O que esperar da Política Brasileira em 2018? Parte 7: tecnologias inovadoras impulsionam transparência nas eleições

por Luisa Fenizola, em RioOnWatch

Diferente dos movimentos de renovação política e candidaturas alternativas, que visam fazer a transformação por dentro da estrutura política tradicional, necessariamente ainda partidária, nessas eleições multiplicaram-se as iniciativas da sociedade civil e da academia para incidir sobre o debate de propostas governamentais e monitorar a sua execução uma vez que as eleições aconteçam, impulsionadas pelas novas tecnologias e pelo crescente impacto das redes (sociais, virtuais) sobre a opinião pública.

Para dar Match e Escolher um Candidato

Um exemplo no Rio de Janeiro é o Rio por Inteiro, movimento suprapartidário capitaneado pela Casa Fluminense e a Fundação Cidadania Inteligente para aumentar a participação dos cidadãos no processo eleitoral, incentivar a transparência e promover o controle social das gestões, com o objetivo final de ampliar oportunidades e reduzir desigualdades. Além de reunir propostas de diferentes organizações da sociedade civil em eixos temáticos como redução da violência, geração de emprego e renda, e acesso a serviços básicos, incluindo saneamento, saúde e educação (que compõem a Agenda Rio 2030), o movimento lançou uma plataforma digital na qual candidatos a governador, deputado federal e estadual, e senador pelo Rio de Janeiro podem se comprometer com as propostas cadastradas por organizações e apoiadas por cidadãos. Simultaneamente, o usuário irá priorizar as propostas da plataforma, de forma que dará “match” com o candidato que demonstrou mais afinidade no comprometimento com as propostas priorizadas por ele. No momento de publicação dessa matéria já eram mais de 200 propostas cidadãs, mais de 90 organizações fazendo propostas, 120 candidatos comprometidos com as propostas e quase 900 indivíduos cadastrados. Após as eleições, a plataforma continuará disponível de forma que as pessoas possam verificar com quais propostas os candidatos eleitos comprometeram-se e monitorar sua execução.

Outra plataforma de combinação é a TemMeuVoto.com, que opera a nível nacional para os candidatos a deputado estadual, deputado federal e senador. Diferentemente da Rio por Inteiro, a combinação não ocorre após o candidato se comprometer com propostas feitas pela sociedade civil, mas quando o usuário responde seis perguntas relacionadas aos ideais e programas de governo dos candidatos. As perguntas abrangem a integridade do candidato, a sua posição quanto à economia e o bem-estar social e quais são seus temas prioritários. No final, são apresentados os 10 candidatos mais alinhados com as respostas para que o usuário faça sua escolha, além de informações como partido, biografia e processos e condenações (se houver). É importante ressaltar que apenas os candidatos que se cadastram espontaneamente na plataforma são considerados nas perguntas sobre propostas e alinhamentos ideológicos, de forma que o universo do resultado final é restrito a esses cadastrados (cerca de 10% do total de candidatos). Quem está por trás da plataforma são alguns dos movimentos de renovação política já mencionados nesta série de matérias, além de iniciativas de educação política, como o Politize.

Similarmente, o VozAtiva.org também faz um matching baseado em perguntas respondidas pelo usuário, exclusivamente com candidatos a deputado federal de qualquer estado do Brasil. A diferença é que as perguntas pedem que o usuário se posicione a favor ou contra 10 afirmações por tema (meio ambiente, direitos humanos, nova economia, integridade e transparência, transversal). Também são contabilizados somente os candidatos que se cadastram na plataforma. A plataforma foi concebida por 30 organizações da sociedade civil que atuam com direitos humanos, integridade e transparência, meio ambiente, clima, e negócios de impacto para uma nova economia, como o Inesc, GIFE, Instituto Ethos, Transparência Internacional, Engajamundo e o Instituto Clima e Sociedade (ICS). Após as eleições, a plataforma ficará disponível para o monitoramento da atuação dos eleitos frente aos posicionamentos lá registrados.

Também as Calculadoras de Afinidade Eleitoral (para presidenciáveis) e Partidária (para definir as legendas que ajudem a votar em deputados e senadores) se organizam por um princípio parecido de combinação com candidatos e partidos a partir da resposta do usuário a questões sobre temas como educação, segurança, proteção social, economia, energia e democracia. Já o Quem me Representa? calcula a afinidade do usuário também em relação aos presidenciáveis e partidos, além de aos deputados federais em exercício a partir das respostas a uma lista única de perguntas. Finalmente, o PolitiQuem é uma plataforma colaborativa que permite visualizar e comparar o posicionamento dos candidatos acerca dos temas de política de drogas, direitos LGBTI, reforma trabalhista, legalidade do aborto e porte de armas para orientar a escolha do candidato à presidência.

Por Mais Representatividade

#MeRepresenta reúne candidatos de todos os partidos e a todos os cargos comprometidos com pautas de grupos politicamente marginalizados, como LGBTQ+, negros, mulheres e periféricos. A plataforma permite que o usuário filtre todos os candidatos cadastrados por estado, por partido, por raça, por gênero e por pauta. Essa última inclui a desmilitarização da polícia, a defesa de desapropriações para fins sociais, ações afirmativas raciais e cota para mulheres no legislativo e combate à violência contra a mulher. O objetivo é aproximar esses grupos da política e eleger candidatos comprometidos com essas causas e com o fortalecimento de uma democracia transparente e participativa. A plataforma já funcionou em 2016 para ajudar na escolha de candidatos a vereador em todo o país, atingindo 1 milhão de visualizações e 150.000 usuários. Nessas eleições, o #MeRepresenta também buscará combater o discurso de ódio e discriminatório praticado por candidatos, assim como as práticas dos partidos de se valerem de candidaturas não reais de mulheres, especialmente de mulheres negras, de baixa renda e escolaridade, para preenchimento de quota. Dentre as organizações envolvidas estão a Blogueiras Negras, a Fundação Cidadania Inteligente, a Rede Feminista de Juristas (DeFEMde) e a #VoteLGBT.

Mapa das Minas, por sua vez, reúne candidaturas femininas no Rio de Janeiro, exibidas em um mapa por cargo, município e região da cidade, sendo possível filtrá-las ainda de acordo com uma série de pautas feministas e partido político. Outro exemplo é a plataforma Mulheres Negras Decidem, da rede Ummuna, uma rede de mulheres negras que querem discutir política institucional e engajar-se no debate eleitoral. Umunna significa irmandade em igbo, língua falada na Nigéria, território de origem de grandes proporções das pessoas historicamente escravizadas trazidas ao Brasil. Por meio de sua plataforma, elas estão produzindo e divulgando dados sobre as candidaturas de mulheres negras, como proporção de financiamento que recebem (2,5%) e chances de serem eleitas (1,6%) e desconstruindo mitos relacionados à mulheres negras e política, como “mulher negra só ganha eleição com votos de regiões de elite branca” e “mulheres negras não têm formação para ocuparem cargos de poder”, de forma a incentivar a participação desse segmento da população no debate político e na política institucional.

Para Investigar seu Candidato

A plataforma Publique-se, por sua vez, uma iniciativa da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), permite buscar o nome de um candidato em centenas de milhares de ações do Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), não somente aquelas em que ele é réu ou investigado, mas todas as citações ao seu nome nos documentos em questão, de forma a informar eleitores em geral e jornalistas sobre a conduta dos candidatos.

A plataforma Candidaturas Hereditárias, por sua vez, permite que o usuário visualize quais as famílias que têm dois ou mais membros na política, de forma a denunciar a falta de renovação e diversidade na política. Segundo a plataforma, já passaram, só na Câmara dos Deputados, mais de 300 deputados que tinham membros da família que ocuparam outros cargos eletivos. É o caso de Marco Antônio Cabral, filho de Sérgio Cabral (ex-governador do Rio) e primo de Aécio Neves (senador por Minas Gerais) e Francisco Dornelles (vice-governador do Rio), sobrinho-neto de Tancredo Neves (ex-presidente), e que busca a reeleição como deputado federal no Rio.

Já o aplicativo Detector de Ficha de Político, do Instituto Reclame Aqui (que possui uma conhecida plataforma de reivindicações de consumidores), faz reconhecimento facial a partir de fotos (de panfletos, santinhos, comerciais de TV, comícios ao vivo, etc.) para detectar os processos criminais, ações de improbidade administrativa e inquéritos que o político em questão responde na justiça. A Reclame Aqui também lançou o plugin Vigie Aqui, que ao ser instalado destaca, em roxo, os nomes de políticos que já ocuparam cargos eletivos com pendências na justiça em qualquer site que o usuário navegue. Passando o mouse por cima do nome, é possível ver a ficha judicial do político. Em sua abrangência atual, os projetos cobrem o atual presidente e os ex-presidentes e senadores, deputados federais e governadores em exercício, de forma que não podem ser utilizados ainda para todos os candidatos das eleições 2018.

Para Checar Fatos e Combater Fake News

Temos finalmente a checagem de fatos, já tratada na primeira matéria dessa série, que se vale da rapidez e disponibilidade de informações online para checar informações duvidosas e dados divulgados por candidatos de forma quase simultânea. Além da Agência Lupa, o site Aos Fatos, o Detector de Mentiras do Meu Rio, e o Truco da Agência Pública, já atuantes desde as eleições de 2016 e já mencionados em matéria anterior, temos o Projeto Comprova, de uma rede de parceiros da grande mídia e do próprio Aos Fatos, além de canais de checagem específicos de certos veículos que não estão restritos a fatos e discursos políticos, mas qualquer notícia viral na internet, como o Fato ou Fake do G1, o É isso mesmo? do O Globo e o Uol Confere.

Ainda nesse sentido, destacam-se duas iniciativas altamente inovadoras. A primeira é o #TiraTeimaSobreDrogas, um mecanismo de checagem do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) em parceria com o Laboratório de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (Leipsi) para checar especificamente declarações de presidenciáveis no tema de política de drogas. O segundo, o Checazap, trata-se de uma checagem de fatos específica para conteúdos disseminados em grupos de WhatsApp proposta pelo laboratório de jornalismo de dados Data_Labe e a escola de jornalismo Énois. A checagem de fatos no aplicativo é realizada por jovens de periferias do Rio e de São Paulo e é essencialmente e frequentemente mais desafiadora que a checagem em outras plataformas devido ao caráter não público dos conteúdos, que são repassados em grupos exclusivos, e pela velocidade de disseminação, especialmente em grupos profissionais e familiares. O resultado da checagem é distribuído semanalmente no WhatsApp para os inscritos, além de na CBN e no HuffPost Brasil.

Há também a Sala de Democracia Digital – #observa2018, uma iniciativa da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV, que monitora a corrida eleitoral, incluindo o debate público e o impacto das notícias falsas nas redes sociais durante essas eleições, produzindo análises que vão desde medir o fluxo de menções aos candidatos nas redes em tempo real até quantas dessas menções são feitas por robôs automatizados e quais as informações difundidas são falsas.

Você Na Mira, por sua vez, é um plugin que permite que o usuário veja que campanhas estão direcionando propagandas políticas para ela ou ele no Facebook (o que passou a ser regulamentado e permitido nas novas regras eleitorais, desde que feito pelo perfil do candidato ou do partido), como publicações impulsionadas, e quais são os interesses do usuário que motivam esse direcionamento, com o objetivo de conferir transparência a essas táticas de campanha e o impacto das redes sociais nas eleições.

Finalmente, a iniciativa Eleição sem Truque, da Rede de Justiça Criminal, visa compartilhar com os eleitores informações qualificadas sobre pautas de segurança e justiça e possui um mecanismo de envio automático de perguntas sobre esses temas aos candidatos selecionados pelo usuário, de forma que os eleitores desenvolvam uma percepção crítica acerca das promessas muitas vezes inatingíveis feitas pelos candidatos e escolham melhor o seu voto.

Mapa de interações sem robôs sobre os presidenciáveis. 6.530.435 retuítes. Data de análise: 05.set a 11.set. Fonte: DAPP FGV

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