Campanha Contra Violência no Campo completa um ano de luta pelos povos do campo, das águas e das florestas

Por Nathalia Carvalho / Campanha Contra Violência no Campo, em CPT

Nesta quarta-feira (2/8), às 10h, a Campanha Contra Violência no Campo celebrou o seu primeiro ano ativa em prol do enfrentamento à injustiça, à opressão e à desumanidade sofrida pelos que resistem em defesa das suas terras e de seus territórios.

A data foi marcada com uma roda de debate online disponível pelas redes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da rede Brasil de Fato (RS) e da Cáritas Brasileira.

“O objetivo dessa campanha é que um dia ela não precise mais existir, porque não vai haver mais violência no campo. Mas, enquanto houver, a gente vai estar mobilizado e organizado, e é por isso que estamos aqui hoje”, destacou Letícia Chimini, representante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e uma das mediadoras do evento.

Com mediação também composta por Alair Luiz dos Santos, secretário de política agrária da Contag, o debate lançou luz à omissão do Estado em relação às demandas por políticas públicas dos povos tradicionais e apresentou os principais dados dos relatórios: Conflitos no Campo Brasil 2022, publicado pelo CPT com dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno; e Violência Contra Povos Indígenas no Brasil, publicado pelo Cimi na última semana.

Os estudos foram apresentados pelo coordenador do CPT Nacional, Ronilson Costa e pelo secretário executivo do Cimi, Antônio Eduardo.

“Nós tivemos no ano passado cerca de 909.450 pessoas envolvidas em situações de conflitos no campo. Foram 2.018 casos de violência envolvendo questões de água, terra e trabalho escravo. São números muito altos, compreendendo a extensão territorial que tem o nosso país”, alertou Costa.

Segundo dados do Caderno Conflitos no Campo Brasil, em 2021 foram registrados 33 casos de tentativas de assassinato, e em 2022 cerca de 123 casos. Um aumento de 272% em relação ao ano anterior.

O debate também trouxe à memória o Massacre do Rio Abacaxis, ocorrido em agosto de 2020, próximo a Manaus. Na ocasião, ribeirinhos e indígenas Munduruku foram mortos durante uma ação policial da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas.

“Este é um caso muito emblemático, porque envolve forças policiais do Estado de forma direta em operações de massacre de um povo. O fato de até o momento não ter se avançado tanto nesse processo de investigação revela uma outra questão preocupante, que é a impunidade por parte do Estado”, completou o coordenador do CPT.

O estudo registrou, durante o governo Bolsonaro, um total de 136 pessoas assassinadas por estarem na linha de frente nos processos de luta, organização e resistência em defesa dos seus territórios.

Ao apresentar dados do relatório Violência Contra Povos Indígenas no Brasil, Antônio Eduardo, secretário executivo do Cimi destaca:

“O ano de 2022 encerrou um ciclo de 4 anos no qual nenhuma terra foi demarcada. O poder executivo não apenas ignorou a obrigação constitucional de demarcar e proteger as terras tradicionalmente ocupadas pelos povos originários como também atuou na prática para flexibilizar esse direito. Houve uma intensificação na violência, que refletiu um ciclo de violação sistemática e ataque direto à luta desses povos”.

O relatório apresentou 416 casos de violência contra a pessoa e 180 assassinatos de lideranças indígenas em 2022. Em relação à omissão do Estado, foram registrados 243 casos, sendo 87 deles por desassistências na área de saúde.

“Não é com satisfação que a gente traz esse relato. A gente torce para que um dia não tenhamos relatórios de violência, mas infelizmente temos que fazer essa denúncia.”, completa ele.

A CAMPANHA

“Queremos encontrar uma saída para que a violência no campo possa diminuir e acabar, a partir da nossa participação, incidência política, cobrança junto às instâncias do governo a nível federal, estadual e municipal, e com a nossa ação direta a partir das pastorais, do trabalho da CPT e a partir do trabalho de cada organização e movimento popular que também abraça esta causa”, destacou Dom José Ionilton, presidente do CPT Nacional, em vídeo-depoimento.

A Campanha Contra Violência no Campo já é formada por mais de 60 organizações e movimentos sociais e pastorais que unem forças diariamente na busca por justiça, reconhecimento e visibilidade da pauta, com o objetivo de fortalecer as ações de enfrentamento à violência no campo.

“A campanha é um instrumento de resistência contra o aumento da violência e da impunidade que é gerada por meio do Estado. Infelizmente, sem a regularização fundiária, a tendência é que essa violência cresça. Torcemos muito para que, em breve, possamos interromper a campanha com o estabelecimento de uma reforma agrária”, destaca Jardel Lopes, articulador da campanha.

As principais demandas da campanha também englobam dialogar e sensibilizar a opinião pública nacional e internacional, articular redes de apoio às vítimas dos conflitos do campo, anunciar a proposta de reforma agrária popular e demarcação dos territórios para o campo brasileiro e tornar pública a real situação de conflitos que ocorrem no campo, nas águas e nas florestas.

“Assim como a questão agrária não é somente uma questão para quem está no meio rural, a violência no campo também atinge diretamente quem está na cidade. Quanto menos os povos ocuparem terra e território, mais violência, menos comida saudável e meio ambiente teremos”, completa Letícia Chimini.

 

*Confira a Live completa no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=35FnhooD-aM

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