Se tem uma coisa que o assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips no Vale do Javari e os comentários presidenciais das últimas semanas mostraram é que o poder público, que deveria zelar pelos bem-estar e segurança de seus cidadãos na Amazônia, virou as costas para a população e entregou a floresta para o crime organizado. O resultado disso é violência, abusos e ameaças contra as Comunidades Indígenas e Tradicionais, pioradas pela omissão do Estado em respeitar seus direitos.
“Eles não apenas desapareceram ou foram assassinados. Eles foram cruelmente assassinados. E é isso que a gente está escancarando para o mundo: como o Brasil trata os ativistas e as pessoas que cuidam do meio ambiente e protegem os Direitos Humanos”, comentou Txai Suruí à Agência Amazônia. “O que estamos vendo não é só um desrespeito ou uma ameaça à nossa floresta, à nossa Amazônia, mas uma ameaça a quem a defende. (…) Vemos que esses criminosos se baseiam, principalmente, na impunidade, numa certeza de que nada vai acontecer. E é verdade”.
Na mesma linha, o executivo Candido Bracher, ex-presidente do Itaú, ressaltou que o crime contra Bruno e Dom reflete a renúncia do poder público em impor a lei na Amazônia. “Você precisa cumprir a lei, criar alternativas sociais para a ocupação da população local. Tudo isso são coisas estudadas e que podem ser feitas. O que você não pode é abandonar a região”, disse Bracher em evento na semana passada, citado por O Globo. “Uma terra em que o país reconhece que não há lei, porque o Estado renunciou ao seu direito e a sua obrigação de impor a lei nessa região”.
Para os grupos indígenas do Vale do Javari e da Amazônia como um todo, o crime contra Bruno e Dom é apenas mais um em uma lista que não para de crescer. “Para a gente já virou comum. Por nós trabalharmos diretamente com a questão da proteção ambiental, era algo normal trabalhar nesse contexto”, afirmou Elisério Marujo, assessor jurídico da UNIVAJA, ao jornalista Caco Barcellos no Profissão Repórter (TV Globo). “Só que isso tem piorado bastante, em termos de violência, nos últimos três anos, correspondente ao atual governo”.
Em tempo: Bruno Abbud destacou n’O Globo uma das linhas de investigação da PF sobre os assassinatos de Bruno e Dom: a averiguação do envolvimento de traficantes de drogas e armas que operam na fronteira do Brasil com o Peru, e que também atuam no comércio de pescados ilegais na Amazônia. “Ali é a Rota do Solimões, onde a organização que tem as armas mais pesadas é o tráfico, então é natural que o tráfico domine todas as outras categorias criminosas”, explicou o delegado Alexandre Saraiva, ex-superintendente da PF no Amazonas.