Pataxó levou um tiro no abdômen, passou por cirurgia e seu estado de saúde é considerado estável, conforme DSEI. Uma pistola foi deixada para trás pelos pistoleiros
Diante da morosidade na conclusão dos procedimentos demarcatórios dos territórios Pataxó no sul e extremo-sul da Bahia, além da violência contra as aldeias com episódios crescentes nos últimos meses, um protesto fechou a BR-101, na manhã e tarde desta sexta-feira, 4, na altura do município de Itamaraju.
Enquanto o protesto acontecia, no município do Prado a retomada da Fazenda Japara Grande, parte da Terra Indígena Comexatibá, foi atacada por homens armados. Um indígena foi alvejado por arma de fogo, mas os Pataxó conseguiram se manter no local.
Baleado no abdômen, o indígena foi encaminhado para o Hospital Regional Costa das Baleias, em Teixeira de Freitas, onde passou por cirurgia. Seu estado de saúde é estável, informou o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI). No entanto, o projétil afetou órgãos internos e a lesão poderá deixar sequelas.
Os Pataxó afirmam que fazendeiros e pistoleiros participaram da ação. No momento da fuga, um homem deixou para trás uma pistola – não é possível afirmar se o tiro que atingiu o indígena partiu do armamento. Um Boletim de Ocorrência foi lavrado pela Polícia Civil, mas nele consta apenas a informação do indígena baleado.
Cacique denuncia que policiais chegam sem documentos, indígenas são baleados e presos, enquanto grileiros avançam sobre terras indígenas
A TI Comexatibá teve o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) publicado em 2015. As aldeias costumam sofrer ataques de pistoleiros, tentativas de despejos ilegais e já esteve envolvida em quase uma dezena de reintegrações de posse – quase a totalidade derrubada pela própria Justiça Federal.
O cacique Nailton Muniz Pataxó Hã-hã-hãe expressou em vídeo da mídia Pataxó (assista acima) sua indignação com a conivência do Estado, a omissão do governo e a inoperância dos órgãos competentes. Ele denuncia que policiais chegam sem documentos, indígenas são baleados e presos, enquanto grileiros avançam sobre terras indígenas.
“Se o governador pode trazer obras sociais para alguns, por que não garante a nossa segurança? E o ministro da Justiça, por que não assina as cartas declaratórias que reconhecem nossas terras? Sem essa assinatura, continuamos vulneráveis à violência dos fazendeiros e da polícia”, disse.
PM tenta despejo ilegal
Conforme apuração, a Polícia Militar esteve prestes a cumprir um despejo ilegal, sem mandado judicial, à guisa de reintegração de posse, na área retomada atacada nesta sexta. Apenas no fim da tarde os Pataxó foram comunicados que ordens superiores vetaram a ação.
Cacique Aruã Pataxó, coordenador Regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) do sul da Bahia, recebeu a informação de que o despejo forçado iria ocorrer, mesmo sem mandado. A partir de então teve início uma intensa mobilização para demover a ideia do governo estadual.
Quando há decisão judicial, os processos de reintegração de posse envolvendo terras indígenas devem ser remetidos prioritariamente à Câmara de Mediação e Conciliação do Poder Judiciário antes de seguirem para julgamento
Na Bahia, em face dos ataques constantes de fazendeiros e pistoleiros, além da violência policial, o governador Jerônimo Teixeira (PT) foi pressionado a dar uma resposta e montou uma Força Tarefa para estabelecer diálogo entre os indígenas e os não indígenas que se dizem proprietários de áreas dentro das terras indígenas.
No final do mês de março, os secretários de Justiça e Direitos Humanos, Relações Institucionais e a secretária de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais (Sepromi), Patrícia Pataxó, estiveram em Prado para conversar com as partes em uma tentativa de arrefecer os ânimos.
O Conselho de Caciques Pataxó, em nota pública, destacou que as ações das polícias estaduais nas terras indígenas são ilegais, fruto de retaliação e realizadas com a participação de fazendeiros e pistoleiros. A Repórter Brasil também denunciou irregularidades em operação.
Protesto na BR-101: liberdade para os presos
A manifestação na rodovia, como destaca a mídia Pataxó, foi mais uma resposta à crescente violência contra as comunidades indígenas da região.
No último dia 20 de março, uma ação violenta e com várias irregularidades da PM acabou com a detenção de 11 indígenas – foram quase 20 detidos, mas uma parte dos presos foi liberada no mesmo dia.
“O povo Pataxó reivindica a soltura imediata dos indígenas presos de forma arbitrária e ação urgente do governo para garantir a demarcação das Terras Indígenas Pataxó Barra Velha, Tupinambá de Olivença e Tupinambá de Belmonte, que já foram reconhecidas e delimitadas, mas ainda não receberam a homologação necessária”, diz nota do povo.
“ Estado brasileiro se omite diante da violência e da inércia, deixando as comunidades indígenas vulneráveis a ataques cada vez mais frequentes. É hora de o governo agir e garantir os direitos dos povos indígenas!”, diz nota dos Pataxó
Agenda em Brasília por demarcação
Cerca de 300 indígenas dos povos Pataxó e Tupinambá estiveram em Brasília entre os dias 10 e 13 de março para cobrar a conclusão do processo demarcatório de suas terras indígenas, localizadas nas regiões sul e extremo sul da Bahia.
Estavam presentes lideranças das Terras Indígenas Tupinambá de Olivença, Tupinambá de Belmonte, do povo Tupinambá, e Barra Velha, Comexatibá e Coroa Vermelha, do povo Pataxó.
Os indígenas participaram de uma série de reuniões e incidências junto a instituições do Estado e órgãos do governo federal. Além da conclusão das demarcações, pelas quais aguardam há décadas, as lideranças também cobraram a garantia de políticas públicas diferenciadas, como educação e saúde.
Ao término da agenda, sem uma resposta efetiva do governo federal sobre suas reivindicações, os Pataxó prometeram que seguiram com protestos e retomadas até que os procedimentos demarcatórios sejam concluídos e os territórios destinados ao usufruto exclusivo do povo.
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Indígenas Pataxó protestam na BR 101 contra a violência crescente e pela demarcação das terras indígenas do povo. Foto: Mídia Pataxó