Rio dos Macacos: MPF cobra ao Incra celeridade na conclusão da titulação de terras quilombolas

Títulos que conferem 97,8 hectares à comunidade foram expedidos em dezembro de 2019 e ainda não foram enviados à Bahia para assinatura pelos quilombolas

Ministério Público Federal na Bahia

O Ministério Público Federal (MPF) cobrou ao presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) informações a respeito do envio, à Bahia, dos títulos que conferem terras à Associação dos Remanescentes de Quilombo Rio dos Macacos. Os títulos, expedidos em 24 de dezembro do ano passado, precisam ser encaminhados à superintendência do Incra no estado, para que os representantes dos quilombolas possam assiná-los, e para que o território – de 97,8 hectares antes em nome da União – tenha o devido registro em cartório, possibilitando que a comunidade tenha acesso a políticas públicas que conferem direitos básicos, como moradia e saneamento básico.

Existente há mais de 200 anos, a comunidade quilombola Rio dos Macacos enfrenta um conflito com a Marinha do Brasil há cerca de 47 anos, quando o local onde a comunidade está instalada foi escolhido para a construção da Vila Naval de Aratu, no município de Simões Filho (BA). A emissão dos títulos em nome dos quilombolas atende a decisão judicial concedida a partir de ação movida pelo MPF e pela Defensoria Pública da União em 2014. Antes da atuação dos órgãos, o processo de demarcação das terras tradicionais estava parado no Incra desde 2012, um ano após seu início.

Sem a propriedade legal das terras, com o devido registro em cartório, a comunidade não consegue ser beneficiada por programas públicos que permitem o acesso à água encanada, esgotamento sanitário, construção de moradias populares e até de estradas que permitam aos moradores o direito de ir e vir de suas casas com segurança.

O ofício do MPF, assinado em 11 de junho pelo procurador da República Leandro Bastos Nunes, foi enviado no mesmo dia ao presidente do Incra e solicita informações sobre o envio dos títulos à superintendência do órgão na Bahia, no prazo de 30 dias.

Confira a íntegra do ofício.

Histórico do caso – Desde 2011, o MPF conduz o Inquérito Civil nº 1.14.000.000833/2011-91, que acompanha a situação de conflito vivenciada pela Comunidade Quilombola Rio dos Macacos, que alegou, em diversas ocasiões, ser alvo de ações de coação na intenção de expulsar as famílias residentes no local. Ainda em 2011, o MPF já havia proposto ação civil pública pedindo que a Justiça determinasse a permanência da comunidade no local.

Em junho de 2012, o órgão expediu uma recomendação ao Comando do 2º Distrito Naval da Marinha do Brasil, visando a coibição de prática de atos de constrangimento físico e moral contra os quilombolas. O conflito ganhou ainda mais força após a decisão da Justiça Federal na Bahia que determinou a desocupação de área pela comunidade quilombola, em agosto de 2012. O MPF recorreu apresentando agravo de instrumento perante o Tribunal Regional Federal da Primeira Região contra a decisão.

O MPF realizou a primeira audiência pública sobre o tema em outubro de 2013, buscando intermediar o conflito de terras entre a União e a comunidade. No mesmo mês, o MPF recomendou ao Incra a publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do território, visando dar celeridade ao processo de reconhecimento da comunidade e possibilitando a resolução do conflito pelo território.

Em janeiro de 2014, o MPF expediu nova recomendação à Marinha, na intenção da remoção dos militares supostamente envolvidos em casos de agressão relatados ao órgão. Em maio de 2014, o MPF e a Defensoria Pública da União na Bahia (DPU/BA) ajuizaram ação conjunta contra o Incra buscando a publicação do RTID. No mês seguinte, a liminar foi concedida pela Justiça Federal.

Em agosto de 2014, foi publicado no Diário Oficial da União, pelo Incra, o RTID, identificando 301,3695 hectares de terra quilombola, e regularizando uma área de 104,8787 hectares para a comunidade. Segundo o Incra, “a delimitação se deu pela necessidade de assegurar a regularização das terras quilombolas e também a manutenção de áreas necessárias à segurança nacional (acesse, pelo link, a notícia do Incra)”.

Em 8 de fevereiro último, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu manter o decreto presidencial que regulamentou, em 2003, que a demarcação de terras de comunidades quilombolas é constitucional (acesse, pelo link, a notícia da Empresa Brasil de Comunicação). Após 14 anos de tramitação, os ministros mantiveram as regras de autodeterminação, pelo qual a própria comunidade determina quem são e onde estão os quilombolas, além do direito à posse das terras que eram ocupadas no momento da promulgação da Constituição. O Decreto 4.887/2003 dispõe sobre os procedimentos para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades de quilombos.

Ainda em fevereiro de 2018, o MPF e a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão – câmara do MPF que trata de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais – realizaram no dia 28 audiência pública em Salvador. Na reunião foram discutidas a situação territorial da comunidade, o acesso à área e às águas do Rio dos Macacos, além de encaminhamentos necessários para a titulação do território quilombola.

Em 21 de outubro de 2019, a Justiça Federal confirmou decisão liminar sobre demarcação e titulação das terras da comunidade remanescente de quilombos de Rio dos Macacos, determinando que o Incra concluísse o procedimento de demarcação e titulação das terras no prazo máximo de 540 dias.

Foto: Fernando Vivas | Ag. A TARDE

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