Paulo Motoryn: “In Fux we trust, parte 2”

Quase dez anos depois, o ministro Luiz Fux, do STF, volta a ser esperança da extrema direita.

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Era uma noite de 2016 quando Sergio Moro, o então super-herói da República de Curitiba, digitou uma mensagem que entraria para o folclore da operação Lava Jato. “In Fux we trust” [Em Fux nós confiamos, em tradução livre], respondeu ao então procurador Deltan Dallagnol, que acabara de relatar uma conversa promissora com Luiz Fux, ministro do STF, sobre os rumos da força-tarefa.

As mensagens trocadas entre os então juiz e coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal, que o mundo ficou sabendo por causa da Vaza Jato, a histórica série de reportagens  publicada aqui no Intercept Brasil, revelavam o que já era evidente: no Supremo Tribunal Federal, o ministro era um aliado de primeira hora.

Quando necessário, Fux aparecia como um escudo protetor contra qualquer risco que pudesse frear a operação – e foi assim até na derrota final de Sergio Moro. Na votação do STF que confirmou a suspeição do ex-juiz, Fux foi um dos votos vencidos: se colocou contra a decisão da maioria dos seus colegas e, é claro, preferiu atacar a Vaza Jato.

“A suspeição, na verdade, pelo ministro Edson Fachin, foi afastada. Municiou [o julgamento na Segunda Turma] uma prova absolutamente ilícita, roubada, que foi depois lavada. É como lavagem de dinheiro. Não é um juízo precipitado. Essa prova foi obtida por meio ilícito. Sete anos de processo foram alijados do mundo jurídico”, lamentou Fux, na época.

Agora, em 2025, “In Fux we trust” ressurge como mantra da extrema direita.

A esperança depositada no ministro não é mais sobre prisões preventivas ou delações premiadas – o que importa, quase dez anos depois, é que ele seja a tábua de salvação para um ex-presidente que, ironicamente, só chegou ao poder graças à Lava Jato.

A cena mais recente desse enredo aconteceu na quarta-feira, 26, na sessão da Primeira Turma do Supremo, onde Fux mostrou que será peça-chave no julgamento que pode condenar Jair Bolsonaro e outros aliados pela tentativa de golpe de estado.

No seu voto, o ministro expôs suas discordâncias com outros ministros, questionando a delação de Mauro Cid, defendendo o julgamento de Bolsonaro pelo plenário do STF e, mais que isso,  relativizando o fato de que a própria tentativa de um golpe de estado já deva ser criminalizada.

“Há aqueles que entendem que a tentativa de golpe já é um atentado contra a democracia. Isso é uma solução que se dá. (…) Agora, a partir do momento que o legislador cria o crime tentado como consumado (…), no meu modo de ver há um arranhão na Constituição Federal, e também não se cogitou nem de atos preparatórios nem de tentativa do crime tentado, que é em caso consumado”, afirmou Fux.

Ato contínuo, os advogados dos envolvidos na trama golpista começaram a explorar a brecha. Logo que saiu do STF, o ex-senador Demóstenes Torres, advogado do ex-comandante da Marinha,  almirante Almir Garnier, disse: “O voto [de Fux] foi espetacular. Ele admite uma série de coisas que nós alegamos na defesa. O ministro foi bastante sensato e os outros vão ter que considerar”.

Em um vídeo publicado nas redes sociais, o advogado Jeffrey Chiquini, que atua em processos relacionados ao 8 de Janeiro, demonstrou o que move a esperança bolsonarista com a dissidência aberta por Fux: adiar ao máximo o resultado, criar embaraços para o STF e manter a esperança da extrema direita acesa.

“Esse processo não vai terminar em 2025 como Alexandre de Moraes quer. Fux jogou um balde de água fria nesse processo. O que vai acontecer? O Fux vai discordar de alguns pontos e, havendo um voto contrário, vai nascer a possibilidade de recurso ao plenário. Só não iria, se fosse unânime. Não vai ser unânime”, declarou.

A esperança em Fux não vem só das pistas dadas nos últimos dias. O nome do ministro nunca esteve dissociado das expectativas da extrema direita. Como já escrevemos no Intercept, Fux é o mesmo que alimentou, como poucos, o espírito do Partido da Lava Jato, aquele projeto silencioso e nocivo de um MPF transformado em bancada política.

Se Fux já foi o fiador do lavajatismo, por que não poderia ser o fiador de um bolsonarismo acuado? A ressurreição do “In Fux We Trust” expõe essa esperança quase desesperada.

E não se trata mais de confiar na sua caneta para turbinar a Lava Jato, mas para impedir que a Justiça alcance quem um dia foi alçado ao poder pelas próprias mãos da operação.

Legenda da Folha de São Paulo para a foto, na matéria “Este é Luiz Fux, publicada em 16/09/2019:

O presidente Jair Bolsonaro abraça Fux, que participava da cerimônia de entrega de medalhas do Mérito Mauá, no Club Naval. O ministro rejeitou a denúncia em que Bolsonaro era réu por acusação de racismo e suspendeu a ação penal em que o atual presidente é real sob a acusação de incitar o estupro. Foto: Pedro Ladeira, 15.ago.2019 / Folhapress.

 

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