 1,7 mil indígenas. São cerca de 280 mil hectares, no limite entre o Pará e o Maranhão. A TI do Alto Rio Guamá sofreu invasões constantes de empresários, fazendeiros e posseiros durante o período de análise para demarcação, na década de 1970, explica o Correio Braziliense.
Em tempo 2: Uma mulher transsexual indígena da etnia Guajajara foi estuprada, agredida e teve seu rosto desfigurado na aldeia Formigueiro, dentro da Terra Indígena Morro Branco, em Grajaú (MA). A Polícia Civil segue em busca do suspeito, que também é indígena e morador da comunidade. A violência ocorreu na última quarta (19/4), após uma festa em homenagem ao Dia dos Povos Indígenas na aldeia, informam Metrópoles e g1. Após o ataque, o suspeito deixou a vítima desacordada em um matagal.
–
Joédson Alves / Agência Brasil