A Comissão Pastoral da Terra manifesta profunda indignação à aprovação, em dois turnos, da PEC do Marco Temporal pelo Senado Federal. Em pleno ano da COP-30, quando o Brasil se apresenta ao mundo uma imagem de responsabilidade ecológica e respeito aos povos da floresta, o Senado escolhe caminhar na direção contrária ao compromisso com a Constituição, com a Casa Comum e acordos internacionais como a Convenção 169 da OIT. Ao aprovar essa PEC, o Congresso atinge de forma cruel os povos indígenas, negando seus direitos originários e tentando transformar em regra constitucional uma violência histórica que já foi reconhecida como inconstitucional pelo STF.
A tese do marco temporal ignora deliberadamente que muitos povos foram expulsos de suas terras pela força, por massacres, por perseguições e pelo peso da grilagem que sempre avançou com violência sobre os territórios tradicionais. Exigir que esses povos provem presença física em 1988 é mais uma forma de negar sua história, sua dor e sua resistência. É ignorar que essas terras são herança ancestral, dom sagrado e espaço onde a vida se renova para eles e para todo o país. É colocar novamente a ganância acima da dignidade humana.
A aprovação dessa PEC, justamente quando o mundo volta seus olhos para Belém na COP 30, evidencia uma contradição dolorosa: enquanto discursos oficiais falam de “sustentabilidade” e “proteção do clima”, a realidade mostra que os próprios guardiões dos biomas, os povos indígenas, seguem sendo atacados, desconsiderados e empurrados para novas situações de violência. Não existe compromisso ambiental verdadeiro sem o reconhecimento e a demarcação dos territórios indígenas. Sem eles, não há floresta em pé, não há água limpa, não há equilíbrio climático.
Repudiamos as práticas recorrentes do Congresso Nacional que fere os direitos dos empobrecidos e assume a pauta do lobby do capital (agronegócio, mineradoras, madeireiras, petroleiras…).
A CPT acompanha há décadas a violência no campo e sabe o que uma PEC como essa significa na prática, o aumento das invasões, do desmatamento, da pressão sobre territórios já ameaçados, da insegurança e do sofrimento de famílias que apenas querem viver em paz na terra que sempre lhes pertenceu. Ao constitucionalizar essa injustiça, o Congresso brasileiro alimenta conflitos e se afasta ainda mais da construção de um país justo e reconciliado com sua história.
Por isso, denunciamos essa decisão e afirmamos que não há futuro para o Brasil se a vida dos povos originários continuar sendo tratada como obstáculo ao interesse econômico. É urgente a necessidade de retomar e concluir as demarcações, de proteger os territórios.
A CPT permanece comprometida com a defesa da vida, da terra e dos povos que nela vivem apoiando a resistência dos povos, semente de esperança para todo o país.
Comissão Pastoral da Terra, 10 de dezembro de 2025.
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Aprovando a PEC do Marco Temporal, o Congresso atinge os povos indígenas, negando direitos originários e normalizando uma violência histórica. Foto: Ludmila Pereira
