Especialistas analisam as repercussões para o Brasil da revogação de parte da reforma trabalhista de 2012 na Espanha e traçam paralelos entre as medidas adotadas há dez anos no país ibérico e aqui, a partir da reforma trabalhista de 2017
André Antunes, EPSJV/Fiocruz
Passou raspando: foi por apenas um voto que o Congresso da Espanha referendou, no dia 3 de fevereiro, o Decreto-lei real apresentado pelo governo do presidente Pedro Sanchez, do Partido Socialista Operário Espanhol (Psoe) no final de 2021. Foram 175 votos a favor, inclusive de deputados de partidos liberais e da direita, contra 174 contra – englobando o de partidos tradicionalmente aliados aos da coalizão formada pelo Psoe e pelo Podemos, mais à esquerda.
A aprovação significa, em alguns aspectos, a volta a uma legislação trabalhista anterior a 2012. Foi naquele ano que o governo do então presidente Mariano Rajoy, do Partido Popular, de direita, apresentou um pacote de medidas de flexibilização das leis trabalhistas, sob a justificativa de combater a recessão pós-crise financeira de 2008, que catapultou a taxa de desemprego no país para mais de 20%. Quatro anos depois, a reforma espanhola serviria de inspiração para o governo do então presidente Michel Temer, que apresentou no final de 2016 um projeto de lei ao Congresso Nacional com propostas para flexibilizar a legislação trabalhista brasileira. O texto acabaria sendo profundamente modificado pelos parlamentares e aprovado em julho de 2017, tornando-se a lei 13.467, que alterou significativamente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Mas hoje, quase cinco anos após a aprovação da reforma trabalhista brasileira e uma década após a espanhola – que acaba de ser alterada pela votação apertada do Parlamento –, para muitos analistas, o diagnóstico dos impactos sobre o mercado de trabalho, sobre a economia e sobre as relações de trabalho em ambos os países é parecido: a flexibilização, tanto lá quanto aqui, não foi capaz de reduzir o desemprego nos níveis prometidos, precarizou as condições de trabalho e enfraqueceu a capacidade de negociação coletiva dos trabalhadores.
A reforma espanhola de 2012: exemplo de sucesso?
O economista Vitor Filgueiras, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e professor visitante da Universidade Complutense de Madri, explica que nas últimas quatro décadas o país ibérico vinha passando por um processo de pressões sucessivas por “reformas liberalizantes” na sua legislação trabalhista.
No caso da reforma de 2012, continua o pesquisador, as instituições da chamada Troika – formada pela Comissão Europeia, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Central Europeu – defendiam a necessidade de uma “desvalorização interna” como forma de aumentar a competitividade da Espanha frente a países como Alemanha e França dentro da zona do Euro. “É você reduzir custos, especialmente dos salários. Para que dessa forma se torne mais caro importar e mais barato exportar”, explica o economista.
Foi então implementada uma série de medidas, entre as quais o pesquisador da UFBA destaca quatro “eixos centrais”. O primeiro foi a flexibilização dos contratos temporários, que antes de 2012 só podiam ser utilizados em atividades de cunho eventual, mediante negociação coletiva. A partir da aprovação da reforma do governo Rajoy, eles passaram a poder ser empregados em qualquer atividade, com renovação de três em três meses, por no máximo dois anos. Segundo ele, o percentual de contratos temporários no conjunto do emprego, que vinha em queda no país desde 2006, volta a subir a partir de 2012, passando de 23,4% para 26,8% em 2018.
O segundo eixo, enumera Filgueiras, consiste em que, antes, ao final do prazo de vigência de um acordo coletivo, ele permanecia valendo até que uma nova negociação entre empregador e trabalhadores fosse estabelecida. A partir de 2012, isso deixou de valer. “Se você não tem a ultratividade, até que uma nova negociação seja feita, você ferra o trabalhador, porque a empresa não se sente obrigada a negociar. Com a ultratividade, toda força de negociação está com o sindicato”, afirma o economista.
A terceira mudança foi a que os acordos coletivos firmados no nível das empresas passaram a ter prevalência sobre aqueles firmados no nível dos sindicatos, mesmo que representassem perda de direitos para o trabalhador. “Na prática, é um mecanismo de flexibilização para baixo. A lógica anteriormente era outra, vigorava o princípio da prevalência da norma mais benéfica ao trabalhador. Com a reforma, isso muda”, aponta. Essa alteração incide sobre o quarto eixo da reforma, segundo Filgueiras, que foi o estímulo a terceirização, uma vez que a partir de 2012 a negociação firmada entre a empresa terceirizada e seus trabalhadores prevalece sobre a do sindicato da categoria à qual aqueles trabalhadores pertencem. Na prática, isso significou que trabalhadores contratados por uma empresa terceirizada recebiam salários menores e tinham menos direitos do que os empregados diretos de uma mesma categoria.
“É uma reforma duríssima, e ela de fato consegue a desvalorização interna. E após dois ou três anos, o desemprego aberto, que é diferente do desemprego total, começa a cair. E a reforma espanhola passa a ser considerada um exemplo de sucesso pelas instituições multilaterais”, afirma Filgueiras. Segundo ele, a taxa de desocupação aberta considera ocupados todos aqueles que tenham tido algum trabalho anterior. Já o “desemprego de fato” é melhor medido pela taxa de subutilização da força de trabalho, que é a soma dos desocupados (sem nenhum trabalho), dos que faziam “bicos” e gostariam de trabalhar mais e daqueles que gostariam de trabalhar mas não puderam ou desistiram de procurar emprego. “Sob essa métrica, do desemprego de fato, a taxa não cai”, diz Filgueiras.
No livro ‘É tudo novo, de novo’, que estava no prelo no fechamento desta reportagem, ele cita pesquisa publicada no Cambridge Journal of Economics em 2018, que aponta que a economia espanhola deixou de crescer 0,2% ao ano por conta da reforma. “O desemprego aberto cai apesar da reforma e não por causa dela”, afirma Filgueiras. “A estrutura da economia da Espanha é chamada de wage-led: quando cresce o salário cresce a economia, porque a tendência a consumir dos trabalhadores incentiva o investimento”, explica o economista. Segundo dados do estudo citado em seu livro, entre 2012 e 2018, os salários médios na Espanha foram inferiores a 2011, na contramão da lucratividade das empresas, que cresceu no período. “Todos os indicadores do mercado de trabalho espanhol se deterioram após a reforma”, destaca Filgueiras.
O que muda agora?
A reforma apresentada pelo Psoe e referendada pelo Congresso espanhol em fevereiro reverte alguns dos pontos implementados há dez anos, e é parte do acordo firmado entre o partido do presidente Pedro Sanchez com o Podemos, que permitiu que o governo tivesse maioria no parlamento. A partir de agora, a ultratividade dos contratos de trabalho volta a vigorar; os trabalhadores terceirizados passam a ter os mesmos direitos e a mesma remuneração dos trabalhadores contratados diretamente, prevalecendo as convenções coletivas dos sindicatos de maior representatividade e poder de barganha; os acordos coletivos firmados no nível dos sindicatos voltam a ter prevalência sobre aqueles firmados no nível da empresa, a menos que esses representem ganhos para os trabalhadores; já os contratos temporários ficam limitados a atividades específicas de caráter sazonal, como no comércio na época do Natal e na colheita agrícola, por no máximo 90 dias, ou excepcionalmente em outras atividades por no máximo seis meses, podendo chegar a um ano caso previsto em negociação coletiva. As empresas terão que justificar os casos de contratação temporária.
“Em tese, a melhora é substancial”, aponta o professor da UFBA. Ele ressalta, no entanto, que algumas mudanças da reforma de 2012 permaneceram. O placar apertado da votação no Congresso tem a ver com isso, segundo Filgueiras, uma vez que muitos partidos de esquerda viram como uma “quebra de acordo” o governo espanhol ter chamado, além dos sindicatos, as entidades empresariais para negociar. “Os empresários ‘bateram o pé’ nos pontos que achavam mais importantes e a reforma não foi total”. Segundo ele, alguns mecanismos de inibição de dispensa individual de trabalhadores, como a redução dos dias de indenização por demissão sem justa causa permanecem. Antes de 2012, a indenização era de 45 dias de salário por ano de serviço, até um máximo de 42 meses; após a reforma, passou a ser de 33 dias de salário por ano até um máximo de 24 meses. Além disso, mecanismos de regulação de dispensa coletiva, que exigiam a participação do Estado, que foram extintos com a reforma de 2012 não foram recriados agora. “A reforma sem dúvida melhora a situação, mas foi menos do que poderia ter sido”, diz Filgueiras.
Reflexos no Brasil
Antes mesmo da aprovação pelo Congresso, a proposta do governo espanhol repercutiu por aqui. No início de janeiro, uma nota assinada por seis das maiores centrais sindicais do Brasil saudou “os novos ventos que sopram da Espanha no mundo do trabalho”. “As mudanças que estão acontecendo na Espanha nos dão a esperança de que por aqui também possamos rever pontos de uma reforma que foi imposta sem um debate social e com um deliberado viés pró capital e antissindical”, afirma a nota, assinada pelos presidentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, União Geral dos Trabalhadores (UGT), Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST). Segundo as centrais, a reforma trabalhista de 2017 “revelou-se um desastre para a classe trabalhadora e para a nação”.
Balanço que, claro, difere do setor patronal, como da Confederação Nacional da Indústria (CNI), uma das mais mobilizadas pela aprovação da reforma trabalhista em 2017. A entidade lançou, já em 2012, o documento ‘101 propostas para modernização trabalhista’, na qual defendia que o trabalho formal no Brasil tinha um “alto grau de conflito e de insegurança jurídica”, era “excessivamente onerado” e configurava “uma barreira ao crescimento da produtividade”. A maioria das propostas apresentadas no documento acabaria no texto da lei 13.467/17, que aprovou a Reforma Trabalhista.
Em entrevista por e-mail, o presidente do Conselho de Relações de Trabalho da CNI, Alexandre Furlan, defendeu que os quase cinco anos de vigência da lei “ainda podem ser considerados um período de amadurecimento, tanto pela parte das empresas e dos trabalhadores, quanto pelo Judiciário, que passa a aplicar o novo ordenamento”. Ele destaca os “avanços na negociação coletiva” como um dos principais pontos positivos na reforma.
Furlan faz referência à chamada prevalência do negociado sobre o legislado, que significa que acordos estabelecidos entre empregadores e empregados no âmbito da empresa prevalecem sobre aqueles firmados no nível dos sindicatos. “Com isso, foi estimulado o diálogo, os trabalhadores passaram a ter maior comando na definição das suas rotinas trabalhistas e as empresas tiveram mais segurança em negociar, e, com isso, os instrumentos coletivos de trabalho passaram a incluir com maior relevância questões como a redução do tempo do intervalo para o almoço tendo, como contrapartida, por exemplo, sair mais cedo do trabalho”, diz.
A prevalência do negociado sobre o legislado foi apenas uma entre as mais de 200 alterações no arcabouço legal realizadas pela lei 13.467/17, que, como assinala Vitor Filgueiras, possui muitos pontos em comum com a reforma espanhola, mas foi muito mais ampla do que lá. No Brasil, por exemplo, a prevalência do negociado abrange até mesmo acordos estabelecidos no nível individual, entre trabalhador e empresa. Outro ponto em comum foi o fim da ultratividade dos acordos coletivos, que deixam de vigorar após dois anos.
No caso brasileiro, afirma o economista da UFBA, outras medidas aprovadas na reforma enfraqueceram os sindicatos, como o fim da obrigatoriedade da intermediação sindical na homologação das rescisões contratuais, da exigência de negociação no caso de dispensas em massa e da obrigatoriedade do imposto sindical, principal fonte de financiamento das entidades.
Além disso, a reforma abriu caminho para a terceirização generalizada da força de trabalho, antes limitada às chamadas atividades-meio das empresas, e proibida às atividades-fim. A ampliação das formas de contratação permitidas pela legislação para os trabalhadores assalariados foi outra mudança, segundo a economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Lucia Garcia. “As formas contratuais se multiplicaram dentro do assalariamento: o teletrabalho, o contrato intermitente, o trabalho autônomo, inclusive uma aberração que é trabalhador autônomo exclusivo, um autônomo sem autonomia. A reforma cumpriu um papel de apresentar um ‘cardápio’ mais amplo de contratos de trabalho, em alguns casos com nenhum direito trabalhista ou previdenciário”, diz.
O trabalho pós-reforma
Somada as medidas antissindicais, a pulverização das formas de contratação, segundo Garcia, tem contribuído para um menor poder de negociação dos trabalhadores junto aos empregadores. Reflexo disso vem sendo a piora de indicadores que medem a evolução do poder de compra dos trabalhadores do mercado formal frente aos índices de inflação desde a aprovação da reforma, monitorados pelo Dieese por meio dos reajustes salariais negociados ano a ano. Em 2021, segundo o órgão, 47,7% dos reajustes salariais negociados pelos trabalhadores ficaram abaixo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Percentual que vem crescendo: em 2018, apenas 9,3% dos reajustes ficaram abaixo do INPC, contra 74,8% de reajustes salariais com ganhos reais para os trabalhadores, ou seja, acima da inflação. No ano passado, apenas 15,8% dos reajustes representaram ganhos reais. “A inflação corrói o poder de compra dos trabalhadores e temos uma mesa de negociação fragilizada. No geral, os trabalhadores estão mais pobres e os dados sociais refletem isso, como o aumento da insegurança alimentar, por exemplo”, afirma Garcia.
Publicado no ano passado, o livro ‘O trabalho pós-reforma trabalhista (2017)’, organizado por pesquisadores do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Cesit/Unicamp) faz um panorama abrangente dos efeitos da reforma trabalhista. No artigo ‘Impactos da Reforma Trabalhista sobre o Mercado de Trabalho’, os pesquisadores do Cesit Eugenia Leone, Marilane Teixeira e Paulo Baltar argumentam que, ao contrário do que defendiam os favoráveis à reforma, ela não foi capaz de reduzir como prometido as taxas de desemprego ou frear o crescimento da informalidade no país.
Segundo os autores, a lenta retomada da atividade econômica a partir de 2017, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,32%, após quedas sucessivas em 2015 (-3,55%) e 2016 (-3,28%), não teve efeitos significativos sobre o mercado de trabalho: entre 2017 e 2019, a taxa de desemprego caiu de 11,8% para 11%. Por outro lado, a taxa de subutilização da força de trabalho continuou em patamar elevado, caindo apenas 0,5% entre 2017 e 2019, quando atingiu 23% da população economicamente ativa. A trajetória de aumento da informalidade do mercado de trabalho, que vinha em ascensão desde 2014, não foi revertida pela reforma: em 2016, 52,5% da força de trabalho tinha carteira de trabalho assinada, contra 47,5% que eram trabalhadores informais; em 2019, o percentual de informais ultrapassou o de trabalhadores com carteira assinada, chegando a 50,5% da força de trabalho. Segundo os autores do artigo, para 21 grupos ocupacionais que foram responsáveis por 4 milhões de postos de trabalho no período de “lenta recuperação” da economia, a partir de 2017, foi constatada a substituição do “emprego com vínculos e proteção social” pelo trabalho por conta própria e o emprego privado sem registro.
Justiça mais distante
Mas pelo menos um dos efeitos pretendidos pelos defensores da reforma trabalhista ganhou concretude. O entendimento deles era de que a reforma desafogaria a Justiça do Trabalho, que concentra grande parte dos processos em curso no Judiciário. O que de fato ocorreu. Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), entre 2017 e 2018 o número de processos apresentados à Justiça do Trabalho caiu 40%.
Para uns, motivo de comemoração. Alexandre Furlan, da CNI, argumenta que a queda foi fruto de um “avanço no diálogo e na redução da litigiosidade”. Para o procurador-geral do Trabalho José de Lima Ramos Pereira, a queda foi motivada pelos obstáculos criados pela lei 13.467/17 para o acesso de trabalhadores à Justiça, principalmente aqueles beneficiários da justiça gratuita, que ganham até 40% do teto de benefícios do INSS, ou cerca de R$ 2,6 mil. A partir da reforma, esses trabalhadores passaram a ter que pagar pelos honorários periciais e pelos chamados honorários advocatícios sucumbenciais, ou seja, em caso de decisão desfavorável os trabalhadores passaram a ter que pagar os custos do empregador. “A redução não foi porque o negociado sobre o legislado melhorou a questão da judicialização. Muitos trabalhadores ficaram com medo de entrar com ação”, avalia Pereira, que espera que o número de processos volte a crescer após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em outubro de 2021, de declarar que os dois artigos referentes a esse tema eram inconstitucionais. O STF entendeu, no entanto, ser constitucional artigo da lei 13.467/17 objeto da mesma ação, que diz que o trabalhador beneficiário de justiça gratuita que faltar a uma audiência terá que pagar as custas do processo.
Vários outros pontos da reforma são objeto de ações apresentadas ao STF e aguardam julgamento, cinco anos após a aprovação da lei. Entre eles, estão a constitucionalidade do contrato de trabalho intermitente – modalidade introduzida pela reforma que não prevê nem jornada mínima nem remuneração fixa aos trabalhadores, que só recebem quando demandados –, bem como a prevalência do negociado sobre o legislado. “O STF já reformou pontos da reforma trabalhista, porque muitos são inconstitucionais”, defende o procurador-geral do Trabalho. E completa: “É necessário fazer aquilo que a Espanha fez: chamar governo, empregados e empregadores, sindicatos, sociedade civil, para debater o que fazer”.
Brasil na contramão
José Dari Krein, pesquisador do Cesit/Unicamp e um dos organizadores da publicação sobre os impactos da reforma trabalhista, vem pesquisando os processos de flexibilização da legislação de vários países a partir da década de 1980. Para ele, o momento é de “contrarreação” a essas reformas, inclusive motivada pelos efeitos da pandemia de Covid-19. “Eu não sei o que vai dar, mas há sinais claros no mundo de que a teoria econômica predominante mostra sinais de esgotamento. E, do ponto de vista da reforma da proteção social, já começa a haver uma certa contraposição”, avalia, destacando, no entanto, que o Brasil vai na contramão disso. “Tudo que o governo Bolsonaro propôs só aprofunda a flexibilização”, diz Krein.
O alerta não é à toa. Reportagem recente do jornal Correio Braziliense anuncia que o governo federal, por meio do Grupo de Altos Estudos do Trabalho (GAET), vinculado ao Ministério da Economia, apresentou em fevereiro ao Conselho Nacional do Trabalho (CNT) documento descrito na matéria como uma “minirreforma trabalhista”. A proposta apresenta pontos polêmicos, como a liberação irrestrita do trabalho aos domingos, por exemplo. “O que a reforma tem feito é criar emprego precário, concentração da renda, impossibilidade de consumo para uma parcela importante das pessoas. Tem jogado as pessoas na insegurança, na precariedade. É um movimento bola de neve, você só vai piorando as coisas”, analisa Krein. Segundo ele, em nenhum outro momento da história recente do Brasil a recuperação econômica após uma grande crise econômica demorou tanto, e as pesquisas têm mostrado que a reforma trabalhista de 2017 prejudicou essa retomada. “Uma das razões é que ela reduziu o custo do trabalho e criou essa insegurança no mercado de trabalho, que afeta o nível de consumo e a disponibilidade de crédito. O balanço é muito ruim. Não tem possibilidade concreta de ela ter força de alavancar o crescimento da economia”, defende. Para ele, revogar a reforma trabalhista de 2017 é “essencial”, mas não suficiente. “Tem que ter uma intervenção pública mais incisiva na criação de empregos nos setores mais complexos, como a discussão do complexo industrial na saúde. Acho que isso tem potencial de criação de empregos numa estrutura econômica mais sofisticada, articulada com o fornecimento dos componentes hospitalares, dos fármacos, com a pesquisa, com os serviços todos que são derivados da saúde. É uma demanda premente do ponto de vista de estruturação de um futuro para o país”, argumenta o pesquisador da Unicamp.