Deputado foi morto em 1971. Seu corpo nunca foi encontrado. MPF denunciou cinco militares pelo crime
Por Vitor Nuzzi, da RBA
O Ministério Público Federal (MPF) quer reencaminhar ao Supremo Tribunal Federal (STF) o caso do ex-deputado Rubens Paiva, desaparecido em 1971. A ação reabre debate sobre a Lei da Anistia (6.683, de 1979). Segundo a subprocuradora Samantha Dobrowolski, cabe à Corte discutir se a lei é compatível com a Constituição e com normas internacionais de direitos humanos. Em 2010, o STF rejeitou pedido de revisão da Lei da Anistia. Ainda há recursos pendentes.
Em setembro do ano passado, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu embargos do MPF para reconhecer que a ocultação do cadáver do ex-deputado é “crime instantâneo de efeitos permanentes”. Mas, por outro lado, não atendeu pedido da Procuradoria para manter o processo contra os militares denunciados pelo Ministério Público. Em 2019, o colegiado trancou a ação penal, instaurada em 2014.
Cinco denunciados
O MPF no Rio de Janeiro denunciou cinco militares reformados do Exército por homicídio e ocultação do cadáver de Rubens Paiva, entre 21 e 22 de janeiro de 1971. O crime aconteceu no Destacamento de Operações de Informações (DOI) do I Exército, no bairro da Tijuca, zona norte carioca. Paiva foi levado por agentes de sua casa, no Leblon, zona sul, na presença da família. Nunca mais foi visto.
Após três anos de investigação sobre o caso envolvendo o ex-parlamentar do PTB, o Ministério Público identificou os cinco denunciados, além de nove que já haviam morrido. Assim, segundo os procuradores, “ficou provado nos autos que o Exército Brasileiro vem sonegando informações ao MPF, a respeito da participação de militares em ações da repressão ditatorial”.
Homicídio e ocultação de cadáver
Foram denunciados, então, o general José Antônio Nogueira Belham, ex-comandante do DOI, e o ex-integrante do Centro de Informações do Exército (CIE) Rubens Paim Sampaio, por homicídio triplamente qualificado. Além deles, o coronel Raymundo Ronaldo Campos e os militares Jurandyr Ochsendorf e Souza e Jacy Ochsendorf e Souza, acusados de ocultação de cadáver, fraude processual e associação criminosa armada.
Nos embargos, o MPF apontou omissão em relação à tese de que a ocultação de cadáver seria crime permanente. Dessa forma, embora o crime tenha começado em momento coberto pela Lei de Anistia (ou seja, antes de 1979), sua prática permaneceria até que o cadáver fosse encontrado.
O relator, ministro Joel Ilan Paciornik, por sua vez, sustentou que esse entendimento contraria a lei (Código Penal). Na ocultação de cadáver, a intenção seria esconder o corpo temporariamente. “Afirmar que a ação ocultar cadáver é permanente somente seria possível quando se depreendesse que o agente responsável espera, em um momento ou outro, que o objeto jurídico venha a ser encontrado”, afirmou. Confira aqui o acórdão do STJ.
Denunciou e morreu
Em 2014, o coronel reformado Paulo Malhães declarou à Comissão da Verdade que o corpo de Paiva foi jogado em um rio na região serrana fluminense. Um mês depois desse depoimento, o militar foi morto durante invasão em sua casa. Em setembro do mesmo ano, o ministro Teori Zavascki, do STF (morto em acidente em 2017), concedeu liminar para suspender a ação penal. O mérito não foi julgado. O caso foi também para o STJ, com liminar indeferida em 2015 e mérito julgado em 209, com o trancamento da ação.
“As sucessivas condenações sofridas pelo Brasil e por outros países na Corte Interamericana de Direitos Humanos em função da incompatibilidade existente entre suas Leis de Anistia e a persecução de crimes de lesa-humanidade, que, conforme a Ordem jurídica internacional, são imprescritíveis e insuscetíveis de anistia, demonstram a urgência de a Suprema Corte revisitar o tema, que diz respeito diretamente à incompatibilidade entre a Lei de Anistia e o bloco de constitucionalidade do ordenamento jurídico brasileiro”, diz a subprocuradora-geral da República, conforme o jornal O Globo.
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Imagem: Ex-deputado foi levado de sua casa, em 1971. Morreu sob tortura – Reprodução