Quilombolas denunciam irregularidades no Plano de Manejo Florestal Sustentável do Projeto de Assentamento Agroextrativista Maracá, divulgado pelo governo do Amapá como o maior do país.
O Plano de Manejo Florestal Sustentável do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Maracá, em Mazagão, no Amapá, contou com articulação do senador Davi Alcolumbre (União Brasil) junto ao INCRA e apoio do senador Randolfe Rodrigues (sem partido), que divulgou a iniciativa e a atuação da TW Forest, empresa responsável pelo projeto. Entretanto, líderes quilombolas e comunitários do PAE denunciam diversas irregularidades, como extração ilegal de madeira e contratos que prejudicam os extrativistas.
“Estou aqui lançando um grito de socorro, pedindo ajuda para que as autoridades do nosso país vão até o Maracá investigar a quadrilha que se instalou lá dentro para explorar nossa madeira e deixar a devastação para o nosso Povo. Nunca ouviram ou foram lá para ouvir a comunidade. Estamos preocupados, a gente pede socorro e as autoridades que fazem a justiça acontecer não fizeram nada”, disse o presidente da Associação dos Quilombolas do Maracá, Jesus de Nazaré Videira da Trindade, à Gazeta do Amapá.
Segundo o líder quilombola, os erros começaram já na criação do plano de manejo, que não observou a Concessão de Direito Real de Uso, que está nas mãos dos assentados. Além disso, a exploração de madeira no Maracá vem ocorrendo desde 2016, muito antes das autorizações serem concedidas. E a “bolsa verde” prometida para os assentados como uma remuneração do governo federal é na verdade um valor pago pela cessão de direitos sobre a sua terra para a Associação dos Trabalhadores do Assentamento Agroextrativista do Maracá (ATEXMA), presidida por Rogério Chucre, que estaria por trás das irregularidades, de acordo com Trindade.
O líder quilombola reclama da inação de políticos da cidade de Mazagão e do estado em relação às denúncias. Trindade reclama da postura de Alcolumbre, que teria pressionado o INCRA pela aprovação do projeto, e acusa o prefeito Dudão Costa e a Câmara de Vereadores da cidade de protegerem Chucre.
Outra irregularidade foi apontada por Vinicius Sassine e Italo Nogueira na Folha: a TW Forest, responsável pelo plano de manejo, já foi multada três vezes pelo IBAMA por recebimento irregular de madeira nativa. Uma multa de R$ 120,2 mil foi aplicada quatro meses antes da concessão da autorização para o projeto, anunciada pela companhia em setembro de 2023. As outras duas, que somam R$ 10,1 mil, referem-se a infrações cometidas dois meses depois, como consta no sistema de consulta pública do órgão ambiental.
Dois pareceres técnicos e dois despachos internos do INCRA foram contrários à autorização. Um dos pareceres aponta viés empresarial do projeto e suspeita de falsificação de assinaturas de beneficiários. Os documentos ainda indicaram problemas no plano de manejo e recomendaram que a anuência não fosse dada à ATEXMA, até que houvesse segurança jurídica para o órgão federal, responsável por assentamentos rurais.
No entanto, o então superintendente do INCRA no Amapá, Fábio da Silva Muniz, discordou dos pareceres técnicos, apontou urgência na autorização e determinou a emissão imediata da anuência, em razão do que considerou como possibilidade de geração de centenas de empregos e de renda a 1.013 famílias. A ordem do superintendente foi dada em março de 2023. Em maio, ele foi exonerado do cargo, o qual recebeu em 2016, no governo Michel Temer.
O plano de manejo florestal sustentável no PAE Maracá é divulgado pelo governo do Amapá como o maior do país. Envolve 172 mil hectares de floresta, quase um terço da área do assentamento, onde vivem 1.993 famílias, segundo dados do INCRA.
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Reprodução/Gazeta do Amapá