A expressão proibida

Governo quer abolir expressão que ajuda a humanizar os partos, ao caracterizar (e inibir) práticas agressivas e preconceituosas. Leia também: um milhão de espécies em risco; Brasília bloqueia projetos de combate no MA e CE

Por Raquel Torres e Maíra Mathias, em Outra Saúde

A EXPRESSÃO PROIBIDA

O Ministério da Saúde emitiu um despacho na sexta-feira em que afirma que vai abolir o uso da expressão “violência obstétrica”. Cada vez mais usada em todo o mundo, ela se popularizou nos últimos anos e nomeia uma série de violências sofridas pelas mulheres durante o parto, desde insultos verbais até procedimentos dolorosos (desnecessários) e más indicações de cesariana. 

Segundo a pasta, é um termo que “tem conotação inadequada” e “prejudica a busca do cuidado humanizado no continuum gestação-parto-puerpério”. Nem com muito esforço conseguimos alcançar de que maneira o uso dessa expressão prejudicaria a busca do cuidado humanizado. Ao contrário: “Essa discussão fez muitos médicos repensarem procedimentos para não serem processados”, afirma a obstetra Débora Rosa, professora da UFRJ’”, no Uol.

A pesquisa Nascer no Brasil, da Fiocruz, mostrou que 53,5% das entrevistadas que tiveram parto normal passaram por episiotomia (um corte entre a vagina e o ânus feito desnecessária e indiscriminadamente), enquanto 36% passaram por manobra de Kristeller (quando o profissional de saúde empurra a barriga para fazer o bebê sair – algo totalmente contraindicado e que ainda pode causar danos graves, como a quebra de costelas). Os dados são lembrados pela Folha. A  matéria diz também que as campanhas pelo parto humanizado têm sido abraçadas pelo Ministério da Saúde. e cita um texto do blog da pasta, de 2017, sobre violência obstétrica. Mas não menciona o governo Dilma Rousseff, que desde o começo deu especial atenção à questão. 

Tanto à Folha como ao Uol, o Ministério disse em nota que o despacho atendeu ao “apelo de entidades médicas” – o que é em si preocupante, já que não é exatamente isso o que deveria pautar documentos, ações e políticas públicas. Sabemos há tempos que Mandetta era o nome preferido dessas entidades para assumir o ministério. Mas quem não acompanha de perto os movimentos pela humanização do parto talvez não saiba o quanto há anos existe uma posição de enfrentamento da categoria médica em relação a esses movimentos. Afinal, as melhores evidências têm mostrado que, em gestações de baixo risco, os partos têm desfechos melhores quando são realizados fora do ambiente hospitalar, em locais como centros de parto normal, e acompanhados por outros profissionais, como enfermeiras. 

Recentemente contamos aqui quando o Conselho Regional de Medicina do Rio proibiu os profissionais do estado de aderirem ao plano de parto das gestantes; a Folha lembra também que o Conselho Federal de Medicina já havia recomendado o fim do uso da expressão “violência obstétrica” num documento segundo o qual ela teria “se voltado em desfavor da nossa especialidade, impregnada de uma agressividade que beira a histeria”.

UMA BOA NOTÍCIA

A Procuradoria-Geral da República entrou com pedido no STF que pode beneficiar um conjunto de adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em regime provisório. Se aprovado, menores grávidas, que tenham filhos ou sejam únicas cuidadoras de pessoas com deficiência poderão aguardar em casa o julgamento. O pedido também prevê para que se aguarde até a decisão em segunda instância. O relator é o ministro Ricardo Lewandowski, que integra a Segunda Turma, a mesma que decidiu no ano passado pelo benefício da prisão domiciliar às mulheres adultas gestantes ou mães de crianças menores de 12 anos.

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