MPF recorre de decisão que rejeitou denúncia contra médico legista por falsificação de documento na época da Ditadura Militar

Crime de falsificação foi praticado com objetivo de ocultar assassinato cometido por outros militares

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou recurso à 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Araguaína (TO), na qual requer a reforma da decisão que rejeitou denúncia apresentada contra o médico militar reformado Manoel Fabiano Cardoso da Costa. O objetivo é que a denúncia, oferecida em junho de 2018, seja aceita, e que o processo penal contra ele prossiga.

O médico militar foi denunciado por falsidade ideológica em documento público, cometido com o fim de assegurar a ocultação de crime de homicídio e a impunidade de seus autores. A denúncia foi rejeitada no mês passado pela Justiça Federal sob a justificativa de que o crime – ocorrido em 1972, no contexto da denominada Guerrilha do Araguaia – seria caracterizado como crime conexo a crime político, e por isso estaria anistiado e prescrito, não podendo gerar a responsabilização de seu autor.

Entretanto, para o MPF, o crime foi comprovadamente praticado em contexto de ataque sistemático e generalizado contra dissidentes políticos e a população civil da região do Araguaia, com o objetivo de assegurar a manutenção do poder usurpado em 1964 por meio da violência, o que caracteriza prática de delito qualificado como crime contra a humanidade, portanto não passível de incidência de anistia ou prescrição.

O MPF ressalta que a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem reiteradamente afirmado que torturas, execuções sumárias, desaparecimentos forçados e outros atos delituosos cometidos por agentes de Estado no âmbito da repressão política constituem graves violações a direitos humanos “as quais excluem a validade de interpretações jurídicas que assegurem a impunidade de tais violações”. Além disso, mesmo na época do fato, tal conduta já constituía crime de lesa-humanidade, motivo pelo qual não está protegida por regras domésticas de anistia e prescrição.

O reconhecimento de um crime contra a humanidade implica adoção de regime jurídico imune à Lei da Anistia, “um elemento importante para prevenir esses crimes e proteger os direitos humanos e as liberdades fundamentais, e para promover a confiança, estimular a cooperação entre os povos e contribuir para a paz e a segurança internacionais”, segundo Assembleia Geral da ONU.

Entenda o caso – Em maio de 1972, os militares Carlos Teixeira Marra e Manoel Barbosa Abreu, em contexto de ataque sistemático e generalizado contra dissidentes políticos e a população civil da região do Araguaia, prenderam o barqueiro Lourival Moura Paulino e, com o objetivo de extrair dele confissões sobre inimigos políticos do governo militar, o torturaram e o impediram de receber visitas ou de se comunicar com familiares.

Na madrugada entre os dias 21 e 22 de maio do mesmo ano, Lourival Moura Paulino foi encontrado morto em sua cela. Supostamente ele teria cometido suicídio, versão atestada em laudo pelo médico militar Manoel Fabiano Cardoso. A investigação conduzida pelo MPF, contudo, colheu diversos elementos de prova que demonstram que Paulino morreu em decorrência de torturas sofridas após sua prisão.

Com o objetivo de ocultar o crime de homicídio praticado por Carlos Teixeira Marra e Manoel Barbosa Abreu, o médico legista Manoel Fabiano Cardoso assinou laudo confirmando que a causa da morte de Paulino foi “asfixia causada por suicídio”, omitindo do documento o registro dos sinais de tortura presentes no corpo da vítima.

Crime de homicídio – Segundo a investigação realizada pelo MPF, os responsáveis pela morte de Lourival Moura Paulino foram Carlos Teixeira Marra e Manoel Barbosa Abreu, ambos falecidos, razão pela qual o MPF requereu a declaração da extinção da punibilidade dos supostos autores.

Íntegra do recurso

Para saber mais:

MPF lança publicação com detalhamento de ações penais de crimes cometidos durante a ditadura

Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República no Tocantins

Arte: Secom/PGR

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