Ministra de Ciência e Tecnologia isenta petróleo de culpa pela tragédia no RS e defende exploração da foz do Amazonas

Luciana Santos considera que o Brasil tem autoridade para manter exploração petrolífera, “já que, no nosso uso, a gente ainda tem muita gordura para queimar”.

ClimaInfo

Shigueo Watanabe Junior, do Instituto ClimaInfo, questionou, em artigo no UOL, qual seria o pior negacionista: quem nega as mudanças climáticas nas redes sociais para proveito próprio ou quem, sabendo que elas são uma realidade, finge que ela não existe. Conclui que embora ambos sejam péssimos, o pior é quem tem o poder para evitar novas tragédias “como as do Rio Grande do Sul, de São Sebastião, da Região Serrana do Rio, da seca na Amazônia, mas insistem em apostar naquilo que vai fazê-las mais comuns e intensas: o aumento da exploração de combustíveis fósseis”.

Esse segundo grupo, que já contava com os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa, e a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, ganhou o reforço de quem, em tese, deveria prezar pelo conhecimento científico, que já comprovou exaustivamente a relação direta entre a queima de petróleo, gás fóssil e carvão e a crise climática. Trata-se de Luciana Santos, ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, que desvinculou a catástrofe no Rio Grande do Sul da produção de petróleo. De quebra, ainda defendeu a exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas. Como dizem por aí, é “eita” atrás de “eita”.

“Porto Alegre não é por conta do petróleo, são causas diferentes. Pode ser por conta do que aconteceu na Europa, do que aconteceu nos Estados Unidos. Somos nós que sofremos mais – os países em desenvolvimento, os impactos daqueles que não cuidaram das suas florestas. Não é por conta do petróleo do Brasil”, defendeu a ministra na [pasmem] 1ª Conferência Internacional das Tecnologias das Energias Renováveis (CITER), que acontece em Teresina (PI).

Luciana está correta em acusar a maior responsabilidade dos países ricos pelos estragos ambientais e climáticos que todo o planeta está vivendo. Mas assim como o Brasil não tem o direito de produzir e queimar mais combustíveis fósseis porque está reduzindo as emissões oriundas do desmatamento, também não pode usar o argumento de que “como o 1º mundo destruiu e poluiu, agora é a nossa vez”. Por um motivo simples: ninguém, em nenhum país do mundo, rico ou pobre, vai sobreviver se a lógica econômica predatória de Europa e EUA for reproduzida. Isso sem falar no fato de que os países não precisam de novas reservas de fósseis para suprir sua demanda energética.

A ministra da Ciência, porém, não concorda, mostram Correio Brazilienseepbr e Piauí Hoje. Ela reconheceu que a tragédia gaúcha foi causada pelas mudanças climáticas, mas isentou o petróleo brasileiro de culpa pelo evento extremo, como se os efeitos de queimar combustíveis fósseis aqui fossem diferentes do que ocorre em qualquer lugar do mundo. Disse ainda não ver contradição entre a exploração de petróleo na foz do Amazonas e a defesa da transição energética pelo governo. E que o Brasil tem autoridade para manter a exploração petrolífera, “já que a gente ainda tem muita gordura para queimar”.

A “cereja do bolo” das tentativas de Luciana Santos de justificar o injustificável foi, como era de se esperar entre negacionistas “esclarecidos”, a vizinha Guiana, onde houve grandes descobertas de petróleo recentemente. “Na verdade, a foz (do Amazonas) já tem uma exploração por parte da Guiana, é uma situação em que a gente se depara com uma riqueza e a gente precisa desenvolver a tecnologia para mitigar os impactos. Precisamos equilibrar essa situação para não perder as vantagens de mais possibilidades de exploração da matriz energética”, disse ela, de acordo com o Correio Braziliense.

Em tempo: “O Brasil está fazendo um planejamento energético que deixa de lado a modicidade tarifária, porque ela fatalmente iria nos empurrar para uma transição acelerada para renováveis, e está começando a criar políticas que não fazem nenhum sentido numa perspectiva econômica, com o objetivo de beneficiar a entrada de mais combustíveis fósseis na matriz energética e elétrica, atrasando a transição. Isso é ruim para os consumidores e para a competitividade da economia brasileira, nossa energia vai ficar mais cara.” A avaliação é de Gustavo Pinheiro, especialista em finanças da transição climática que já foi do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e hoje integra o E3G (Third Generation Environmentalism), centro de estudos internacionais da área. Em entrevista à Folha, Pinheiro lembra que o discurso de Luciana Santos [de que países do Norte Global enriqueceram com petróleo e agora é nossa vez] é antigo e “se aproveita de um fato que é inquestionável, de que o mundo desenvolvido, os países do G7, não estão fazendo a sua parte. Países em desenvolvimento, mercados emergentes, usam isso como um escudo para também não fazerem nada”.

Henrique Lessa / Correio Brasiliense / D.A Press

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