Temer está triste? Não basta amor de Patos Amarelos e citados na Lava Jato?, por Leonardo Sakamoto

No blog do Sakamoto

A coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo, desta segunda (3), aponta que Michel Temer está ”abalado, preocupado e triste”, sentindo-se numa ”guerra sem trincheira nem guarita”.

Entendo como se sente. Eu também estaria desconsolado se 76% da população defendesse minha renúncia, 81% quisesse meu impeachment e 83% desejasse que eu saltasse fora do meu cargo para dar lugar a eleições diretas imediatamente (números da última pesquisa Datafolha).

Mas não é só ele. A maioria dos trabalhadores também está abalada, preocupada e triste. Sentindo-se o soldado raso que morre primeiro nessa guerra sem trincheira nem guarita.

Viu a aprovação da PEC do Teto dos Gastos (limitando investimentos públicos em áreas como educação e saúde por 20 anos) e o trâmite à toque de caixa da Reforma Trabalhista (que, prestes a ser aprovada, vai reduzir a proteção à saúde e segurança do trabalhador) e da Reforma da Previdência (em discussão no Congresso Nacional, que atingirá fortemente os mais pobres, que não conseguirão contribuir com um mínimo de 25 anos para se aposentarem). Percebeu que a vida piorou a despeito das promessas de que tudo se resolveria com a troca de governo. E começou a entender que a corrupção não é monopólio do PT.

O consolo de Temer está nos 7% de aprovação, principalmente entre os mais ricos.

Afinal, ele está cumprindo a agenda de redução do Estado de bem-estar social (razão pela qual o poder econômico o ajuda a se manter no poder), mas também evitando qualquer medida que faça com que os ricos também paguem pela crise. Nada de taxar dividendos, aumentar o imposto de renda dos mais ricos e isentar a classe média, aumentar os impostos sobre heranças e taxar grandes fortunas, barrar a farra dos subsídios e os programas de refinanciamento de grandes sonegadores de impostos.

Temer fez uma escolha: ao ficar ao lado do poder econômico e da velha política (que tenta sobreviver diante dos desdobramentos da Lava Jato), pavimenta o aprofundamento da desigualdade social e garante proteção aos corruptos. Dando às costas à população, conseguiu a proeza de unir parte considerável da direita e da esquerda em nome de sua rejeição.

Não dá nem para dizer que os que o aprovam o amam. Seus aliados vão minguando à medida em que o ano eleitoral se aproxima. E o mercado professa a crença da imortalidade das reformas: se Temer voltar ao pó, elas reencarnarão no corpo de outra pessoa.

Fico imaginando a sua decepção ao perceber que não será lembrado como gostaria. Terá, provavelmente, o mesmo destino de Sarney, entre os vices que se tornaram governantes impopulares – com a diferença que o maranhense conta, ao menos, com a justificativa de ter governado em um momento de transição.

Não canso de usar essa história como exemplo. Antônio acorda às 5h da manhã, pega suas coisinhas e, com duas conduções, sai da periferia da periferia e vai até o bairro de Santo Amaro para vender café da manhã na rua. Depois, quando os clientes desaparecem, começa a trabalhar no serviço de pintor, bico que rende algo no final do mês e, sinceramente, não vale a pena. Mas como ele tem três crianças e uma mulher com câncer em casa, que luta há anos para não morrer na rede pública, pois como não tem acesso ao Sírio Libanês ou ao Albert Einstein, é o jeito.

À noite, acende o fogo e começa a vender ”churrasquinho de gato” no ponto de ônibus para completar a renda. Chega em casa cinco horas antes de ter que acordar novamente. Um dia pôs sua churrasqueira para conseguir algum em um final de semana lotado de corrida perto do autódromo de Interlagos. A Guarda Civil Metropolitana, contudo, levou tudo embora. Como ele ia trabalhar no dia seguinte? Sei lá. A sua vida, muito provavelmente, não terá um final feliz para ser levada às telas do cinema. Não irá vencer a pobreza do sertão de Pernambuco e virar presidente ou superar o racismo da sociedade norte-americana e virar presidente. Não ganhará reportagem especial no Fantástico. Não usará mesóclise em cadeia nacional de rádio e TV.

Não foi criado em berço de ouro e se houvesse uma escala justa que pudesse comparar diferentes superações, faria muitos de nossos heróis construídos pela mídia comerem poeira. Pelo contrário, é tratado como restolho da sociedade, mão de obra barata, voto fácil e massa burra. Apesar de servir, alimentar, transportar e enriquecer a mesma sociedade.

Nossas lideranças políticas podem ficar abatidas com o país que ajudaram a criar. Mas pessoas como Antônio, não.

Pois se ficar triste, é atropelado e morto pela realidade.

Foto: Alan Marques, na Folha

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