Eleições no Rio: Reflexões para 2026

Prefeitos eleitos são variáveis importantes na disputa ao governo estadual. É provável que Eduardo Paes, reeleito, seja o candidato lulista em 2026. Atual governador deve conquistar boa parte das prefeituras. Presidente da Alerj é hoje aposta de outro campo da direita

por Mayra Goulart e Theófilo Rodrigues, em Outras Palavras

Esta é uma eleição típica ou atípica? Em política, os termos “normal” e “anormal” não fazem muito sentido. Porém, sob um prisma analítico, nosso papel como cientistas políticos é identificar padrões e desvios, de modo a contribuir para o debate para além da mera factualidade.

Qual seria, então, o padrão, quando se trata de uma eleição municipal? Em primeiro lugar, devemos registrar que temas locais e figuras locais importam mais do que temas e atores nacionais, configurando um ambiente no qual os partidos e suas alianças nacionais importam menos do que os alinhamentos entre as lideranças regionais, sabendo que muitos acordos ultrapassam as fronteiras dos municípios. Essa observação não deve ignorar, contudo, que a polarização nacional — Lula versus Bolsonaro — contingencia a formação de alianças. Não é trivial mencionar que a federação Brasil da Esperança — formada por PCdoB, PT e PV — não está coligada com o PL em nenhum município do estado.

Em segundo lugar, os alinhamentos e acordos são celebrados entre famílias em sua imensa maioria chefiadas por patriarcas. Há poucas mulheres, poucas pessoas negras, poucas minorias, mesmo sendo um pleito marcado por uma maior taxa de renovação, na medida em que a vereança é a porta de entrada na carreira política, quando a concebemos de maneira linear. No caso dos municípios do estado do Rio de Janeiro explorados no Guia Lappcom Eleições Municipais 2024, todos esses componentes se fazem presentes. Em nenhum dos municípios, exceto Campos dos Goytacazes, há mulheres encabeçando chapas efetivamente competitivas à Prefeitura, figurando nas últimas pesquisas com mais de 10% de intenção de votos.

Os posicionamentos reacionários acerca da família, das mulheres, das minorias e dos direitos civis que nos surpreenderam ao serem anunciados e reivindicados publicamente de modo despudorado e orgulhoso nas eleições de 2016 e 2020 já não são novidades. Hoje, concorrem com outros posicionamentos menos radicais na disputa pela preferência do eleitor.

Nas eleições municipais de 2024, a política tradicional e os políticos profissionais saem na frente. Essa tendência já é esperada nos pleitos municipais, menos atravessados pelos condicionantes ideológicos das grandes discussões nacionais e mais suscetíveis aos vínculos de pertencimento e interação direta entre lideranças locais e eleitores. O que se percebe é que os eleitores estão mais interessados em discutir as questões do seu cotidiano, do seu bairro, da sua comunidade ou, pelo menos, votar em quem parece mais capaz de fazê-lo.

É por este motivo que essas lideranças têm sido objeto da cobiça dos grandes partidos nacionais para serem colocadas como cabeça de chapa nas candidaturas à Prefeitura, ou como puxadores de voto nas eleições para a Câmara Municipal.

Mesmo um partido com alta carga de centralização, como o PT, tem aberto mão de lançar candidatos próprios em prol do apoio a líderes locais bem avaliados pelos eleitores de suas cidades.

Esta estratégia decorre de um raciocínio e de uma estratégia. O primeiro diz respeito a um entendimento de que esta eleição funcionará como um plebiscito acerca dos prefeitos incumbentes. Aqueles que forem bem avaliados permanecerão no poder ou elegerão seus indicados. A estratégia é análoga à que observamos nas eleições francesas, em que a extrema-direita foi contida por alianças realizadas em cada circunscrição pelos partidos de esquerda e de centro que renunciaram a seus candidatos em prol daqueles mais bem cotados para derrotar a extrema-direita.

No Brasil, convencionou-se definir essa estratégia como “Frente Ampla”. Resta saber se nessas eleições municipais estão sendo construídas as bases para essa frente ampla em 2026 no estado.

Campos políticos em disputa para o governo do Rio de Janeiro em 2026

Já virou lugar-comum dizer que as eleições municipais conformam um ensaio geral para as eleições estaduais que se seguem. Não que haja uma relação automática entre o resultado das eleições municipais e o das estaduais, mas os prefeitos eleitos configuram variável importante na organização dos campos em disputa para o governo do estado. Se isso é verdade, vale a pena avaliarmos quais são os candidatos e partidos com mais chances de vitória em outubro de 2024 e em quais campos eles tendem a se organizar.

Vejamos o caso do estado do Rio de Janeiro: Tudo indica que a eleição para governador será uma batalha entre três grandes campos políticos: (1) o campo lulista, que gostaria de ter como seu candidato o prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD) — embora ele negue, até o momento, essa intenção; (2) o campo do atual governador Claudio Castro (PL), que pode ter como candidato o deputado federal Dr. Luizinho (PP); (3) e o campo liderado pelo presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar (União Brasil).

O primeiro campo é aquele que pode reunir forças da esquerda (PCdoB), da centro-esquerda (PSB, PDT, PT e PV) e da centro-direita (PSD, Solidariedade, Podemos, PRD, DC, Agir, Avante) do espectro político do estado. De acordo com as pesquisas que temos até o momento (15/09), Paes deve ser reeleito prefeito do Rio com mais de 60% dos votos da cidade. Há também uma grande chance desse campo eleger Rodrigo Neves (PDT) prefeito de Niterói, Zito (PV) prefeito de Duque de Caxias, Washington Quaquá (PT) prefeito de Maricá e Andrezinho Ceciliano (PT) prefeito de Paracambi.

O segundo campo é o que possui a máquina do estado e, provavelmente, o maior número de prefeitos que serão eleitos em 2024. Castro não pode tentar a reeleição como governador, mas é um forte candidato a senador. Nos bastidores, o que se diz é que o candidato ao governo será o deputado federal Dr. Luizinho (PP). Essa aliança entre PL e PP, que também pode contar com o MDB, deve reeleger o prefeito de São Gonçalo, Capitão Nelson (PL), com mais de 70% dos votos, o prefeito de Campos dos Goytacazes, Wladimir Garotinho (PP), com cerca de 60%, o prefeito de Magé, Renato Cozzolino (PP), e eleger Dudu Reina (PP) em Nova Iguaçu e Dr. Serginho (PL) em Cabo Frio. Embora a disputa esteja mais apertada, é provável a reeleição do prefeito Neto (PP) em Volta Redonda. Esse campo também deve levar ao segundo turno Valdecy da Saúde (PL) em São João de Meriti e Hingo Hammes (PP) em Petrópolis.

Também localizado à direita do espectro político, o terceiro campo tende a ter como candidato a governador o presidente da Alerj, Rodrigo Bacellar (União Brasil). Hoje, a principal aposta desse grupo é na eleição do deputado federal Márcio Canella (União Brasil) como prefeito de Belford Roxo com o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro e a reeleição do prefeito Alfredão (União Brasil) em Itaperuna.

Claro, o que algumas das pesquisas avaliadas indicam pode mudar nas próximas duas semanas, e o resultado de outubro pode ser outro. Contudo, numa avaliação de tendências, não seria tão equivocado dizer que esse é o cenário que se desenha para 2026.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

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