Incêndios florestais em Portugal: resultado da indústria da madeira

No GJEP

Os incêndios florestais em Portugal vêm sendo chamados de “o pior desastres desse tipo na história recente”. Dezenas de pessoas morreram em seus carros enquanto tentavam escapar do fogo. Mas essa tragédia terrível foi causada pela ação humana. Um quarto da paisagem florestal de Portugal (mais de 812 mil hectares ou 2 milhões de acres) foi substituída por plantações de eucalipto não nativas. Além disso, há imensas plantações de pínus (pinheiro).

Oliver Munnion, codiretor da Biofuelwatch, mora na região dos incêndios florestais de Portugal. “Nós passamos a noite em uma escola local depois que cerca de 30 aldeias foram evacuadas na nossa região. As notícias dizem que um quarto do município foi queimado. Até agora nós tivemos sorte, e ainda temos a nossa casa, mas muita gente perdeu tanta coisa”.

“É hora de encarar a realidade de que as vastas plantações de eucalipto e pínus de Portugal, e a corrupção e o lucro que vêm com elas, são o principal motivo pelo qual o país queima todos os anos. Juntem-se a isso os impactos das mudanças climáticas, que trazem temperaturas mais altas e a seca, e a nossa área tem pouca chance. E o verão apenas começou”, acrescentou.

Assim como os que devastaram partes do Chile em janeiro – os piores da história do país – os incêndios em Portugal foram o resultado de uma indústria madeireira imprudente e mal regulada, bem como de políticas internacionais que chamam equivocadamente as plantações industriais de árvores de “florestas”. [1]

“Nos incêndios do Chile e de Portugal, o culpado foi o lobby da indústria por subsídios estatais para plantações de madeira”, afirmou Felipe Grez, membro da OLCA no Chile. “Plantações de eucalipto inflamáveis ​​e que consomem muita água têm se expandido por toda a paisagem, graças a esses perigosos esquemas de subsídio estatal que, no caso do Chile, surgiram durante o regime de Pinochet. As plantações chegam até os limites das estradas e das cidades, tornando inevitáveis os incêndios desastrosos. Nós não apenas condenamos esse flagrante desrespeito pela vida, mas também o futuro desejo da indústria de usar árvores geneticamente modificadas – o que vai piorar ainda mais esses problemas”. [2]

A Campanha para deter árvores transgênicas [3] adverte que uma nova ameaça está surgindo das plantações de eucalipto geneticamente modificadas. Os eucaliptos transgênicos estão sendo desenvolvidos para crescer mais rápido, resistir a herbicidas tóxicos e/ou tolerar temperaturas abaixo de zero. Essas características agravariam os impactos das plantações e as espalhariam para novas regiões que atualmente são muito frias para que o eucalipto cresça.

Os eucaliptos transgênicos foram aprovados no Brasil em 2015, e agora o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos está aceitando comentários públicos sobre um projeto de Declaração de Impacto Ambiental que recomenda a aprovação da liberação em grande escala de plantações de eucalipto transgênico em todo o Sul do país.

“Ambas as tragédias, no Chile e em Portugal, devem fazer soar o alarme com relação aos planos para plantações de eucaliptos transgênicos no Sudeste dos Estados Unidos”, acrescentou Anne Petermann, Diretora Executiva do Global Justice Ecology Project, com sede naquele país, e Coordenadora Internacional da Campanha para Deter as Árvores Transgênicas. “Esta região já sofre com secas repetidas devido às mudanças climáticas. A proposta de plantar um milhão de acres de eucaliptos transgênicos inflamáveis, invasivos e que drenam a água na região é uma receita clara para incêndios desastrosos”.

NOTAS

[1] A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estabelece a definição internacional legal de florestas. Essa definição é vaga (terra com cobertura de copa ou nível de estoque equivalente de mais de 10% e área de mais de 0,5 hectare (ha). As árvores devem atingir uma altura mínima de 5 metros (m) na maturidade in situ.) e permite a destruição das florestas e sua substituição por monoculturas de árvores. No entanto, isso não é considerado desmatamento, embora toda a biodiversidade tenha desaparecido.

Há um abaixo assinado global exigindo que a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação altere sua definição de floresta para excluir as plantações de árvores. O documento tem mais de 130.000 assinaturas, mas a FAO se recusa a tomar qualquer atitude.

[2] Em março de 2017, o OLCA (Observatório Latino-Americano de Conflitos Ambientais) organizou uma delegação da Campanha para Deter as Árvores Transgênicas cujo objetivo era examinar os impactos das plantações industriais de árvores no Chile. O grupo inclusive percorreu a região queimada pelos incêndios florestais. Eles também falaram com organizações locais, membros da comunidade e representantes mapuches sobre esses impactos e sobre as consequências futuras do uso de plantações de eucaliptos ou pinheiros geneticamente modificados. No início deste mês, o OLCA ajudou a organizar manifestações e eventos paralelos para protestar contra a Conferência de Biotecnologia de Árvores da União Internacional das Organizações de Pesquisa Florestal (IUFRO), em Concepción, no coração da região dos incêndios florestais.[3] A Campanha para Deter as Árvores Transgênicas é uma coalizão global de organizações e redes dedicadas à proteção de florestas, biodiversidade e comunidades dependentes da floresta, através da rejeição global de todas as árvores geneticamente modificadas. Ela inclui geneticistas, silvicultores, ecologistas, biólogos, cientistas de plantas, povos indígenas e outros especialistas nos impactos das plantações de monocultivos para produzir madeira. Esses especialistas têm trabalhado sobre o problema das árvores transgênicas e dessas plantações de monocultivos há décadas.

As organizações na Campanha incluem Biofuelwatch (EUA e Reino Unido), Canadian Biotechnology Action Network, Movimento de Libertação de Campo (Bélgica), Friends of the Earth Melbourne (Austrália), GE Free New Zealand, Global Justice Ecology Project (EUA), Indigenous Environmental Network ( América do Norte), OLCA: Observatório Latinoamericano de Conflitos Ambientales (Chile) e Movimento Mundial de Floresta Tropical (Brasil e Uruguai). O geneticista Dr. Ricarda Steinbrecher da EcoNexus e a Federação dos Cientistas Alemães é o assessor científico da Campanha.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Ivonete Gonçalves.

 

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