Justiça aceita denúncia do MPF e torna rés seis pessoas por comentários racistas contra indígenas em rede social

Em post de Emerson Machado no Instagram foram dirigidos aos Warao insultos como “preguiçosos”, “safados”, “vagabundos” e “imundos”

Ministério Público Federal na Paraíba

A Justiça Federal na Paraíba recebeu denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra seis pessoas pelo crime de racismo, na modalidade xenofobia, por comentários em postagem na rede social Instagram contra indígenas da etnia Warao, oriundos da Venezuela. As interações foram feitas em vídeo e foto publicados no perfil @mofiparaiba, de responsabilidade de Emerson Machado. Os denunciados podem ser condenados a penas que variam de 2 a 5 anos de reclusão e ao pagamento de multa e indenização pelos danos sociais causados à coletividade. Como foram acusados por crimes raciais, não pode ser oferecida aos réus a possibilidade de fazerem acordos de não persecução penal.

Ao receber a denúncia, o Juízo citou decisão do STF que tornou crime inafiançável e imprescritível a prática do racismo praticado em redes sociais abertas. Nessa mesma decisão, a Corte Suprema definiu que o princípio da liberdade de expressão não abarca o direito de incitação ao racismo, pois um direito individual não pode servir de salvaguarda para a prática de ilícitos. “No conflito desses preceitos constitucionais, prevalecem os princípios da dignidade humana e da igualdade jurídica”, escreveu o magistrado na decisão.

Comentários criminosos – O crime ocorreu em 2020, por meio de comentários feitos em postagem do perfil @mofiparaiba de abordagem policial em uma casa habitada pelos indígenas, em João Pessoa. Por meio de um vídeo e uma foto, a publicação mostrava uma viatura da Polícia Militar em frente à casa, onde um agente interrogava um dos moradores, supostamente, por conta do excesso de barulho proveniente da residência.

Na esteira da postagem, os seis denunciados teceram comentários disseminando a intolerância, o preconceito e incitando o ódio contra os indígenas. A eles foram atribuídos os insultos de “preguiçosos”, “safados”, “vagabundos”, “imundos”, entre outros. Os comentários alegavam que os indígenas não sabiam viver em sociedade e não queriam trabalhar. Um deles chegou a insinuar que os indígenas venezuelanos deveriam ser mortos.

Para o procurador da República José Godoy Bezerra de Souza, que assina a denúncia, a disseminação de tais comentários não apenas prejudica as pessoas diretamente visadas, mas também enfraquece o tecido da sociedade como um todo, o que acaba por minar a coesão social.

Para o representante do MPF, a intolerância e o preconceito não são apenas crimes morais, mas afronta aos princípios fundamentais de igualdade e dignidade humana. “Enquanto não se punir, na forma da lei, os discursos de ódio e a xenofobia, se possibilitará o florescimento nas redes sociais, afetando não apenas as vítimas diretas, mas também a própria essência da nossa humanidade”, pondera.

Godoy salienta que as redes sociais amplificam de maneira alarmante a disseminação da xenofobia e do racismo. O procurador aponta que o perfil que publicou a postagem, por exemplo, na época, tinha em torno de 803 mil seguidores, o que gerou repercussão imensa entre a sociedade e uma enxurrada de falas carregadas de ódio contra os indígenas Warao.

Na denúncia, o procurador sustenta que não há diferenças biológicas entre os seres humanos, sendo a divisão em raças resultante de um processo meramente político-social. “Cientificamente, não existem distinções entre os homens, seja pela segmentação da pele, formato dos olhos, altura, pelos ou por quaisquer outras características físicas”, afirma.

Limites à livre expressão – O procurador da República frisa, na denúncia, que a liberdade de expressão não é uma garantia absoluta, recaindo sobre ela limites morais e jurídicos. “As liberdades públicas não são incondicionais e devem ser exercidas de forma harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal”, assevera. Um direito individual, conclui, não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas.

Pedidos – Luiz Emerson Silva Moreira Franco, Liege Costa de Freitas, Gildásio Marinho Costa, Josefa Pereira Pedrosa, Flávio Estevam de Azevedo e Cristian de Lima Machado foram denunciados pelo crime de racismo, tipificado no art. 20 da Lei 7.716/1989, pela prática de discriminação e preconceito racial contra o povo indígena da etnia Warao. O crime prevê pena de 2 a 5 anos de reclusão.

Além da pena privativa de liberdade, o órgão ministerial pede, ainda, a fixação de multa e de um valor para reparação dos danos sociais causados pela infração, considerando os prejuízos a toda coletividade.

Inquérito Policial 0800035-51.2021.4.05.8200

Arte: Secom/PGR

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