O caso ocorreu na madrugada do dia 14 de junho deste ano, na aldeia Potrero Guassu; foram inúmeros os pedidos de socorro, mas nenhum foi atendido
Na madrugada do dia 14 de junho deste ano, duas vidas indígenas foram tristemente interrompidas: mãe e filho, que ainda estava no útero, faleceram após inúmeros pedidos de ajuda ao Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) do Mato Grosso do Sul – o maior do país –, que não atendeu qualquer ligação. O caso ocorreu na aldeia Potrero Guassu, dos povos Guarani e Kaiowá, localizada no município de Paranhos (MS).
Eram três horas da madrugada quando um dos filhos da vítima procurou auxílio médico ao ver sua mãe em trabalho de parto. Na ocasião, uma moradora da aldeia – que terá identidade preservada nesta matéria –, prestou atendimento à família e efetuou, ao todo, cerca de dez ligações à plantonista da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), do Polo Base de Paranhos (MS), e à coordenação técnica do mesmo polo base, que não atenderam. Ela tentou, ainda, recorrer a um grupo de funcionários da área da Saúde da aldeia, mas também sem sucesso.
Frente à uma situação desesperadora, o hospital do município também foi acionado. No entanto, foi alegado por uma atendente que “só poderiam liberar a ambulância com a anuência da equipe da Sesai” – que, como mencionado anteriormente, não atendeu nenhuma ligação.
“Só poderiam liberar a ambulância com a anuência da equipe da Sesai”
A vítima foi, então, transportada junto ao seu marido até o hospital em um carro particular. Mas, ao chegar no local, mãe e filho não resistiram. Na certidão de óbito de cada um, a causa da morte foi especificada como “desconhecida” – prática recorrente na região. A vítima deixa sete filhos, que possuem entre 11 e 22 anos de idade, e seu marido.
Ao Conselho Indigenista Missionário, uma pessoa que acompanhou o caso reportou que, agora, “pede justiça e os devidos esclarecimentos por parte dos responsáveis pela equipe da Sesai por negligenciar a vida da paciente e de seu filho, que foram a óbito em razão da demora do atendimento”.
Casos frequentes
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Mato Grosso do Sul, têm sido recorrentes os relatos das comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul a respeito do aumento da mortalidade infantil no estado. Em visita à Terra Indígena (TI) Limão Verde, no município de Amambai (MS), foi registrada a morte de um bebê de apenas 30 dias de vida. No documento de óbito da criança, foram apontados “vômito e diarreia” como justificativa do falecimento.
Além da desassistência e a ausência de atendimento médico nos territórios, a falta de medicamentos é outro problema enfrentado pelos indígenas do Mato Grosso do Sul. “Às vezes o médico passa a receita para a gente comprar o remédio, mas não temos como comprar. Então temos que recorrer aos remédios caseiros, que já estão bem difíceis de encontrar dentro das reservas”, relata uma liderança indígena.
“Temos que recorrer aos remédios caseiros, que já estão bem difíceis de encontrar dentro das reservas”
Foi relatado, ainda, que o preconceito e racismo também dificultam o acesso dos indígenas aos espaços de Saúde, como hospitais e postos de atendimento. “Sempre que vamos ao hospital, somos maltratados pelos profissionais. Eles xingam a gente de ‘bugre’, dizem que não temos que ir ao hospital, que temos que ficar na aldeia. Dizem que não é lugar para sermos atendidos”.
O Cimi Regional Mato Grosso do Sul segue acompanhando e denunciando esses – entre outros – casos. Além disso, a equipe se solidariza e se coloca à disposição para prestar apoio às famílias das vítimas, impactadas pela negligência do Estado.
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Posto de Saúde da aldeia Potrero Guassu, no município de Paranhos (MS). Foto: comunidade Guarani Kaiowá