Somos maioria. Por Ângelo Oliveira


¿Qué pasaría si un día despertamos
dándonos cuenta de que somos mayoría?
(Mário Benedetti)

Estou cada vez mais certo de que o processo de alienação dos explorados é o que mantém a estrutura capitalista. Objetivamente, não há como explicar a luta pela permanência das desigualdades que vêm afligindo de forma tão violenta trabalhadoras e trabalhadores. Diante da conjuntura que nos assola é válido indagar: como os altos preços dos alimentos, do gás de cozinha, da conta de luz, combustível, entre outros, não são suficientes para causar indignação por parte de muitos que estão sofrendo esses impactos?

Para construirmos uma resposta é necessário, pois, distinguirmos dois grupos que sintetizam modos distintos de compreender e de se relacionar com essa mesma realidade. De um lado, temos aqueles vitimados por todas essas contradições e desigualdades oriundas dessa sociabilidade parasita. De outro, vemos os que têm no próprio abismo social a condição para a manutenção de um lugar de suposto privilégio. Ambos, embora trabalhadores, não possuem os meios de produção, mas se diferenciam pelo modo como acessam às condições objetivas de sobrevivência e, sobretudo, pelos hábitos de consumo.

É necessário compreender que a percepção das desigualdades não ocorre de modo espontâneo. Isto porque, a realidade não se apresenta como ela é em sua totalidade. A realidade é constituída por dois polos contraditórios, a saber, essência e aparência. A aparência vem a ser uma espécie de cortina que encobre a essência. 

Desse modo, o desvelamento da realidade predispõe instrumentos, sobretudo, de natureza simbólica, que possibilitem ao sujeito uma interpretação mais fidedigna da realidade. Por isso, é necessário ofertarmos tais instrumentos ao grupo dos trabalhadores por meio de processos educativos emancipatórios. 

O desafio é oferecermos uma educação que dialogue com a visão de mundo dos trabalhadores para que consigam fazer a relação entre a vivência de opressão que eles já conhecem e o sistema que tem nessa mesma exploração o motor para o acúmulo e concentração de riquezas por parte de uma minoria.

Não podemos jamais cair na armadilha de entender nossos companheiros(as) trabalhadores(as) como inimigos(as). Quem nos traiu foi a burguesia, que teve nos braços dos(as) trabalhadores(as) livres a força para revolucionar uma estrutura de poder e assumir o controle dos meios de produção fazendo de homens, mulheres e crianças meros recursos para o acúmulo de riquezas. E segue a se valer diuturnamente do nosso trabalho para garantir essa ordem injusta e desigual.

Portanto, não percamos a esperança do despertar daqueles que já vivem experiencialmente o tormento da exploração. Não percamos de vista aquilo nos provocou Mário Benedetti no poema “Que pasaría?”. Pois, quando nos dermos conta de que somos bem mais e de que há alternativa para além do capital, inverteremos a ordem rumo ao usufruto igualitariamente do resultado do nosso trabalho. Afinal, o conjunto das mulheres e dos homens já conseguiu produzir recursos para que todos, indistintamente, possam ter suas condições básicas de sobrevivência garantidas. A miséria e a pauperização nos informam a todo instante que há algo de errado no modo de produção da vida imposto pelo paradigma social em vigência.

Ângelo Oliveira é professor do IFCE, Campus Quixadá.

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