Apoiadores da causa indígena fizeram mutirão de solidariedade aos Guarani e Kaiowá do entorno da reserva de Dourados; ato ocorre após série de violências sofridas recentemente pelos povos na região
POR MARINA OLIVEIRA, DA ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO CIMI
Situada em um contexto histórico de violência, a reserva indígena de Dourados, onde cerca de 20 mil indígenas vivem confinados em apenas 3,4 mil hectares, é constantemente ameaçada por um “pacote de maldades”: desmatamento, queimadas, expropriação dos territórios tradicionais, monocultura, uso de agrotóxicos e usurpação dos bens comuns, como a água.
Os altos índices de violência contra indígenas dentro e no entorno da reserva são parte deste grave contexto, exemplificado pelo que ocorreu no início de setembro na tekoha Avaété, quando ao menos três casas do povo Guarani Kaiowá foram queimadas por seguranças privados de fazendeiros.
No último ataque, que ocorreu em plena luz do dia, os seguranças atearam fogo à casa de uma família e também fizeram disparos com arma de fogo. De acordo com relatos dos indígenas, os ataques nas áreas são constantes e foram intensificados no começo do mês.
Além de reivindicar as áreas retomadas no entorno da reserva como parte de seu território de ocupação tradicional, os indígenas denunciam a apropriação privada de partes da reserva, que passou por sucessivas reduções desde sua criação, no início do século XX.
Outro instrumento de ataque utilizado pelos fazendeiros contra as retomadas da região é um trator blindado e modificado com chapas de metal, mais conhecido como “caveirão”. Eles são conduzidos para derrubar os barracos das retomadas e para atacar os indígenas – além de servir, segundo relatos das lideranças, como plataforma de tiro contra os Guarani e Kaiowá.
Falta de água
A falta de água também é um problema crônico da reserva de Dourados. De acordo com indígenas que habitam a área, a situação foi agravada após a construção de dois reservatórios com capacidade de 3 milhões de litros de água tratada, da empresa de saneamento de Mato Grosso do Sul, a SANESUL. Além disso, eles denunciam a seca dos poços, o que impacta diretamente na vida das comunidades.
Ato de solidariedade
No último final de semana, no dia 18 de setembro, entidades, movimentos sociais, universidades e apoiadores ligados aos direitos humanos e à luta campesina doaram mudas, alimentos e sementes aos povos como um gesto de solidariedade aos povos após os constantes ataques.
Durante as atividades, estiveram presentes também representantes das comunidades de Aratikuty, Nhu Verá, Nhu Verá Guasu e Avaeté. As famílias receberam mudas de árvores frutíferas e sementes alimentícias, como milho, feijão, arroz e hortaliça.
Em nota, a aliança social formada por organizações pró-indígenas e apoiadores da causa afirmou “seguir firme no apoio decidido e comprometido com a vida e os direitos dos povos indígenas”. As organizações reforçaram, ainda, que todo e qualquer ato contra essas comunidades será um ato contra “elas e suas organizações”.
A nota foi assinada pela comunidade Aty Guasu – Grande Assembleia Kaiowá e Guarani; pela Retomada da Aty Jovem Guarani e Kaiowá – RAJ; pela Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB, a Central Única dos (as) Trabalhadores (as) – CUT- MS; pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI; pela Comissão Pastoral da Terra – CPT; pelo Comitê de Defesa Popular; pela Faculdade Intercultural Indígena – FAIND; pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MS; pelo Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA; pelo Movimento Popular de Mulheres de Dourados; e pela Kunangue Aty Guasu – Grande Assembleia Das Mulheres Kaiowa e Guarani.
Confira a nota:
FRENTE AOS ATAQUES AOS INDÍGENAS DE DOURADOS: MUTIRÃO DE SOLIDARIEDADE E PLANTIO DE ÁRVORES, SEMENTES E ALIMENTOS!
Em resposta aos ataques sofridos pelas comunidades indígenas situadas no entorno da Reservas indígena de Dourados/MS, entidades, movimentos sociais, universidades e apoiadores ligados aos direitos humanos e a luta campesina, pela desconcentração da terra no estado de MS. Realizaram no dia 18 de setembro o primeiro mutirão de solidariedade com plantio, distribuição de sementes e alimentos na comunidade Aratikuty. Estavam presentes também representantes das comunidades vizinhas de Nhu verá, Nhu verá Guasu e Avaeté.
Realizado no início da semana do meio ambiente, o ato tem por objetivo fortalecer a aliança entre as entidades e autoridades em defesa destas comunidades e denunciar todas as violações sofridas pelos povos indígenas e a Mãe Terra. Ambos estão sendo diretamente afetados com o “pacote de maldades” que inclui: expropriação dos territórios tradicionais, desmatamento, queimadas, modelos de produção exploratório do agronegócio (monocultura e uso de agrotóxicos), além da usurpação dos bens comuns como a água.
A falta d’água é um problema crônico na reserva e demais áreas indígenas de Dourados. Segundo os indígenas, a situação se agravou fortemente depois da construção de 2 reservatórios com capacidade de 3 milhões de litros de água tratada, da empresa de saneamento de MS (SANESUL). Indígenas relataram a seca de poços e uma situação extremamente desigual, já que os dois reservatórios estão a alguns metros das comunidades.
Durante o ato as famílias receberam mudas de arvores frutíferas e sementes alimentícias de milho, feijão, arroz e hortaliças. Um verdadeiro gesto de solidariedade e compromisso com a vida e a biodiversidade.
A Retomada Aratikuty, está localizada em área limítrofe à Reserva Indígena de Dourados (criadas pelo SPI em 1917), entre a aldeia Bororó e o perímetro urbano da cidade. As duas aldeias Jaguapiru e Bororó somam 3.600 ha de terra e concentram uma população de aproximadamente 18 mil indígenas, configurando uma das maiores densidades demográficas indígenas do país. A morosidade nas demarcações das terras indígenas de MS, resultam no aumento substancial das áreas retomadas pelas famílias Kaiowá e Guarani na região de Dourados.
Os constantes ataques com tiros letais, destruição e incêndio de casas (com perda de alimentos e pertences), configuram-se em tentativas de assassinatos e grave ameaça à integridade física e cultural destas comunidades. Tais como ocorreram no Tekohá Avaété que teve casas incendiada por jagunços de fazendeiros em várias ocasiões, em especial as ocorridas no último dia 06/09 em pela luz do dia. Trata-se da mesma região noticiada pelo Fantástico em sua matéria sobre os ataques aos indígenas realizados por um trator blindado, apelidado de caveirão.
A aliança social formada seguirá firme no apoio decidido e comprometido com a vida e os direitos dos povos indígenas. As organizações abaixo assinadas reforçam que todo e qualquer ato contra estas comunidades, será um ato contra nós e nossas organizações.
Marco Temporal Nunca, Demarcação Já!
Aty Guasu Guarani Kaiowá
Retomada da Aty Jovem Guarani e Kaiowá – RAJ
Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB
Central Única dos (as) Trabalhadores (as) – CUT- MS
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Comitê de Defesa Popular
Faculdade Intercultural Indígena – FAIND
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
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Em gesto de solidariedade, comunidades indígenas da reserva de Dourados recebem doações de mudas e de sementes alimentícias após sofrer ataques de violência. Foto: Cimi Regional Mato Grosso do Sul