O Facebook proibido de Letícia Sabatella, por Roberto Malvezzi* (Gogó)

Correio da Cidadania

A primeira vez que vi Letícia pessoalmente foi quando ela veio visitar Frei Luis, em Sobradinho, quando ele estava em greve de fome. Desde então ficamos amigos.

Eu dirigia o carro e íamos de Juazeiro a Sobradinho quando o telefone tocou e era o aviso de que a mãe da colega que estava com ela tinha acabado de falecer. Sem saber o que fazer, encostei o carro e perguntei o que faríamos. Ambas choravam, mas a colega dela disse que era para seguirmos em frente.

Depois, em Sobradinho, à medida que a consciência saiu do choque, vi Letícia fazendo o que pudesse para arrumar um meio de a colega voltar ao Rio. Enquanto não resolveu, não sossegou.

Naquele dia veio uma tempestade feroz na região, depois de sete meses sem chuva. A energia aos pés da barragem de Sobradinho foi embora. Nossa celebração da noite foi à luz de vela. Ela estava lá. E eu me perguntava o que uma mulher famosa fazia naquele ambiente aparentemente tão adverso.

Saiu dali direto para Salvador para um evento de Petrobrás. Era para ela fazer o papel de mediadora do evento. Sacou a carta dos movimentos em defesa do São Francisco do bolso e a leu para todos os presentes. Uma pessoa da Petrobrás jurou para ela que jamais conseguiria qualquer apoio da empresa. Depois a Secretaria dos Direitos Humanos da empresa lhe pediu desculpas.

A seguir, nos encontramos várias vezes nesses ambientes de defesa de causas justas e dos direitos humanos.

A última vez que nos encontramos pessoalmente foi no ambiente da arte. Ela me indicou para fazer a palestra de abertura para atores, diretores e núcleo de produção da novela Velho Chico, no Rio. Por causa dela, eu fui. Ela ainda estava no elenco.

A oficina foi longa, de umas 5 horas. No intervalo, enquanto conversava com os artistas, sobretudo os do Nordeste, um grupo brincava no meio do palco. Então, uma atriz caiu de forma brusca e ficou desacordada. Veio o socorro e Letícia sumiu. Só reapareceu mais tarde, depois que a colega tinha sido removida e internada. Mas telefonava a todo momento para o hospital para saber da situação. Não foi nada de mais grave.

Esses gestos dizem claramente que ela não está envolvida com as questões socioambientais, ou na defesa dos direitos humanos, por estratégia de marketing. São as convicções mais profundas, em defesa da causa indígena, do ambiente, dos direitos humanos, de toda causa justa.

O bloqueio de sua página no Facebook, ainda que tenha sido apenas temporário, confirma os tempos de razão obscura e corações raivosos que vivemos.

Ela falou bem diante de Dilma. Expressou a voz de milhões de brasileiros: “sou oposição ao seu governo, mas sou contra o golpe”.

A consciência que ela tem da realidade está à frente de 90% da população brasileira, inclusive de intelectuais e democratas de conveniência.

Por isso sua voz e suas atitudes incomodam e ela tem que suportar agressões. Não é por acaso que sua página foi proibida.

*Possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

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