Nota da ABA e de sua Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia sobre a extinção do MCTI

Por Aba Antropologia

A Associação Brasileira de Antropologia, sociedade científica criada em 1955, vem somar-se a recente manifestação encabeçada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, externando sua perplexidade diante da extinção do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), implantada por medida provisória que fundiu este importante órgão com o Ministério das Comunicações.

Durante décadas lutamos pela consolidação e expansão dos investimentos estratégicos do Brasil em ciência, tecnologia e inovação. A estrutura profissional do MCTI teve um importantíssimo papel no reconhecimento e realização das reivindicações da comunidade científica brasileira, desenvolvendo mecanismos de fomento à pesquisa e inovação e de avaliação de resultados consistentes com a desejada qualificação e necessário impacto das pesquisas científicas no Brasil. Da mesma forma, os últimos anos apresentaram um crescimento significativo de fomento à pesquisa e recursos aportados para o setor, diligentemente aplicados por uma estrutura de governo eficaz e profissional que encontrou, no MCTI e nos atores a ele associados, o canal adequado para estimular pesquisa básica e aplicada, em todas as áreas da ciência. O expressivo resultado foi a criação e fortalecimento de redes multidisciplinares e interinstitucionais. Os dados relativos a essa expansão e seus resultados estão disponíveis nas páginas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e no sistema Geocapes.

O sucesso das políticas de investimento em ciência, tecnologia e inovação, associado ao fortalecimento de políticas de formação em pós-graduação no Brasil permitiram, na última década, uma grande expansão na produção do conhecimento científico em várias áreas, fazendo com o que o Brasil saísse do 21º lugar no ranking mundial de produção cientifica para o 13º lugar. O mesmo se deu com a antropologia, que passou, na última década, de uma média de 130 dissertações e teses defendidas por ano a mais de 300 em 2012. Tal expansão se deu de forma qualificada, acompanhada que foi da expansão de programas de pós-graduação e da produção de pesquisadores e professores da área em fóruns nacionais e internacionais reconhecidos. A circulação internacional da produção antropológica brasileira, pela via da publicação e circulação de pesquisadores brasileiros no exterior, permitiu um saudável crescimento de 60% na participação de antropólogos brasileiros em eventos científicos internacionais, de 50% na publicação brasileira no exterior em livros e coletâneas, bem como um crescimento de quase 70% na publicação de artigos científicos em revistas qualificadas em extratos superiores, ampliando a presença brasileira em redes internacionais de pesquisa e resultando em ganhos substantivos à produção de conhecimento para a sociedade brasileira. A preservação deste legado demanda a continuidade de investimentos e estruturas a muito custo conquistados nas duas últimas décadas, e a preservação do MCTI é elemento central nesse sentido.

Os efeitos da pesquisa antropológica são diretamente relacionados a qualidade de políticas públicas com efeitos diretos sobre a população brasileira. A antropologia produz pesquisas valiosas sobre políticas de desenvolvimento e seus efeitos sociais; educação; gênero e sexualidade; saúde; raça e etnia; políticas públicas e a vida nas cidades; cultura popular e movimentos sociais, que são importantes para ampliar nosso conhecimento e para auxiliar na reflexão sobre os desafios que a sociedade enfrenta, no presente e no futuro, incluindo desde as mudanças climáticas até o surto de Zika (com condicionantes sociais fundamentais). Possuidor de uma diversidade cultural ímpar no mundo, nosso país precisa continuar investindo na pesquisa sobre o tema, sob pena de aprofundar a marginalização dessas culturas, fomentando o desconhecimento da maioria da população acerca desse patrimônio sócio cultural de valor incalculável.

A extinção do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação, no formato que se consolidou nos últimos anos, e sua fusão com um Ministério com missão institucional, objetivos e procedimentos tão distintos acarretará sérios e irreversíveis prejuízos à manutenção dos padrões de pesquisa já alcançados. Fomentar a ciência é estratégico em qualquer país, e produzir conhecimento é fundamental para a construção contínua de uma sociedade democrática e ciente da sua diversidade social e cultural. A fusão de ministérios indica uma inflexão grave no reconhecimento da importância que ciência e tecnologia tem para o desenvolvimento nacional, e estamos certos de que a sociedade brasileira saberá repudiar com veemência esta decisão.

Brasília, 17 de maio de 2016.

Associação Brasileira de Antropologia e sua Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia

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