TJ-SP ignora Defensoria e mantém reintegração de posse em ocupação de indígenas

Os guarani ocuparam a área para impedir ação de construtora que quer fazer 5 prédios no Pico do Jaraguá

Caroline Oliveira, Brasil de Fato

A juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo, Maria Cláudia Bedotti, sustentou a sua posição e manteve a liminar de reintegração de posse de uma área da construtora Tenda Negócios Imobiliário, vizinha à Terra Indígena (TI) do Jaraguá, que está ocupada por guaranis desde o dia 30 de janeiro deste ano. A decisão da juíza vai contra a Defensoria Pública da União (DPU), em São Paulo, que havia solicitado a suspensão da reintegração nesta quinta-feira (6)

“A gente fez um pedido para a juíza voltar atrás, assim como a DPU e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo. E ela manteve a decisão de reintegração de posse, mas ela não é a única nem a última pessoa a decidir. A gente entrou com recurso no tribunal”, afirmou  André Dallagnol, um dos advogados que atua na defesa da comunidade indígena. 

A construtora Tenda Negócios Imobiliários, proprietária do território, pediu a reintegração nesta terça-feira (4), que foi aceita no mesmo dia pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. A ação estava prevista para acontecer ainda essa semana. Até o momento, no entanto, os indígenas afirmaram que tudo segue normalmente, mas em clima de apreensão

“Nosso trabalho está muito focado em tirar a ação das mãos dessa juíza e evitar a reintegração de posse. Mas também questionar o licenciamento ambiental e falta de participação das comunidades nas decisões.” 

Defensoria Pública da União

Segundo o artigo 109 da Constituição Federal, compete aos juízes federais processar e julgar “a disputa sobre direitos indígenas”. Foi com esse fundamento que, no pedido de anulação da ação, o defensor regional de Direitos Humanos, João Paulo Dorini, afirmou que o órgão estadual não tem competência para analisar o pedido da incorporadora, uma vez que questões indígenas devem ser tratadas diretamente no âmbito federal.

O defensor também citou o artigo 63 do Estatuto do Índio, que garante que “nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse” de Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio”, o que não foi respeitado pelo tribunal paulista. 

Para Dorini, “trata-se de típica disputa que envolve direito indígena”. “Estamos lutando para que isso [a reintegração de posse] não ocorra antes de conseguirmos a revogação da liminar”, afirmou o defensor. 

A Tenda é responsável pelo desmatamento de árvores na região para a construção do condomínio Jaraguá-Carinás, com cinco torres e 396 apartamentos, para cerca de 800 moradores, a oito metros da aldeia Tekoa Ytu –  única das seis aldeias da região que está na fase final do processo de demarcação da terra indígena. As outras cinco tem a originalidade indígena reconhecida por uma portaria interministerial. 

Desmatamento

Pelo fato da construção estar a menos de oito quilômetros de uma terra indígena, os responsáveis pelo empreendimento deveriam levar em conta o componente indígena no processo de licenciamento, como garante a Portaria Interministerial 60, de 2015.

A consulta prévia aos povos também é assegurada por normas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.

A área também é protegida por ser considerada parte da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), desde 1994, abrigando um dos últimos pontos de Mata Atlântica da região.

Edição: Leandro Melito

Imagem: Indígenas já ocupam a área há uma semana – José Eduardo Bernardes

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

16 + quatro =