Lei do Marco Temporal é tema de discussão em oficina político jurídica para organizações indígenas

A oficina, organizada pelo Cimi Norte I em parceria com a Organização de Lideranças Indígenas do Careiro da Várzea, do povo Mura, busca formar e informar lideranças quanto as leis e direitos indígenas

LIGIA APEL, ASCOM CIMI NORTE I, COM COLABORAÇÃO DE HOADSON LEONARDO SILVA, MISSIONÁRIO DO CIMI NORTE I, EQUIPE BORBA

A Lei 14.701, que ficou conhecida como a Lei do Marco Temporal, foi o principal tema de debate da Oficina Político Jurídica que aconteceu na aldeia Santo Antônio, na Terra Indígena Apipica, entre os dias 6 e 8 de junho.

A Oficina faz parte das atividades de apoio jurídico que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Norte I oferece às organizações indígenas dos estados do Amazonas e Roraima. O objetivo é informar e formar organizações e lideranças quanto às leis brasileiras e internacionais que asseguram direitos constituídos pelos povos originários.

Cerca de 30 lideranças de 15 aldeias do povo Mura, localizadas nos municípios de Careiro da Várzea e Autazes, participaram da Oficina. Dentre elas, as comunidades de Moyray, Murutinga, Lago do Soares, Santo Antônio, Jutaí, Ponciano, Galileia, Gavião, Boa Vista, Pontas das Pedras, Jacaré, Santana, Apipica, Sissoyma e Tucumã. Os participantes estão articulados à Organização de Lideranças Indígenas do Careiro da Várzea (Olimcv).

A oficina, conduzida pela Assessoria Jurídica do Cimi Norte I em parceria com Olimcv, também contou com o apoio do Observatório de Direito Socioambiental e Direitos Humanos na Amazônia, da Universidade Federal do Amazonas (ODSDH/AM-UFAM).

Confira o depoimento de alguns dos participantes:

Felipe Gabriel Mura, tuxaua da aldeia Soares, Terra Indígena Soares, em Autazes (AM)

“Hoje estamos muito mais sabedores não só das leis e da Constituição Federal, mas de todos os direitos que temos. Isso tem feito a gente tomar a iniciativa, contar a nossa própria história. A nossa sobrevivência até hoje foi justamente defendida por aqueles que lutaram sempre. Só que, infelizmente, a história sempre era contada por outros. E hoje não, hoje a gente aprende a lei, discute sobre ela, tem dado nossas opiniões de indígenas. Afinal, só nós sabemos o que realmente é melhor para nós. Agora somos os contadores da nossa própria história”.

“A lei do marco temporal vem justamente para matar, tirar todos os direitos dos povos indígenas. A lei 14.701, pelo que a gente viu estudando um pouco dos artigos [da Constituição], vem para exterminar os povos indígenas que ainda resistem.

Ana Mura, vice coordenadora da Olimcv

“Nos artigos 231 e 232, nosso principal direito é o usufruto dos nossos territórios, de plantar, de criar segundo as nossas crenças, a nossa cultura”

Tuniel Mura, aldeia Murutinga Tracajá, da Terra Indígena Murutinga

“Nosso principal direito é o nosso território, nossa identidade, nossa cultura. O mais importante dessa oficina foi o conhecimento que foi passado. Nós tínhamos muitas dúvidas e pudemos perguntar, criar um diálogo firme para a gente aprender. Eu acredito que quando a gente conhece nossos direitos e os reivindicamos, a gente se fortalece dentro do nosso território”.

“Essa lei 14.701, do Marco Temporal, quer realmente exterminar nós como indígenas. Não respeita os nossos direitos, não respeita o nosso território. É uma lei que não precisa nem começar a existir. Porque quem foi que estava aqui desde sempre? Éramos nós indígenas que sempre estivemos aqui. Esse território ainda não é nosso”.

João Lisboa, assessor jurídico do Cimi

“A Oficina de formação Jurídico-Política, realizada com o Povo Mura, se deu em um momento delicado para a defesa dos direitos dos povos indígenas, dado o cenário de insegurança promovido pela entrada da Lei 14.701/2023 em vigor”.

“As previsões constitucionais são claras quanto aos direitos territoriais dos povos indígenas, assim como também são, os critérios relativos ao Direito à Consulta Consentida, Prévia, Livre e de boa-fé, estabelecidos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Nessa toada, já se revelam os debates sobre a inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023, os retrocessos à vista do que ela dispõe, e sobre a necessidade de uma mobilização nacional do movimento indígena contra ela”.

Lideranças indígenas do povo Mura participam de Oficina Político Jurídica na aldeia Santo Antônio, da Terra Indígena Apipica. Fotos: João Vitor Lisboa/Cimi Ajur Norte I

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