Políticos pagam campanhas nas redes e organizam caravanas para ato pró-Bolsonaro em SP

Pré-candidatos de SP às eleições deste ano e políticos de outras regiões do país bancam anúncios para ato na Paulista

Por  Bruno Fonseca, Danilo Queiroz, Matheus Santino, Rafael Custódio, Agência Pública

“Temos um encontro marcado para o dia 25 de fevereiro na Avenida Paulista.” Essa frase abre um dos muitos vídeos publicados nas redes sociais com patrocínio de políticos bolsonaristas que convocam militantes para a manifestação deste domingo em São Paulo. Na data, Jair Bolsonaro e seus aliados planejam realizar um grande protesto em defesa de si mesmos, numa tentativa de mostrar força frente às operações da Polícia Federal que investigam indícios de articulação para um golpe de Estado após as eleições de 2022.

Levantamento da Agência Pública revela que parte do alcance desses conteúdos tem sido paga por políticos bolsonaristas – que vão de aspirantes às eleições deste ano a senadores e deputados –, além de empresários e páginas de conteúdo político locais.

Segundo a Pública apurou, anúncios que convocam para a manifestação tiveram seu alcance impulsionado com valores entre R$ 2 mil e R$ 2,5 mil. Esse dinheiro rendeu até 370 mil impressões para usuários do Facebook e Instagram (o número de vezes que o anúncio apareceu em telas).

Parte dos anúncios também tem servido para organizar caravanas que tentam levar apoiadores do interior de São Paulo e até de outros estados para o protesto.
Por que isso importa?

A apuração revela que a manifestação pró-Bolsonaro em São Paulo tem sido articulada por políticos aliados do ex-presidente, inclusive com uso de dinheiro para anúncios do ato e organização de caravanas.

Políticos da base aliada de Tarcísio pagam anúncios para o ato

Dentro do gabinete de um dos principais aliados do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), está um dos políticos que têm pago anúncios para o ato bolsonarista na Paulista.

Gabriel Felipe Gonçalves de Barros, conhecido como Gabriel Felipe, colocou nas redes no dia 19 de fevereiro um anúncio para apoiadores de Bolsonaro sobre uma caravana que sai de Cubatão e vai até a Paulista no domingo. Felipe gastou entre R$ 100 e R$ 199 no post, que alcançou entre 8 mil e 9 mil pessoas.

Ele é presidente do PL em Cubatão, no litoral paulista, e assistente parlamentar no gabinete do deputado estadual Tenente Coimbra (PL) – um dos grandes apoiadores do governador na Assembleia do estado. Em dezembro, Felipe recebeu R$ 9,6 mil de salário no gabinete de Coimbra. Nas últimas eleições municipais, ele concorreu para vereador pelo Patriotas de Cubatão, mas não foi eleito.

A reportagem entrou em contato pelo número divulgado no anúncio das caravanas, que usa uma fotografia de Felipe. No telefone, foi informado que a van já estaria esgotada, mas que outras cidades da Baixada também contariam com transportes, que estariam ligados ao Tenente Coimbra. A Pública questionou o político sobre a origem do recurso para os impulsionamentos, que não respondeu até a publicação da reportagem.

Ao todo, a Pública encontrou seis cidades com caravanas anunciadas por Coimbra em suas próprias redes: além de Cubatão, Santos, São Vicente, Itanhaém, Peruíbe e Praia Grande. Em seu perfil no Instagram, Coimbra postou uma foto informando as cidades e contatos dos organizadores. Questionamos a assessoria do militar sobre a organização das caravanas e os anúncios realizados pelo seu assistente. A assessoria não respondeu até a publicação da reportagem.

Outro político que tem impulsionado convocações para a manifestação do dia 25 é o pré-candidato à prefeitura de Americana Ricardo Molina, coordenador regional do Republicanos, partido de Tarcísio. Molina é um dos responsáveis por organizar caravanas saindo de lojas da Havan de Santa Bárbara d’Oeste, cidade vizinha a Americana, no interior do estado.

O investimento foi de R$ 200 a R$ 299 em anúncios que já ultrapassam 150 mil impressões. O público-alvo das postagens são os usuários localizados em São Paulo. A reportagem tentou contato com o político por email, que ainda não respondeu.

Nos dois anúncios impulsionados exclusivamente para Instagram, o parlamentar aparece ao lado de Tarcísio, da deputada federal Carla Zambelli (PL) e do vereador Felipe Corá (PRD), de Santa Bárbara. Corá seria o responsável por organizar a caravana, segundo um número de telefone pessoal que aparece na postagem.

De acordo com biografia no site da Câmara Municipal da cidade, “Felipe esteve à frente da campanha do presidente Jair Bolsonaro na cidade e foi o organizador das carreatas ‘Fora Dória’, que levaram mais de quatro mil carros para as ruas”.

A Pública também identificou a promoção de convite para uma caravana para o ato na Paulista pelo vereador Madson Henrique (PL), de Jundiaí, também no interior de São Paulo. Ele impulsionou uma postagem com valores entre R$ 200 e R$ 299 que ficou ativa entre 16 e 20 de fevereiro. O anúncio teve um alcance entre 10 mil e 15 mil vezes para usuários do Facebook e Instagram.

Questionado pela reportagem se foram usados recursos públicos para a divulgação do anúncio, o vereador afirmou que a Câmara de Jundiaí, não dispõe de verba parlamentar, apenas o salário e um carro para eventuais saídas. Sobre ser um dos organizadores da caravana que havia publicado em seu perfil, Madson Henrique disse: “Eu apenas ajudei na divulgação da caravana, tem várias saindo daqui”.

Políticos de fora de São Paulo confirmam presença – e bancam anúncios

Segundo a Pública apurou, não são apenas os políticos do estado de São Paulo que têm pago anúncios convocando para a manifestação de 25 de fevereiro. Deputados e senadores de várias partes do país, inclusive de regiões muito distantes de São Paulo, têm gasto com propaganda para o ato e confirmado presença.

O senador pelo Acre Marcio Bittar (União Brasil) fez ao menos dois anúncios patrocinados convocando para as manifestações.

Em um deles, publicado em 19 de fevereiro, que custou de R$ 100 a R$ 199 e teve entre 15 mil e 20 mil impressões, o político aparece ao lado do também senador Rogério Marinho (PL-RN). Ambos anunciam a participação no ato e convocam os apoiadores à avenida Paulista. A postagem teve cinco vezes mais visualizações de usuários em São Paulo que no estado do senador, o Acre.

Em outro vídeo, publicado em 19 de fevereiro, o senador questiona a representação das lideranças do Partido dos Trabalhadores (PT) no Ministério Público Eleitoral (MPE), que pede investigação e impedimento de possíveis ataques antidemocráticos como o de 8 de janeiro de 2023. Na gravação, Bittar faz menção ao protesto convocado por Bolsonaro em São Paulo. A propaganda custou entre R$ 100 e 199 e teve um alcance de 10 mil a 15 mil impressões no Instagram.

Ativo nas redes sociais, Bittar nasceu em Franca, no interior de São Paulo, mas foi no Acre que ele consolidou sua carreira política, ao ser eleito deputado federal em duas oportunidades (1999 e 2011). Com 23,28% dos votos dos acrianos, ele se consagrou senador em 2018, no mesmo pleito em que Jair Bolsonaro foi eleito presidente.

Com 70 mil seguidores no Facebook e 30 mil no Instagram, Bittar gastou R$ 19 mil da cota parlamentar para impulsionar conteúdos nas redes sociais entre janeiro e dezembro de 2023. O mais alto desses contratos é de dezembro, quando foram pagos R$ 6,6 mil para o Facebook. Nos meses de janeiro e fevereiro de 2024, não há registros de gastos com conteúdos digitais.

A reportagem perguntou ao senador sobre o patrocínio dos chamados para o ato e questionou se ele utilizou verba pública para bancar a campanha. As questões não foram respondidas até a publicação da reportagem.

Já o deputado estadual de Pernambuco Renato Antunes (PL) tem impulsionado desde o dia 19 de fevereiro seis postagens semelhantes que convocam para o ato na Paulista.

O valor total pago pelos anúncios está entre R$ 800 e R$ 900. As impressões estão entre 125 mil e 150 mil no Facebook e Instagram. Os anúncios foram direcionados exclusivamente para usuários em Pernambuco. No vídeo, ele declara apoio a Bolsonaro, informando sua participação.

Natural do Recife, Renato Antunes já foi vereador da cidade por dois mandatos seguidos. Em 2022, foi eleito deputado estadual pelo PL com mais de 45 mil votos. Antunes tem sido apontado pelo partido como um nome para disputar a prefeitura do Recife contra João Campos (PSB), nas eleições municipais que ocorrerão neste ano.

Nas últimas semanas, o parlamentar tem pago anúncios nas redes da Meta para repercutir falas na Assembleia Legislativa do estado contrárias ao discurso de Lula sobre a atuação de Israel na guerra na Palestina. Críticas à fala de Lula e a repercussão internacional que se seguiu acabaram se tornando um dos grandes motes do ato. Além disso, Antunes vem impulsionado em suas redes homenagens a figuras evangélicas e católicas do Recife.

Questionado pela reportagem se foi usado dinheiro público para a divulgação do anúncio, o deputado afirmou que foram utilizados recursos estritamente pessoais na sua ida ao ato. E, que apesar de se tratar de uma figura política de Pernambuco, enxerga como necessária sua atuação na manifestação pacífica, ordeira e em defesa ao Estado Democrático de Direito.

No Distrito Federal, o deputado distrital Thiago Manzoni, do PL, também impulsionou um anúncio chamando apoiadores para a Paulista. Na postagem, ele repercute uma entrevista que deu para o jornal Correio Braziliense, na qual afirma que está otimista para o evento. Manzoni gastou cerca de R$ 100 no anúncio, que atingiu entre 9 mil e 10 mil pessoas. Segundo a assessoria do deputado, ele não utilizou verba parlamentar para impulsionar o anúncio.

Empresários e páginas de política nas redes organizam caravanas e vendem passagens para ato

As vans de Indaiatuba, cidade com cerca de 260 mil habitantes próxima a Campinas, no interior de São Paulo, estão lotadas. Ao menos essa é a informação passada via WhatsApp por Danilo Barnabé, empresário local que está organizando uma caravana para a manifestação bolsonarista na capital.

Segundo a Pública apurou, ele pagou cerca de R$ 100 para impulsionar o chamado para a manifestação. Na propaganda, o assento custa R$ 60 por pessoa. O conteúdo teve um alcance de 7 mil a 8 mil impressões de usuários no Facebook e Instagram.

Barnabé se candidatou a deputado estadual em 2022 pelo PL, conseguiu 24 mil votos e hoje é suplente do partido. Em 2020 ele chegou a concorrer como vereador de Indaiatuba, mas não foi eleito.

Assim como Barnabé, outros empresários e páginas de conteúdo político pagaram anúncios no Facebook e Instagram divulgando caravanas para a manifestação de domingo.

O perfil Direita Itajubá, da cidade com mesmo nome no sul de Minas Gerais, é um dos que bancaram anúncios de transporte para São Paulo. Um deles, que custou R$ 100 e alcançou mil impressões no Instagram, foi removido pela Meta por não seguir as regras de publicidade da empresa.

Dois outros anúncios da página foram veiculados sem a marcação de que se trata de conteúdo político: o texto da propaganda não fala em Bolsonaro, apenas diz que são viagens para a Paulista no dia 25. Como esses anúncios não têm a etiqueta de conteúdo político, eles acabam escapando das regras de transparência da Meta, e a plataforma não revela quanto foi pago para impulsioná-los.

Na propaganda, são vendidas passagens na “caravana patriota” por R$ 115,76. A página indica como organizador do evento Alexandre Costa Lopes, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) da cidade na gestão 2022-2023. A reportagem procurou a CDL, que não retornou até a publicação.

Já o perfil Direita Já tem organizado saídas a partir da loja da Havan em Jacareí, município do interior do estado. Cada vaga no ônibus custa R$ 45, ida e volta. O perfil também tem anunciado partidas de pontos públicos de outras cidades do interior, como câmaras municipais, centros de cultura pública, parques e praças.

A reportagem encontrou também caravanas organizadas por empresários que sairão dos municípios de Ilhabela, São Sebastião e Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo. As passagens estão sendo vendidas por cerca de R$ 100. Há listas de caravanas de diversos outros estados, como Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Tocantins.

Colaboração: Bianca Muniz | Edição: Giovana Girardi

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