Nota de apoio às ações de combate ao trabalho análogo à escravidão no território sul e sudoeste de Minas Gerais

O Polo Agroecológico do Sul e Sudoeste de Minas, articulação política e territorial integrada por movimentos sociais, cooperativas e associações de produtores/as, sindicatos, organizações da sociedade civil e instituições de ensino, divulgou, nessa quarta-feira, dia 26 de junho, uma nota de apoio às ações de combate ao trabalho análogo à escravidão no território sul e sudoeste mineiro.

Na nota, os integrantes do Polo Agroecológico repudiam as falas proferidas pelo Deputado Federal Emidinho Madeira (PL-MG) no Congresso Nacional, no dia 18 de junho, no plenário da Câmara dos Deputados, e, no dia 19 de junho, em sessão da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural.

Leia a nota abaixo:

“O Polo Agroecológico do Sul e Sudoeste de Minas apresenta esta nota em defesa das ações de resgate de trabalhadoras e trabalhadores em condições análogas à escravidão na produção de café realizadas recentemente em nosso território. Somamos nossas forças com as organizações de trabalhadoras e trabalhadores para defender as ações da Auditoria Fiscal do Trabalho com o apoio da Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Ministério Público do Trabalho (MPT) na defesa dos direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores explorados. Também repudiamos as falas proferidas pelo deputado federal Emidinho Madeira (PL-MG) no Congresso Nacional no dia 18 de junho, no plenário da Câmara dos Deputados, e, no dia 19 de junho, em sessão da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural.

No dia 18 de junho, o deputado federal Emidinho Madeira (PL-MG), presidente da Frente Parlamentar do Café, fez discurso no Plenário da Câmara dos Deputados questionando o trabalho de Auditores Fiscais do Trabalho e da Polícia Federal no território sul e sudoeste de Minas Gerais. Afirmou que a “região sul e sudoeste de Minas Gerais está em pânico” pela fiscalização realizada em Nova Rezende, sua cidade, e região. Ora, nossa região está em pânico, não pela fiscalização, que ainda é insuficiente, mas pela quantidade de violações de direitos e pela existência de trabalhadoras e trabalhadores em condições análogas à escravidão na cadeia produtiva do café. O deputado ainda afirmou a necessidade de flexibilizar a NR 31, que, segundo ele, inviabilizaria a “atividade dos cafeicultores da região sul e sudoeste de Minas Gerais”. Mostrou preocupação com as famílias e crianças, pois a fiscalização chegava nas propriedades “com imprensa à frente”, “com a polícia, fuzil, metralhadora”, afirmando ainda que “metralhadora e fuzil era para bandido e não para trabalhador”.

O Deputado mostra, dessa forma, muita preocupação com as famílias que exploram trabalhadoras e trabalhadores e pouca preocupação com as famílias das trabalhadoras e trabalhadores vitimizados pela exploração degradante. Dirigindo-se aos Auditores Fiscais do Trabalho, o Deputado afirmou que “essa multa é muito pesada e tira muita gente dessa atividade”, que a renda dos produtores neste ano já estava “comprometida com a justiça” e o nome desses produtores estava “travado”. Afirmou também que os auditores deveriam seguir o exemplo do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) e da Polícia Ambiental que abriram diálogo e hoje caminham junto com “empresas, comércio e o produtor rural”.

Essa fala coloca em questão também o trabalho dessas duas instituições importantes para o desenvolvimento sustentável da agricultura em nosso estado. O Deputado justifica o trabalho análogo à escravidão nas propriedades fiscalizadas afirmando que são “cafeicultores há um século, uma vida, vêm de várias gerações e muitos produtores não sabem fazer outra coisa.” Diante dessas afirmações, nós, defensores e defensoras dos direitos humanos e dos direitos trabalhistas, nos posicionamos e afirmamos que independente do tamanho do/a produtor/a rural, o trabalho escravo é crime, previsto no artigo 149 do Código Penal. O tamanho da propriedade não pode ser usado como argumento para tratar sem dignidade trabalhadoras e trabalhadores e, como crime, deve ser punido com todo rigor da lei, seja de forma administrativa ou judicial.

No dia 19 de junho, Emidinho Madeira teve um de seus pedidos atendido pelo deputado Evair de Melo (PP-ES), presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural. Durante a reunião que tratava de “Estoques Públicos e a necessidade de importação de arroz” foi concedido um espaço de fala extraordinário para o Deputado Emidinho Madeira. Nessa fala, o Deputado afirmou mais uma vez que “o Ministério do Trabalho, os auditores, acompanhados da Polícia Federal estão indo até as propriedades” nos municípios da região. O Deputado apresentou o caso de um produtor que, segundo ele, “vizinho nosso lá, de agricultura familiar”, dando detalhes do local, nome dos envolvidos e a história de vida da família. Afirmou que o produtor foi autuado e intimado a comparecer no Ministério do Trabalho e Emprego. Afirmou que os Auditores Fiscais do Trabalho “não dão orientação, que não tem diálogo, não tem conversa”. Relatou que “isso tá acontecendo todos os dias lá na nossa região”, que o “povo tá em pânico e parando de trabalhar”. Dirigindo-se ao Deputado Evair de Melo, afirmou que este havia se comprometido a “falar com o Pedro Lupion (PP-PR)”, que iria “marcar conversa com o Senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG)” e que o Deputado Diego Andrade (PSD-MG) iria “falar com o Ministro do Trabalho”. Afirmou que a causa era “essa lei trabalhista severa”.

Ao retomar a fala, o Deputado Evair de Melo afirmou que assinava “toda a fala do Deputado Emidinho Madeira” e que a NR 31 é “inaplicável”. Seguiu, afirmando o absurdo de que “esse trabalhador, ele trabalha por rendimento, trabalha por prazer. Esse homem, ele quer levantar muito cedo, porque ele quer pegar mais cedo, ele quer fazer o seu almoço o mais rápido possível, porque ele trabalha por rendimento”. Repudiamos de forma veemente essa fala, pois trabalhadoras e trabalhadores não sentem prazer com a superexploração de seu trabalho. Afirmou ainda que a Polícia Federal, o Ministério do Trabalho e Emprego ajudariam mais a região sul e sudoeste de Minas Gerais se “ao invés de fiscalizar, ajudasse a panhar café”.

Para finalizar os absurdos desse momento na comissão, o Ministro da Agricultura e Pecuária Carlos Fávaro colocou-se à disposição dos deputados para irem “juntos ao ministro do trabalho” e que queria “visitar a região para que isso seja pacificado”, afirmando que isso seria necessário “para que a gente dê dignidade para que esses homens e mulheres que estão trabalhando não possam ser levados a ilegalidade como estão sendo”.

Reafirmamos que o que realmente nos causa pânico em nossa região é a superexploração de trabalhadoras e trabalhadores. Esses deveriam ter o apoio do poder público na defesa de sua dignidade.

Por fim, o Grupo de Trabalho de Combate ao Trabalho Escravo do Polo Agroecológico do Sul e Sudoeste de Minas, expressa o seu apoio incondicional às ações de fiscalização por parte do Ministério Público do Trabalho, enaltecendo o trabalho dos auditores fiscais, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal no combate ao trabalho análogo à escravidão. Reafirmamos, por fim, algumas exigências que fizemos em recente audiência pública promovida pela Comissão do Trabalho, Previdência e Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais na cidade de Varginha:

1 – Apoio incondicional às trabalhadoras e aos trabalhadores resgatados, com garantia de acompanhamento emergencial pós-resgate, continuado e multiprofissional, que garanta todos os direitos legais;

2 – Apoio para identificação da origem das trabalhadoras e dos trabalhadores resgatados e construção de Políticas Públicas que promovam a melhoria das condições de vida nos locais de origem;

3 – Apoio para conscientização das trabalhadoras e dos trabalhadores sobre os seus direitos trabalhistas;

4 – Contratação de novos Auditores Fiscais do Trabalho com destinação prioritária de um contingente maior para o território sul e sudoeste de Minas Gerais;

5 – Apoio emergencial às ações de campo durante o período de colheita do café no Sul e Sudoeste de Minas Gerais.”

Foto: Sérgio Carvalho /MTE

 

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